O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta quarta-feira (18), a experiência de nova metodologia que divide os julgamentos de casos relevantes em duas partes. Na primeira, o Plenário apenas ouve o relatório e as sustentações orais das partes envolvidas e de terceiros admitidos no processo, para, em sessão posterior a ser marcada, os votos sejam proferidos.
O novo formato foi adotado no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1309642, com repercussão geral (Tema 1.236), em que se discute é constitucional o regime da separação obrigatória de bens no casamento de pessoas maiores de 70 anos e se a regra se aplica também às uniões estáveis (entenda o caso).
Presidente do STF e relator do recurso, o ministro Luís Roberto Barroso salientou que essa organização do julgamento permite que os diferentes argumentos e pontos de vista apresentados na sessão plenária possam ser considerados de forma mais aprofundada pelos integrantes da Corte. Outro ponto positivo é a ampliação do debate sobre o tema na sociedade antes da tomada de decisão.
Separação de bens
No processo em julgamento, a companheira de um homem com quem constituiu união estável quando ele tinha mais de 70 anos, já falecido, pretende que seja reconhecida a inconstitucionalidade do artigo 1.641, inciso II, do Código Civil, que exige a separação de bens nesse caso, para que possa participar do inventário e da partilha de bens.
Expectativa de vida
Em nome dos herdeiros do falecido, o advogado Heraldo Garcia Vitta sustentou que as estatísticas favorecem a tese de constitucionalidade do dispositivo, uma vez que a taxa de mortalidade é mais alta entre homens e pessoas acima de 60 anos, que, geralmente, apresentam doenças crônicas.
A seu ver, a expectativa de vida deve ser levada em consideração no início de uma relação, e, no caso concreto, o falecido tinha 72 anos quando iniciou a união estável, em 2002. O advogado informou, ainda, que a companheira não ficará desamparada, porque, de acordo com o inventário, ela tem direito a quase R$ 1 milhão.
Proteção à pessoa idosa
A advogada Regina Beatriz Tavares da Silva, representante da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), argumentou que a maior longevidade justifica a constitucionalidade da regra, porque a maior parte das pessoas idosas no Brasil tem patrimônio suficiente apenas para viver com dignidade, e seu bem-estar deve ser assegurado até o fim de suas vidas. Para a entidade, a norma não é discriminatória e protege a pessoa idosa.
Autonomia privada
Por outro lado, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) defendeu a inconstitucionalidade da regra. Para a advogada Maria Luiza Póvoa Cruz, a intervenção do Estado é excessiva e invade a autonomia privada, tolhendo a capacidade dos idosos. Segundo esse argumento, a idade cronológica não deve ser parâmetro absoluto para definir a incapacidade de dispor sobre o regime de bens.
Discriminação
De igual forma, o Ministério Público do Estado de São Paulo, representado por Mário Luiz Sarrubbo, defendeu que a norma é excessiva, inadequada e desproporcional, pois discrimina a pessoa maior de 70 anos e atenta contra o princípio da dignidade humana, ao retirar sua livre escolha sobre os seus próprios atos. Também considerou que a norma é incompatível com o Estatuto do Idoso no que diz respeito à autonomia das pessoas com mais de 60 anos.
“Golpe do baú”
Mesmo posicionamento foi adotado pela Defensoria Pública da União (DPU), representada por Gustavo Zortea da Silva. Segundo ele, não pode haver presunção absoluta de que o idoso seria vítima de um “golpe do baú”, e não destinatário de afeto. Sob pena de preconceito e violação ao princípio da liberdade, ele defendeu que se leve em consideração a autonomia da vontade do idoso e sua capacidade de exercer direitos.
Fonte: STF
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