Bahia

'Salve o Caboclo': decoração celebra história da figura mais tradicional da Independência da Bahia

Galhardetes, resplendores, torres temáticas, fitilhos coloridos e arcos celebram o Caboclo.

Foto: Otávio dos Santos
Foto: Otávio dos Santos

Data fundamental no calendário baiano, o 2 de Julho comemora a libertação do povo brasileiro das forças coloniais e presta reverência aos heróis da independência do estado, responsáveis pela expulsão das últimas tropas portuguesas em territórios brasileiros.

Este ano, o Bicentenário da Independência do Brasil na Bahia traz o tema ‘Salve nossa terra, salve o Caboclo’ para as ruas, colocando a figura do Caboclo como protagonista da decoração.

Para Fernando Guerreiro, presidente da Fundação Gregório de Matos (FGM), responsável por decorar os caminhos da festa, os elementos decorativos têm identidade e função específica na celebração.

“Ultimamente tenho percebido que a nova geração não conhece o que é decoração de festas populares. Hoje é tudo banner de patrocinadores. Então, para mim, manter a tradição de decorar o trajeto das festas do 2 de Julho é mais que história, é um ato político”
Guerreiro diz que o 2 de Julho carrega um aspecto único. “A gente vê de tudo no cortejo. É uma festa que mistura cívico e religioso, memória e futuro. As pessoas querem tocar no Caboclo, depositam presentes, frutas. Não é só a história, é ritual mesmo. Um tipo particular de devoção”.

O representante da FGM acredita que o tema com destaque para a figura do Caboclo simboliza a conexão entre as personalidades históricas e as origens do povo baiano. Para ele, as duas figuras viraram o centro da festa.

“O Caboclo tem essa importância quase mística na festa. Pensamos em colocá-lo como protagonista justamente por essa relação forte com as origens do povo baiano e com as figuras históricas que lutaram pela Independência. “
Guerreiro diz que, embora a história seja repleta de personagens famosos e desconhecidos, a figura do Caboclo consegue representar “a força e a coragem do povo baiano, com suas várias faces”.

A história e seus personagens

O historiador e professor Marcos Varjão conta que a tradição dos desfiles do carro pelas ruas de Salvador começou em 1824, um ano depois da expulsão do almirante português Madeira de Melo e de seus homens, últimas tropas portuguesas, do país , selando o que ficou conhecido como a Independência do Brasil na Bahia.

“O desfile nasce espontaneamente em 1824, quando baianos pegam um carro de combate que havia sido capturado dos portugueses na guerra, enfeitam com folhas de café, folhas de cana, alguns tecidos amarelos e colocam um caboclo vivo, uma pessoa, em cima desse carro, e saem pelas ruas, fazendo o primeiro cortejo”.

Varjão cita que, inicialmente, os festejos começavam no final de junho e se estendiam até o dia 2. “O evento popular começava com a saída do bando anunciador, no dia 29, chegava até o dia 3, eventualmente, quando acontecia o retorno do carro para a Lapinha”.

De acordo com o professor, o cortejo seguia originalmente até o Terreiro de Jesus e, até 1825, a figura do Caboclo era representada por uma pessoa viva. No ano seguinte, surge a estátua que, até 1840, seguia sozinha no carro alegórico.

“Em 1840 se constrói um novo carro com a Cabocla representando a Catarina Paraguaçu, a participação da mulher”.
Entretanto, diz Varjão, a estátua da Cabocla surge não para celebrar as mulheres que tiveram participação fundamental nas lutas pela Independência. “A ideia era substituir o Caboclo original. Eles viam essa figura como uma atitude heroica e guerreira, mas também como violenta e agressiva, que incitava a rebeldia anti-lusitana. A essa altura pós-vitória, essa ideia poderia se tornar uma atitude revolucionária contra as elites da época”.

“A cabocla aparece como a ideia feminina de mãe, a nativa que acolhe o náufrago português, que socorre, que acalenta. Numa tentativa de dar outra imagem a esse símbolo da revolta”.

O aspecto quase sagrado das imagens que desfilam no cortejo também tem explicação histórica, diz o historiador. “Os caboclos não nascem vinculados às matrizes religiosas africanas, isso acontece depois. As pessoas que participavam do cortejo viam algo sagrado na passagem das imagens e, assim, o Caboclo se consolidou como se fosse o santo do 2 de Julho”.

Varjão explica que, como na região histórica existiam terreiros de candomblé que cultuavam os caboclos, houve uma associação natural entre as simbologias e, por isso, o Caboclo representa tão bem o povo baiano.

“Existe uma relação muito próxima entre a simbologia do caboclo, aquele primeiro, o personagem vivo que é o guerreiro que nos representa, com os donos da terra no candomblé. Por isso essa identificação tão forte e antiga com todo o povo de Salvador.”

Fonte: G1

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