Três anos depois do Congresso Nacional aprovar a criação da Polícia Penal no Brasil, através de uma Emenda Constitucional, a Bahia é um dos estados brasileiros que ainda não regulamentaram o tema. Questionado pelo Bahia Notícias na última segunda-feira (3), o governador Rui Costa (PT) se demonstrou contrário à transformação de agentes penitenciários em policiais penais e declarou que vai deixar o problema para o próximo gestor decidir.
“Não será enviado este ano. Esse debate, eu vou deixar para o próximo governador tomar a decisão. Eu não vou tomar a decisão sobre isso. Ele [Jerônimo Rodrigues, candidato a governador pelo PT] precisa se debruçar sobre isso depois, com calma, depois de eleito, e tomar a decisão. Isso não é uma coisa pacífica, nem na Bahia nem na maioria dos estados brasileiros”, afirmou Rui.
De acordo com Rui, a criação da Polícia Penal tem a ver com um modelo de administração dos presídios. O governador petista prefere a chamada “co-gestão” ou “gestão indireta”, quando o estado atua em parceria com empresas privadas no comando do sistema prisional. Dentro desse contexto, a instituição de policiais penais dificultaria a terceirização do serviço.
“O modelo que tem se mostrado mais seguro para a sociedade, de melhor resultado, é quando a gestão é feita de forma indireta. Não tem dúvida: muda da água para o vinho quando você tem uma unidade prisional com gestão de forma indireta. Do ponto de vista de fugas, é completamente diferente. Do ponto de vista de encontrar armas nos presídios, é completamente diferente. Em número de rebeliões, é completamente diferente”, defendeu Rui.
“Eu não encaminharei isso, até porque eu não enxergo nesse modelo um modelo que proteja a sociedade. Pelo contrário: é um modelo mais perigoso, que permite muitas vezes o tráfico comandar o crime de dentro dos presídios. Infelizmente, é assim. Já nos presídios de gestão indireta, são os mais seguros, onde a gente, quando faz vistoria, praticamente não encontra celular, arma de fogo e arma branca, enquanto nos presídios tradicionais você encontra 100, 150, 200 celulares, facão, revólver”, argumentou o governador.
A fala de Rui foi feita ao lado do candidato ao governo do estado, Jerônimo Rodrigues (PT), que não se manifestou sobre o assunto.
Trabalhadores discordam
Procurado pelo Bahia Notícias, parceiro do Acorda Cidade, o presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do Estado da Bahia (Sinspeb), Reivon Pimentel, fez duras críticas ao governador pelos posicionamentos contrários à Polícia Penal e afirmou que Rui é o responsável pelo aumento da violência nos últimos anos.
“O governador está totalmente equivocado, porque a Bahia de Rui Costa está indo na contramão dos outros estados brasileiros, sendo o único que não criou a Polícia Penal. E, talvez por isso, a Bahia continua liderando os índices de violência. Todos sabem que o crime organizado tem o cordão umbilical ligado ao sistema prisional”, declarou Reivon.
“Essa fala nos causa indignação. Eu sou vice-presidente da Federação Nacional Sindical dos Servidores da Polícia Penal, a Fenasppen. Eu acompanho o sistema prisional. Eu sei o que era antes da Polícia Penal e sei o que é hoje. Isso só prova que ele não conhece de Segurança Pública, não conhece de sistema prisional, está mal assessorado e precisa ser responsabilizado pela violência na Bahia”, complementou o presidente do Sinspeb.
Para Reivon, a Polícia Militar da Bahia está sendo sobrecarregada, ao ser direcionada para cumprir funções que não são da sua competência, como investigação, segurança do sistema prisional, além de escolta e transferência de presos.
“O governador Rui Costa insiste em permitir que o crime organizado mande na Bahia. Quem manda no estado da Bahia é o crime organizado. Por culpa única e exclusiva do governador Rui Costa, que sucateou a Polícia Civil, sucateou o sistema prisional. Para ele, a única polícia na Bahia é a Polícia Militar”, criticou Reivon.
Reivon também discorda de Rui acerca da gestão indireta, defendida como ideal pelo governador. Segundo ele, o modelo é ruim para a Segurança Pública e também para os trabalhadores, facilitando apenas a vida dos empresários que investem no sistema prisional brasileiro.
“Com relação ao que o governador chama de gestão indireta, a co-gestão só serve aos empresários. Não existe eficiência nenhuma. Talvez por isso, pelo fato do governo do estado privilegiar a terceirização, é que o governador tenha essa resistência à Polícia Penal. Porque aí ele não teria mais como contratar terceirizados”, avaliou Reivon.
“Um trabalhador terceirizado ganha um terço do que ganha um estatutário, exercendo as mesmas atividades e usurpando o lugar de policial penal. É menos investimento em Segurança, menos investimento em ressocialização, menos investimento em condições de trabalho. Então, nos moldes da Bahia, não há melhor investimento no mundo do que gerir unidade prisional. Aqui, o estado constrói, aparelha com o que há de melhor e o empresário só entra para lucrar. É o dinheiro do cidadão baiano que serve para enriquecer os empresários. E repito: essa atitude do governador faz com que o crime organizado continue ditando as regras. Pois, se você não tem um sistema prisional forte, você não pode falar em Segurança Pública”, finalizou o sindicalista.
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