por Vladimir Aras
E se Osama bin Laden tivesse sido preso no Brasil….
A hipótese não é absurda. Quando trabalhei na Tríplice Fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai) entre 2003 e 2006, contava-se que Osama bin Laden visitara Foz do Iguaçu em 1995. Ali há uma grande, pacífica e produtiva comunidade de origem árabe (libaneses, sírios, egípcios, etc). Não me consta que entre eles haja terroristas, mas a Veja relatou a suposta viagem do líder da Al-Qaeda em matéria de 2003 (“Ele esteve no Brasil”).
Vamos agora às especulações jurídicas. Digamos que o falecido bin Laden tivesse sido localizado em terras brasileiras.
Primeira dificuldade. O mandado de prisão internacional contra ele não poderia ser executado imediatamente em nossas terras. Embora a ordem para sua prisão constasse do registro de red notices (difusões vermelhas) especiais da Interpol, o fugitivo Osama só poderia ser preso no Brasil por ordem do Supremo Tribunal Federal, no curso de um processo de extradição. Bin Laden aparecia na Interpol-United Nations Security Council Special Notice (eis o link). Há gente bem conhecida na base de dados de difusões vermelhas. Tente identificar este aqui.
Vários países-membros da Interpol executam diretamente os mandados de prisão que constam do sistema informático da Organização Internacional de Polícia Criminal. O Brasil não os aceita. Portanto, o terrorista saudita, morto em maio/2011, poderia ser identificado mas não seria preso no território brasileiro até a chegada de um pedido formal de extradição ao STF e a expedição de um mandado prisional nacional.
Diz o art. 5º, LXI, da Constituição: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”. Pela interpretação dada ao tema pelo STF, esta autoridade competente deve ser a brasileira, pois somente esse tribunal pode autorizar extradições (art. 102, inciso I, letra ‘g’, da Constituição).
O professor Andrey Borges de Mendonça aponta a decisão do STF na qual se firmou este entendimento. Foi no HC 82.686/RS:
I. STF: competência originária: habeas corpus preventivo contra alegada ameaça de prisão para extradição, imputada a autoridade policial brasileira: precedente (HC 80923).
II. Habeas corpus preventivo: ameaça desmentida pelas informações, nas quais a autoridade policial impetrada dá conta de que, ciente de depender a prisão preventiva para extradição de decisão do STF, não atenderá ao pedido de detenção oriundo de órgão judiciário estrangeiro. (STF, HC 82.686/RS, relator min. Sepúlveda Pertence, julgado em 05/02/2003).
Superado esse óbice procedimental, se bin Laden não fugisse antes, um ministro do STF determinaria a prisão do chefe da Al-Qaeda. Prossegue o nosso roteiro jusficcional:
Toda contente, nossa presidente Dilma Roussef ligaria para Barack Obama.
– Barack, tenho uma boa e uma má notícia para você.
– Pegamos o Osama! Ele está inteirinho mas o pessoal do Instituto de Defesa das Pessoas Indefensáveis Mas que Mesmo Assim Merecem Defesa (IDPIMQMAMD) já assumiu o caso e disse que o Ministério Público não tem a menor chance. Seriam muitas as nulidades. É melhor você levar o homem.
– Tá, Dilma, muchas gracias, pedirei a extradição desse terrorista agora mesmo!
– Mas assim, já? Isto pode demorar um pouquinho… Um outro terrorista, o italiano, tá esperando extradição há mais de 4 anos.
– Eu espero. Não importa quanto tempo tarde. Caçamos bin Laden por 10 anos. Podemos aguardar um pouco mais para levá-lo a julgamento.
– Certo, colega, mas aí que entra a parte ruim… Aqui no Brasil nós não prendemos ninguém por mais de 30 anos e não toleramos a pena de morte. Está na Constituição.
– E qual o problema? -, perguntaria Obama, sem entender a observação.
-É que só podemos extraditá-lo se você prometer que o bin Laden não será condenado a pena de morte nem a prisão perpétua e que não poderá ser torturado, pois também não admitimos tribunais de exceção, como aqueles que vocês mantêm lá em Guantánamo.
– Mas, Dilma, esse sujeito matou quase três mil pessoas, derrubou as torres gêmeas de Nova Iorque, danificou o prédio do Pentágono, destruiu quatro aviões de passageiros… A pena para estes crimes aqui é a morte. Na “melhor” das hipóteses, bin Laden será condenado à prisão perpétua. Como o Vlad falou, queremos a cabeça desse “cangaceiro árabe“.
– Sinto muito, Barack. Não é possível. Realmente, no passado, já cortamos cabeças por aqui, mas a Constituição do Brasil não aceita essas sanções desumanas. Está no art. 5º, inciso XLVII. Só poderemos entregá-lo a vocês, se houver o compromisso de comutação de pena para que bin Laden cumpra no máximo 30 anos de prisão. Nem um dia a mais.
– Então, Dilma, lamento. Agora eu é que tenho uma má notícia para você. Resolverei o problema de outro jeito. O “jeitinho americano”. Hasta la vista, baby e thank you for your cooperation!
Ao fundo, ouve-se Obama dizendo: – Arregimentem um novo Team 6. Chamem o Arnold, o Robocop, o Rambo, o MacGyver, o Jason Bourne e o Jack Bauer. Quero-os no Brasil em 24 horas.
Cai a ligação.