Por Vladimir Aras
Não existe tal vedação na Lei 12.850/2013 e, em se tratando de matéria de legalidade penal, não se pode criar essa proibição, em detrimento do direito de defesa do réu colaborador, tão-somente por vontade dos críticos, alguns dos quais interessados no (in)sucesso do processo penal.
O alvo dessa repreensão é o doleiro Alberto Youssef, que formalizou em Curitiba, no ano de 2003, no caso Banestado, um acordo de colaboração premiada que veio a descumprir, já que não confessou inteiramente suas condutas ilícitas e continuou a delinquir. Anos depois, flagrado no caso Lavajato, o mesmo réu formalizou um novo acordo de colaboração premiada, homologado em 2014 pelo Supremo Tribunal Federal. Este segundo pacto é válido? Inteiramente.
Mesmo que houvesse uma tal norma proibitiva no ordenamento jurídico brasileiro – e não há -, a vedação ao benefício legal não poderia valer para sempre, já que entre nós não há sanções de caráter perpétuo. Note-se: mesmo a reincidência penal, decorrente de condenação criminal transitada em julgado, caduca em cinco anos, para todos os fins, nos termos da lei.
A título de comparação, as duas leis brasileiras que preveem os acordos de leniência (art. 86, §12, da Lei 12.529/2011 e artigo 16, §8º, da Lei 12.846/2013) estabelecem prazo de interdição de apenas três anos para a formalização de nova avença, em caso de descumprimento da anterior. Esta regra atende ao princípio da proporcionalidade, ao limitar a sanção por tempo razoável para purgar a violação do compromisso pretérito.
Art. 86. […]
§12. Em caso de descumprimento do acordo de leniência, o beneficiário ficará impedido de celebrar novo acordo de leniência pelo prazo de 3 (três) anos, contado da data de seu julgamento.
Art. 16. […].
§8o Em caso de descumprimento do acordo de leniência, a pessoa jurídica ficará impedida de celebrar novo acordo pelo prazo de 3 (três) anos contados do conhecimento pela administração pública do referido descumprimento.
A suposta impossibilidade jurídica do segundo acordo de Alberto Youssef – ou de quem quer que seja – não tem qualquer fundamento legal. A criação de tal vedação, sem base na lei, é que afrontaria o direito de defesa dos potenciais colaboradores.
Naturalmente, por ocasião da sentença, cumpre ao juiz considerar com mais rigor a credibilidade do colaborador “reincidente”, cujas declarações, como sempre ocorre, deverão àquela altura ter sido corroboradas por prova autônoma.