Por Vladimir Aras
A Bahia é realmente folclórica. Estes dias ocorreu por aqui uma história macabra. Foi em Camacan, no sul do Estado. A senhora “Beltrana” morreu de câncer. Acreditando que sua querida genitora havia morrido por bruxaria encomendada por vizinhos, sua filha “Fulana de Tal” fez uma lista de pessoas de quem se vingaria. Felizmente, não entregou a relação de alvos a nenhum pistoleiro ou matador. Para quem é supersticioso, fez pior: pôs a lista na boca da mãe morta e a enterrou.
Já ouvi dizer que é coisa de macumbeiro pôr nomes de desafetos na boca de sapo. Na boca de uma morta, é a primeira vez que se noticia. Segundo a mitologia, os antigos gregos costumavam colocar ali uma moeda, para pagar ao barqueiro de Hades pela travessia do rio Estige, até o mundo dos mortos. Era o óbolo de Caronte. Não sei se “Fulana de Tal” sabia dessa lenda, mas os jornais disseram que ela também colocou uma moeda de cinquenta centavos na boca de sua genitora.
Claro que isto causou um tumulto daqueles em Camacan. Os atingidos, muito assustados, puseram a alma pela boca. Outros queriam linchar a mulher. Um inquérito foi instaurado, mas o delegado de Polícia nada pode fazer. O crime que poderia haver é a violação da sepultura da morta. Supostas vítimas do feitiço se revoltaram e tentaram abrir o túmulo de D. Beltrana. Para essses, a pena seria de reclusão de 1 a 3 anos, e multa (artigo 210 do CP).
Nada além disso. Quando uma pessoa cai na língua do povo, isto pode ser difamação. Mas botar uma lista de nomes na língua de um defunto não é crime. Andaram falando aí em ameaça. Que exagero! A ameaça seria a alma da morta voltar do outro mundo para atenazar ou atazanar a vida dos viventes? Isto pode valer como crendice ou como enredo de filme B de terror. Não entra no campo das penas; só no terreno das almas penadas.