O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), estabeleceu como um dos objetivos da Casa neste ano a discussão de uma “reformulação do sistema eleitoral”.
Junto a lideranças partidárias, Pacheco tem defendido a análise de textos que atualizam o Código Eleitoral e que acabam com a reeleição para prefeitos, governadores e presidente da República.
A tarefa de destravar as discussões coube ao senador Marcelo Castro (MDB-PI), sobretudo em torno do novo Código Eleitoral, que aguarda votação desde 2021.
Em reunião com líderes nesta quinta-feira (29), Castro fez a apresentação de uma prévia do seu parecer sobre o projeto que reformula o Código Eleitoral.
Nesta primeira reunião sobre o tema, ele também compartilhou três esboços de uma futura Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acaba com a reeleição e cria mandatos de cinco anos para todos os cargos eletivos.
Rodrigo Pacheco afirmou, em entrevista na quarta (28), que as apresentações serviriam para que os líderes pudessem “assimilar” as ideias, e para que se busque uma “maioria para aprovar todos esses temas”.
Senadores dizem que há chances de que as propostas entrem na pauta de votação ainda neste primeiro semestre — antes de um esvaziamento da Casa para as campanhas eleitorais nos municípios.
Se aprovadas pelo Congresso Nacional neste ano, no entanto, as novas regras não valeriam para o pleito marcado para outubro.
Novo Código Eleitoral
Relator do projeto que reforma o Código Eleitoral, o senador Marcelo Castro apresentou a lideranças partidárias do Senado uma prévia do seu parecer, que deve ser protocolado na próxima semana.
O texto vai reunir, segundo ele, mudanças feitas pela Câmara na proposta original do novo Código, aprovada pelos deputados em 2021, e na chamada minirreforma eleitoral, votada em 2023.
A reforma do Código Eleitoral deverá consolidar, em uma só lei, diversas normas eleitorais, como as que tratam das regras de inelegibilidade e a de partidos.
Mesmo que seja aprovada antes das eleições municipais deste ano, as regras valerão somente para o próximo ciclo eleitoral.
Extensa, a versão proposta por Castro deve reunir cerca de 900 artigos. “São sete leis consolidadas em uma só. […] Se o Código for aprovado e sancionado, teremos uma única lei tratando de toda a legislação eleitoral e partidária”, afirmou o senador após o encontro com os líderes.
À imprensa, o relator destacou cinco pontos de seu parecer classificados por ele como relevantes:
-afastamento obrigatório de juízes e militares que queiram disputar cargos políticos, a chamada “quarentena”
-uniformização do prazo de inelegibilidade
-data única para a desincompatibilização de candidatos com cargos públicos
-mudanças na distribuição das chamadas sobras eleitorais
-simplificação da prestação de contas
Quarentena
O parecer do novo Código Eleitoral, de acordo com o relator, estabelece que, para se tornarem candidatos, militares e juízes terão de se desligar definitivamente de seus cargos e funções quatro anos antes das eleições. Quem não cumprir a regra será considerado inelegível.
A “quarentena” também será válida para membros do Ministério Público, guardas municipais, policiais federais, policiais rodoviários federais, policiais ferroviários federais e policiais civis e militares.
A regra de afastamento obrigatório, se aprovada, passará a valer em 2026. A medida é uma tentativa de evitar a politização dentro desses setores. O dispositivo já havia sido aprovado pela Câmara, em uma articulação do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), em 2021.
“Quer ser político? Abandona a magistratura, o Ministério Público e a carreira militar e vai ser político. Não é proibido, mas, [ficar] nas duas coisas, não dá certo. Hoje, um militar se afasta para se candidatar. Se ganha, vai para inatividade. Se perde, volta para a tropa. Fazemos a pergunta: ele é um militar ou um político? É um político militar. Não dá certo”, afirmou Marcelo Castro.
Inelegibilidade
Castro afirmou que o seu parecer deverá uniformizar o tempo de inelegibilidade de políticos – ou seja, o prazo em que um candidato fica impedido legalmente de disputar eleições.
Segundo ele, em todos os casos, a punição aplicada será de oito anos e “ponto final”. “Nem mais nem menos”, disse.
Atualmente, a legislação possibilita que a punição se estenda para mais de oito anos. É o caso de deputados federais e estaduais, senadores e vereadores que são cassados durante o mandato.
Pelas regras em vigor, ao serem condenados à perda do mandato, eles ficam inelegíveis pelo resto do mandato e por mais oito anos.
Regra semelhante também é aplicada para políticos condenados por crimes comuns, como lavagem de dinheiro e tráfico de drogas. Nesses casos, eles ficam impedidos de disputar eleições durante o cumprimento de pena e por mais oito anos, contados a partir da condenação definitiva — ou seja, depois de esgotados todos os recursos.
Na prática, hoje, políticos condenados por esse tipo de delito podem ficar inelegíveis por tempo indeterminado, enquanto aguardam o julgamento de recursos contra a condenação original.
De acordo com o relator, a proposta prevê que, para condenações por crimes comuns, a inelegibilidade por oito anos só começará a contar depois da condenação definitiva — ou seja, depois de esgotados todos os recursos. Na prática, portanto, um período determinado e menor.
Para os parlamentares condenados à perda do mandato, a mudança será semelhante. A contagem também será iniciada após a data da condenação.
-Exemplo: em 2019, a então senadora Selma Arruda (Podemos-MT) foi condenada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a cassação foi confirmada pelo Senado. Pela regra atual, a contagem da punição será iniciada somente em 2027, quando o mandato para o qual ela foi eleita inicialmente será encerrado. Ela ficará, portanto, inelegível até 2035. Pela proposta do novo Código Eleitoral, ela voltaria a ser elegível em 2028.
A outra mudança ocorrerá, segundo Marcelo Castro, para condenações por crimes eleitorais, como abuso de poder político.
Atualmente, o candidato considerado inelegível por decisão dos Tribunais Regionais Eleitorais ou do Tribunal Superior Eleitoral fica impedido de disputar eleições por oito anos. A contagem desse prazo, no entanto, é feita a partir da data da eleição na qual ocorreu o delito.
Um exemplo de aplicação dessa regra é o tempo de inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Condenado por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, ele ficará impedido de participar das eleições de 2024, 2026 e 2028. Mas estará apto a concorrer em 2030.
Isso porque a inelegibilidade será contada a partir de 2 de outubro, data da eleição de 2022. Em 2030, quando vão ocorrer eleições federais, ele voltará a estar elegível em 2 de outubro, e a disputa ocorrerá quatro dias depois, em 6 de outubro.
Para manter uma harmonia na aplicação dos prazos, Castro vai propor que a contagem de inelegibilidade para crimes eleitorais ocorrerá a partir do dia 1º de janeiro do ano seguinte à eleição na qual o delito foi cometido.
A mudança, na prática, impedirá candidatos condenados a disputar duas eleições — federais ou municipais.
Desincompatibilização
O relatório de Marcelo Castro também deve contemplar uma mudança no prazo de desincompatibilização — isto é, afastamento definitivo ou temporário de agentes públicos que querem disputar eleições. O emedebista definirá uma única data para todos os casos previstos na legislação eleitoral: 2 de abril do ano do pleito.
Atualmente, os prazos para a desincompatibilização variam de três a seis meses e são calculados com base na data do primeiro turno das eleições.
Neste ano, por exemplo, servidores públicos que desejam disputar vagas de vereador ou prefeito deverão se afastar dos cargos até 6 de julho — 3 meses antes do primeiro turno das eleições. Pela proposta de Castro, esse afastamento deveria ocorrer em 2 de abril.
“Todo mundo que quiser ser candidato tem que se desincompatibilizar seis meses antes das eleições, no dia 2 de abril. A gente simplifica”, disse.
Sobras eleitorais
O parecer vai propor, segundo o relator, uma mudança na distribuição das chamadas sobras eleitorais nas eleições para deputados e vereadores — isto é, vagas que restam depois da divisão pelo quociente eleitoral.
Quociente eleitoral é a divisão de votos válidos (desconsiderados brancos e nulos) pelo número de cadeiras em disputa. O valor serve como uma espécie de “meta” para os partidos. Isso porque o número de cadeiras destinado a cada legenda é equivalente ao número de vezes em que uma sigla atinge o quociente.
Após a distribuição pelo quociente, as cadeiras que sobraram entram em disputa. Atualmente, a legislação prevê que estão aptos a participar dessa disputa:
-partidos: obter pelo menos 80% do quociente eleitoral
-candidatos: obter votos em número igual ou superior a 20% do quociente
Segundo Castro, a proposta vai elevar a “barreira” de participação para:
-partidos: obter valor igual ou superior ao quociente eleitoral
-candidatos: obter votos em número igual ou superior a 10% do quociente
Além dessa mudança nas sobras, o relatório também deve propor uma mudança para federações partidárias — isto é, a união de dois ou mais partidos para atuarem como se fossem um só.
Pela proposta, elas poderão ser formadas até seis meses antes do pleito. Atualmente, a legislação permite a formação até o prazo final das convenções partidárias, em agosto.
Prestação de contas
Marcelo Castro também vai propor um sistema simplificado de prestação de contas de candidaturas. A iniciativa valerá para candidatos que gastaram abaixo de R$ 25 mil na campanha.
O dispositivo deve ser semelhante ao proposto pela Câmara, aprovado em 2021, que previa atualização do montante pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), considerado a inflação oficial do país.
“É como no Imposto de Renda: quem não ganhou até tanto não tem nada a declarar. Ele faz uma declaração simplificada de que não fez movimentação financeira. Se a despesa que ele fez foi pequena, abaixo de R$ 25 mil, tem um formulário simplificado. Ele presta contas de maneira clara, sem nenhuma complicação. Se for superior a R$ 25 mil, fica como é hoje”, declarou.
Fim da reeleição
O presidente do Senado também quer discutir, junto do Código Eleitoral, uma Proposta de Emenda à Constituição para acabar com a reeleição para prefeitos, governadores e presidente da República. Pacheco já afirmou que vê a discussão da proposta como o seu “propósito”.
Marcelo Castro foi o escolhido para construir uma versão do texto que reúna apoio da maioria dos parlamentares da Casa. Três versões foram sugeridas por Castro em reunião com líderes nesta quinta.
Nos três textos, o objetivo central é acabar com a reeleição para cargos do Executivo, criada por uma emenda constitucional em 1997.
Também há convergência em outro ponto: a criação de mandatos de 5 anos para todas as funções eletivas, com exceção de senadores, que terão 10 anos.
Duas das versões apresentadas por Castro propõem, no entanto, a unificação da data das eleições federal e municipal — a chamada coincidência de eleições. A medida tem sido defendida por Pacheco, mas enfrenta resistência entre parlamentares.
Esses textos criam regras de transição diferentes, com alterações em tempos de mandatos e possibilidade de mandato tampão, para alcançar uma única data de eleições no país.
Somente uma das versões propostas deve ser protocolada por Castro: a que obtiver mais apoios entre os senadores. Para passar a tramitar no Senado, uma PEC precisa reunir, no mínimo, 27 assinaturas.
Fonte: g1
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