Direito penal

Deitado em berço esplêndido

Felizmente, tem curso na Câmara dos Deputados o projeto de lei 2016/2015, que pretende eliminar essa lacuna.

Por Vladimir Aras

Segundo recente relatório que o GAFI (ou FATF, na sigla em inglês) apresentou aos membros do G-20, na cúpula realizada em Antália, na Turquia, entre 194 países analisados, somente 4 não criminalizam o financiamento do terrorismo. São eles a República Tcheca, a Líbia, a Palestina e o Brasil.

Felizmente, tem curso na Câmara dos Deputados o projeto de lei 2016/2015, que pretende eliminar essa lacuna.
A proposição tramita em regime de urgência e está na reta final de votação, com a seguinte redação (original da Câmara):

Art. 6°. Receber, prover, oferecer, obter, guardar, manter em depósito, solicitar, investir, de qualquer modo, direta ou indiretamente, recursos, ativos, bens, direitos, valores ou serviços de qualquer natureza, para o planejamento, a preparação ou a execução dos crimes previstos nesta Lei:
Pena – reclusão, de quinze a trinta anos.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem oferecer ou receber, obtiver, guardar, mantiver em depósito, solicitar, investir ou de qualquer modo contribuir para a obtenção de ativo, bem ou recurso financeiro, com a finalidade de financiar, total ou parcialmente, pessoa, grupo de pessoas, associação, entidade, organização criminosa que tenha como atividade principal ou secundária, mesmo em caráter eventual, a prática dos crimes previstos nesta Lei.

No substitutivo do Senado ao PL 2016/2015, o crime de financiamento do terrorismo é previsto no artigo 5º, com pena de 12 a 20 anos de reclusão e multa, com alterações no preceito incriminador.

Como quer que seja, o Brasil está em mora com a comunidade internacional, devido ao descumprimento da Convenção para a Supressão do Financiamento do Terrorismo de 1999 (Decreto 5.640/2005), que determina a criminalização dessa conduta:

Artigo 2

1. Qualquer pessoa estará cometendo um delito, em conformidade com o disposto na presente Convenção, quando, por qualquer meio, direta ou indiretamente, ilegal e intencionalmente, prover ou receber fundos com a intenção de empregá-los, ou ciente de que os mesmos serão empregados, no todo ou em parte, para levar a cabo:

a) Um ato que constitua delito no âmbito de e conforme definido em um dos tratados relacionados no anexo; ou

b) Qualquer outro ato com intenção de causar a morte de ou lesões corporais graves a um civil, ou a qualquer outra pessoa que não participe ativamente das hostilidades em situação de conflito armado, quando o propósito do referido ato, por sua natureza e contexto, for intimidar uma população, ou compelir um governo ou uma organização internacional a agir ou abster-se de agir.

O Brasil também tem descumprido a Recomendação 5 do GAFI, segundo a qual:

“Countries should criminalise terrorist financing on the basis of the Terrorist Financing Convention, and should criminalise not only the financing of terrorist acts but also the financing of terrorist organisations and individual terrorists even in the absence of a link to a specific terrorist act or acts. Countries should ensure that such offences are designated as money laundering predicate offences.”

Em virtude da Resolução 2178, adotada em setembro de 2014 pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, a nota interpretativa à Recomendação 5 do GAFI foi alterada para deixar claro que ese tipo penal também deve criminalizar o financiamento de viagens de combatentes estrangeiros (foreign terrorist fighters), uma das ameaças mais recentes a alvos ocidentais, como mostram os atentados ocorridos em Paris na chamada Sexta Feira 13 de Novembro.

Espera-se que o Congresso Nacional avance esta semana para que saiamos dessa posição desconfortável, que representa violação do direito internacional, no que se refere ao descumprimento da obrigação assumida pelo Brasil quando da ratificação da Convenção da ONU de 1999.

A mora já dura dez anos, desde a integração desse tratado ao ordenamento jurídico brasileiro. Não se pode esperar mais.

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