Acorda Cidade
Agência Brasil – Estudo realizado por professores da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) comprovou que pacientes que morreram em decorrência do novo coronavírus (covid-19) desenvolveram fibrose nos pulmões. O estudo apurou também que os pacientes que se recuperarem e sobreviverem à covid provavelmente vão ter essa sequela pulmonar.
“A pessoa vai ter alta, mas o pulmão vai ficar com essa fibrose. Isso não volta atrás. Vai ficar com um pouco de sequela e a sequela vai ser tanto maior quanto mais grave for a doença”, disse hoje (26) a professora da PUCPR Lucia de Noronha, que participou do projeto.
O estudo sugere que medicamentos que interfiram com esse processo de formação de fibrose, como o bloqueador da Interleucina-4 ou de TGF Beta, e até mesmo de corticoide, poderiam diminuir o quadro de fibrose pulmonar severa nos pacientes com covid-19. “Isso poderia fazer com que o paciente saísse com uma melhor condição pulmonar. Porque agora a gente não pode se preocupar somente com a cura, mas com a cura e o que fica no paciente após a cura. Ou seja, qual a sequela que ele vai ter”, disse Lucia.
Amostras
Os pesquisadores compararam seis amostras pulmonares de pacientes que morreram devido à covid-19 severa com dez fragmentos de pulmões de indivíduos infectados pelo vírus H1N1pdm09, responsável pela pandemia de gripe suína de 2009 e, também, com 11 amostras de pacientes que morreram por problemas cardíacos ou oncológico e não tiveram lesão pulmonar como causa da morte. “Na covid, a gente viu mais fibrose”. Segundo explicou a professora, existem dois motivos para isso. O primeiro é porque a lesão pulmonar da covid é diferente. Ela é mais afeita a fazer fibrose, por si só. Outro motivo é que a covid é uma doença mais longa.
No H1N1, em três dias o paciente ia a óbito ou começava a recuperar o pulmão. Já na covid, os pacientes ficam 30 dias na UTI. “É muito prolongado [o tempo de internação] antes dele receber alta. Esse tempo de lesão, esse tempo em que o pulmão fica sendo comprometido, propicia você ter mais fibrose. Não é só a gravidade da doença, mas é a gravidade mais tempo. São duas coisas”.
De acordo com informações da Escola de Medicina da PUCPR, a fibrose torna os tecidos espessos e rígidos, limitando a capacidade respiratória dos pulmões, uma vez que a condição dificulta a absorção e transferência de oxigênio para a corrente sanguínea.
Lucia de Noronha disse que a comparação com amostras de pacientes que não morreram em função de lesão pulmonar permitiu aos pesquisadores quantificar a fibrose. Foram usados fragmentos de pacientes mais ou menos da mesma idade. A conclusão é que as pessoas que morreram da covid têm muito mais fibrose. “A gente consegue ver também que quanto mais tempo esse paciente ficou na UTI, mais fibrose ele tinha. Então, é gravidade dependente de tempo”.
Consequências
O tempo longo de permanência dos pacientes com covid nas UTIs acarreta problemas como a falta de leitos disponíveis e traz consequências para os doentes, entre as quais a fibrose que “não tem volta”, ressaltou Lucia. Os pacientes que se recuperam da doença e recebem alta e têm pouca fibrose talvez não sintam muito porque toda pessoa tem uma reserva pulmonar, disse a professora. “A gente tem mais pulmão do que necessitaria, justamente para, se você tiver uma pneumonia, sobreviver”, explicou Lucia. Mesmo com pouca fibrose, o paciente pode ficar cansado se fizer muito exercício.
Tendo muita fibrose, mesmo caminhadas curtas ou subidas de escadas podem afetá-lo. “A restrição vai depender da quantidade [de fibrose]”. Em casos extremos, a pessoa pode ficar dependente de oxigênio. Fica com dificuldade respiratória, que é progressiva. “Quanto mais lesão, mais dificuldade respiratória”. Dependendo da extensão da lesão, o quadro pode levar à morte.
Pesquisa
Os pesquisadores definiram três ou quatro moléculas chave que estão envolvidas no resultado final da pesquisa, que é a fibrose, para poder sugerir um meio de bloqueio. Agora, o estudo terá continuidade com 25 pacientes que morreram de covid-19.
“O próximo passo é estudar esses 25 [pacientes] com mais moléculas que trabalham junto com essas três ou quatro. Digamos que eu estudei o capitão da equipe e agora vou estudar os soldados. Vou estudar outras moléculas para poder fechar melhor esse mecanismo. Nós estamos comparando com os pacientes que estão vivos e dos quais a gente coletou sangue. A gente já percebeu que é mais ou menos a mesma coisa. O que a gente viu nos mortos está vendo nos vivos”.
Segundo Lucia de Noronha, entender o que ocorreu com os mortos ajuda a entender o mecanismo que será dosado no sangue dos pacientes internados mas que receberão alta.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). As famílias dos pacientes permitiram a biópsia. O resultado do estudo foi publicado na revista Scientific Report, considerada uma das principais publicações científicas do mundo.