No dia 4 de agosto o presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, sancionou a Lei 14.434/2022, que estabelece o piso salarial nacional para enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem e parteira.
O novo piso é uma grande vitória da categoria e deverá ser aplicado por empresas privadas a partir de 1º de setembro em todo o território nacional. Já as unidades públicas terão um período até dezembro para se organizarem e efetuarem o pagamento a partir de 1º de janeiro.
Com a aprovação do piso, os enfermeiros devem receber no mínimo R$ 4.750 mensais. Técnicos de enfermagem devem receber no mínimo 75% desse valor (R$ 3.325) e auxiliares de enfermagem e parteiras, pelo menos 50% (R$ 2.375).
Em entrevista ao Acorda Cidade, a enfermeira Naira Lorrane, que faz parte da coordenação de uma cooperativa que emprega enfermeiros e técnicos de enfermagem em Feira de Santana, comemorou a aprovação do novo piso, mas entende que num primeiro momento, o reajuste causará impactos negativos nas empresas privadas e que prestam serviços pelo SUS, como também para profissionais da área, que correm o risco de serem demitidos.
“Infelizmente algumas empresas privadas já demitiram profissionais e estão buscando outros através de empresas terceirizadas e cooperativas, porque pagam um valor inferior. Algumas empresas estão solicitando também que profissionais tenham CNPJ, mas enfermeiro com nível superior não pode trabalhar como MEI, isso está no Coren, quem tiver interesse pode estar pesquisando. Existe também a possibilidade de profissionais trabalharem com Pessoa Jurídica, isso já acontece com os médicos, então eles pagam o INSS, só que o médico recebe o valor superior de um enfermeiro, três vezes mais, então para nossa classe de enfermeiro e técnico não é compatível essa condição”, afirmou a profissional de saúde.
Ela ressaltou que a categoria está assustada com a onda de demissões que pode ocorrer, como também a dificuldade de enfermeiros encontrarem trabalho.
“O nosso medo é que haja demissão, diminuição de enfermeiros de nível superior e contratação mais de técnicos, por receberem um valor inferior ao do enfermeiro. Mas isso irá trazer consequências, porque existem procedimentos que são específicos de enfermeiro e não de técnico, e pode ser que o técnico também fique sobrecarregado, por exemplo, em uma enfermaria, onde antes era responsável por 10 pacientes e irá passar a atender 15. Terá uma sobrecarga de trabalho. Isso pode implicar na assistência ao paciente”, pontuou.
Mesmo diante dos entraves à profissão, ela avalia que o novo piso é um valor justo, pelo qual a enfermagem batalhava há quase 30 anos. Além disso, a disparidade de salários pagos aos profissionais entre as empresas deve diminuir.
“Haverá agora um salário que possa igualar, porque entre hospitais e clínicas, infelizmente há uma divergência de valores. Tem enfermeiros que trabalham a mesma carga horária, com a mesma função e capacidade e recebe valores extremamente diferentes. Então o piso irá fazer com que todos se igualem no mesmo valor e as empresas deverão buscar profissionais mais qualificados para trabalhar”, afirmou.
Na outra ponta do processo, o médico nefrologista e sócio-proprietário de uma clínica em Feira de Santana, César Oliveira, se mostrou preocupado com a elevação dos gastos com pessoal nas empresas e confirma que muitas já estão enxugando seus quadros de funcionários.
“A lei acabou de entrar em vigor e será a partir do próximo fechamento de fatura do mês. Mas há uma preocupação muito grande, especialmente no setor de diálise. Há um caos que está sendo instalado por conta desse reajuste. Não estamos discutindo a justiça de que as pessoas busquem ter o seu salário aumentado, o problema é como obter o recurso das nossas fontes pagadoras para fazer esse repasse. O setor já vinha defasado, e eu agora terei um reajuste de mais de 100% na folha salarial”, avaliou o especialista.
Ele argumentou que as clínicas de hemodiálise, em sua maioria, são prestadoras do Sistema Único de Saúde (SUS), onde o serviço é ofertado quase que 95% pelo SUS, que paga preços tabelados às empresas.
“Na hora que eu acrescento um custo e não posso passar esse reajuste, isso torna o setor absolutamente inviável de funcionar, porque não há maneira de se colocar um reajuste de mais de 100% da folha salarial em um produto que você não pode fazer reajuste do valor. Inicialmente é um susto que todo mundo tomou e ninguém sabe o que fazer, mas no Brasil todo já começa a ter redução no recebimento de pacientes, e os pacientes já estão ficando nos hospitais sem encontrarem vagas nas clínicas satélites e essas clínicas vão inevitavelmente reduzir os seus serviços ou, pelo tamanho do prejuízo que está sendo estabelecido, pode chegar a uma situação ainda mais dramática de fechamento do serviço e devolução dos pacientes do SUS”, alertou.
Para o médico e empresário César Oliveira, a única solução para viabilizar os serviços é o governo alterar o valor que está pagando atualmente na tabela SUS para corrigir esse déficit que impôs ao serviço.
“Se o governo quer fazer o reajuste, que é justo, precisa arcar com os prestadores de serviço públicos, não só as Santas Casas, mas todas as empresas que prestam serviço ao SUS, já que está impondo uma despesa excessiva a um setor que já vinha sucateado há bastante tempo. Hoje eu emprego cerca de 40 funcionários no serviço a depender do período e ainda não temos uma posição a respeito de demissões, porque ainda estamos aguardando essas negociações, esses recursos jurídicos, se encontram uma solução, ou se o governo toma uma atitude de resposta a essa situação. Se nada for modificado, vamos cogitar sim na demissão, e também não posso dizer quanto, porque também há um limite para que possa demitir, afinal eu não tenho gordura para enxugar. Estou trabalhando nos limites técnicos, então vou ficar no prejuízo”, lamentou.
Com informações do repórter Ney Silva do Acorda Cidade.
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