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Educação, saúde, economia, segurança. Falta pouco menos de um mês para a eleição, mas temas tradicionais como estes parecem ter perdido espaço nos discursos e estão cada vez menos na ponta da língua dos candidatos mais bem colocados nas pesquisas da disputa presidencial.
Nas últimas semanas, o noticiário político virou caso de polícia. Em vez de propostas, ideias e promessas, os candidatos têm se dedicado mais a fazer e a rebater críticas e acusações sobre o vazamento de dados fiscais na Receita Federal.
O caso acentuou a polarização entre os candidatos do PSDB, José Serra, e do PT, Dilma Rousseff. O tucano acusa a campanha da adversária de ser responsável pelo acesso e vazamento de informações sigilosas de pessoas ligadas a ele, dentre as quais sua filha, Verônica, e o marido dela, o empresário Alexandre Bourgeois.
Dilma, em contrapartida, nega qualquer envolvimento. Ela tem dito, repetidas vezes, que a oposição usa acusações falsas e cria factoides para tentar atingir sua candidatura. A ex-ministra lidera as pesquisas e tem chances de se eleger presidente ainda no primeiro turno.
Quem fica no meio deste fogo cruzado, que conta também com eventuais participações de Marina Silva (PV) e Plínio de Arruda Sampaio (PSOL), é o eleitor, que para especialistas ouvidos pelo R7 acaba sendo o maior prejudicado pela situação.
O professor Marco Antônio Teixeira, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), lamenta a atitude dos candidatos de estarem abdicando de discussões políticas para dar prioridade ao caso da Receita.
– Parece que a eleição acabou. Você não tem debate eleitoral. O debate está muito mais no campo policial. É lamentável, sobretudo porque não estamos discutindo questões mais importantes, como ideias, programas e projetos.
Na opinião do advogado constitucionalista Luiz Tarcísio Ferreira, professor da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo, tanto os candidatos como a imprensa estão errando ao dar uma atenção excessiva a um caso que, segundo ele, sequer pode ser chamado de “escândalo” e que diz respeito apenas à Receita Federal.
– Houve quebra de sigilo, provavelmente [feito] por funcionários subalternos, algo que não devia acontecer e que é um crime que deve ser investigado. Agora, a repercussão que isso está trazendo, ou que estão tentando trazer para o processo eleitoral, não condiz com o debate que devia estar sendo travado. Qualquer vazamento é crime, mas não tem essa gravidade que estão querendo empregar.
Para ele, por mais que o assunto seja colocado no noticiário e na propaganda eleitoral de rádio e televisão, o eleitor muito dificilmente mudaria seu voto em função disso.
– Não me parece que este caso, pelas características, possa alimentar uma repulsa popular que mudasse o cenário de qualquer coisa. Então, parece até um equívoco que os candidatos estejam dando a isso uma dimensão que não tem.
Teixeira tem uma opinião parecida, mas ressalta que será necessário esperar as próximas pesquisas para medir com mais exatidão o impacto sobre a escolha do eleitor. Ele também chama a atenção para o fato de que, até o momento, não foi comprovado nenhum elo entre o vazamento de dados e pessoas da campanha de Dilma.
– Isso não é suficiente para alterar de forma significativa as tendências de uma decisão política que já havia se consolidado. Você pega o caso dos aloprados [de 2006], que também foi muito perto do processo eleitoral, ele talvez tenha sido decisivo para haver segundo turno, mas não alterou o resultado da eleição [o presidente Lula foi reeleito].
O professor da FGV aponta para fatores que, em sua visão, pesam mais para determinar o resultado que sairá das urnas.
– Se o país está indo bem, se ele [o eleitor] sente isso no bolso e na mesa, ele faz um cálculo extremamente racional. Eu preciso ter um motivo muito forte para mudar. (As informações são do R7)