Acorda Cidade
O recente agravamento da crise política entre o presidente Jair Bolsonaro e seu partido, o PSL, expõe uma disputa que afeta não apenas a atual administração e a articulação do governo com o Congresso Nacional. A disputa opõe o grupo fiel a Bolsonaro, que não controla a sigla, à ala de dirigentes que sustentam o deputado Luciano Bivar no comando da legenda.
O racha envolve quatro frentes principais:
– O controle do PSL – nessa guerra partidária interna, os bolsonaristas desejam o controle absoluto do partido, mas enfrentam resistência imposta por Bivar. Aliados de Bivar – que, nas palavras de Bolsonaro, está "queimado" – garantem que ele não irá entregar "de jeito nenhum" o comando da sigla;
-O controle da verba milionária do PSL – antes de Bolsonaro, o partido era nanico, mas, a reboque da popularidade do então candidato, elegeu a segunda maior bancada da Câmara e, graças a isso, tem direito a uma fatia considerável do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (o chamado fundo partidário) e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (o fundo eleitoral);
– A saída ou não do Bolsonaro e deputados do PSL – a cúpula do partido avalia a possibilidade de liberar Bolsonaro e cerca de 20 parlamentares considerados infiéis caso que eles abram mão do dinheiro do fundo partidário. Esses deputados, no entanto, avaliam uma saída jurídica caso decidam deixar a sigla. Isso porque, nessa hipótese, correriam o risco de perder o cargo, já que o partido pode recorrer à Justiça Eleitoral se um parlamentar se desfilia sem justa causa.
Bolsonaro filiou-se ao PSL apenas em janeiro de 2018. Em seu blog no G1, Helio Gurovitz avaliou que a escolha do então candidato se deveu ao fato de a legenda ter lhe oferecido "condições mais vantajosas para promover sua disputa – ao fim vitoriosa – pelo poder". "Desde o início, o PSL não passou de um hospedeiro para o movimento bolsonarista que se erguia nas redes sociais", escreveu Gurovitz.
Além disso, uma das condições que Bolsonaro impôs ao PSL para se filiar era que, durante a campanha, a presidência do partido fosse ocupada por Gustavo Bebianno, o que de fato ocorreu. Horas depois da eleição, Bivar reassumiu o posto.
Na esteira da campanha de Bolsonaro, o partido elegeu 52 deputados (atualmente, são 55, sendo dois licenciados). Para efeito de comparação, na eleição de 2014 a legenda havia eleito apenas um.
O PSL se tornava agora o segundo maior partido da Câmara e a principal força governista no Congresso. Dessa forma, a participação no fundo partidário saltou de R$ 9,7 milhões em 2018 para R$ 110 milhões em 2019 – e a expectativa é que, em 2020, o valor fique entre R$ 400 milhões e R$ 500 milhões.
Já com relação ao fundo eleitoral, a previsão para o pleito do próximo ano é que a legenda receba quantia superior a R$ 200 milhões – graças aos mais de 10% de representação da Câmara dos Deputados.
Esse dinheiro todo está sob administração dos dirigentes do partido – e eles respondem não a Bolsonaro, mas, sim, a Luciano Bivar, o presidente da sigla. É o mesmo Bivar que, na avaliação de Bolsonaro, está "queimado".
O comentário foi feito semana passada e tornou público o atrito entre o presidente e o PSL, dando início a uma escalada de troca de declarações críticas que acirraram os desentendimentos.
Como presidente do partido, Luciano Bivar tem influência direta sobre:
– Distribuição dos fundos partidário e eleitoral;
-Indicação de líderes do partido na Câmara e no Senado;
– Distribuição de cargos no partido e nos diretórios e comissões provisórias dos estados e municípios.
Em meio à queda de braço, surgiram os rumores de que Bolsonaro e um grupo de parlamentares fiéis a ele poderão deixar o PSL, o que não foi confirmado oficialmente pelo presidente.Pela legislação eleitoral, um deputado só pode mudar de partido se estiver diante de circunstâncias específicas, como desvio no programa partidário ou se houver sofrido grave discriminação pessoal na legenda.
Caso contrarie a regra, o parlamentar pode ser enquadrado em infidelidade partidária e perder o mandato.
Dois fatores são considerados essenciais para a sobrevivência do partido político: O valor que a sigla recebe do fundo partidário e o tempo de propaganda gratuita na TV que a legenda possui.
Em ambos os casos, a conta é feita levando-se em consideração a quantidade de deputados que a sigla elegeu na última eleição. Quando um deputado muda de partido, mesmo que dentro da lei, ele não contribui para o aumento do fundo partidário e do tempo de TV da nova sigla. Para essa finalidade, a Justiça Eleitoral considera o tamanho das bancadas eleitas.
Na última eleição, o PSL foi o segundo partido que mais elegeu deputados – 52 no total, atrás somente do PT, que elegeu 56. Nos cálculos dos insatisfeitos que pretendem deixar o PSL, entra o fato de que, se saírem do partido, vão deixar uma considerável fatia de verba e tempo de TV para aqueles que ficarem.
Nesta quarta-feira (16), Bolsonaro afirmou que não deseja "tomar o partido de ninguém" e defendeu “transparência” do PSL no uso dos recursos públicos que a legenda recebe – segundo o presidente, são cerca de R$ 8 milhões mensais. Questionado se defende a saída de Bivar da presidência da sigla, declarou que não está "tumultuando a relação" com o PSL.
Fonte: G1