Mantidos pela Câmara longe dos holofotes, os arquivos que guardam os comprovantes de despesas dos deputados escondem um escândalo. A Folha obteve no STF liminar que ordenou à direção da Câmara a abertura das gavetas referentes aos quatro últimos meses de 2008.
A contragosto, a Câmara viu-se compelida a abrir quatro gavetas de seu vasto arquivo secreto. Referem-se aos últimos meses de 2008. No total, são cerca de 70 mil documentos. Nas últimas duas semanas, os repórteres Alan Gripp e Ranier Bragon varejaram 2 mil folhas.
Foi o suficiente para descobrir que o uso da chamada verba indenizatória (R$ 15 mil mensais por deputado) não resiste a uma inspeção ligeira. Para justificar o dinheiro subtraído das arcas da Viúva, foram levadas à caixa preta da Câmara notas de empresas de fancaria. Aos exemplos:
1. Chama-se SC Comunicações e Eventos a empresa que mais recebeu verbas relativas a serviços de consultoria. Para “atender” a dez deputados e ex-deputados, a SC beliscou R$ 115 mil. A reportagem foi ao endereço que consta da nota.
Encontrou uma casa humilde, na cidade goiana de Luziânia. Dono do imóvel, o caminhoneiro Giovani Braz de Queiroz disse: “Nunca funcionou nenhuma empresa ali, isso eu posso garantir”. O proprietário da SC é o jornalista Umberto de Campos Goularte.
Vem a ser assessor do senador João Durval (PDT-BA). Atribui o “erro” de endereço ao contador. Alega ter prestado serviços de assessoria de imprensa. O diabo é que, para essa atividade, os deputados já dispõem de verbas específicas –R$ 60 mil ao mês.
2. Um par de deputados baianos –Severiano Alves (PMDB) e Uldurico Pinto (PHS)—levaram aos arquivos um lote de notas da Valente & Bueno Assessoria Empresarial. Nos quatro meses submetidos a exame, migraram da Câmara para a caixa registradora da empresa R$ 56 mil.
As notas informam que a firma funciona num endereço da Asa Sul de Brasília. Um apartamento. O dono jamais ouvira falar da Valente & Bueno. No último mês de abril, data em que a Câmara passou a veicular na web dados numéricos e nomes de empresas, a Valente sumiu dos registros.
3. O deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA) pendurou nos arquivos três notas emitidas pela Seven Promoções. A numeração – 1, 2 e 3 — sugere que a empresa tinha no deputado o seu único cliente. Aberta em 1999, só buliu no talonário em 2008.
No endereço anotado nos documentos fiscais funciona uma corretora de seguros, não a firma de “promoções”.
Informações do Folha