Andrea Trindade
A ex-mulher do advogado Júlio Zacarias Ferraz, 43 anos, Gláucia Mara Ottan Machado Ferraz, foi presa, na manhã desta quinta-feira (14), acusada de mandar matá-lo, por motivos relacionados ao divórcio. Também foi presa a empregada da acusada, Maria Luiza Borges do Carmo, 27, que relatou à polícia todos os detalhes de como o crime foi praticado. Esta é acusada de manter contato com os matadores, que dividiram a quantia de 4 mil reais para assassinar o advogado.
Júlio Zacarias ficou desaparecido por cerca de 15 dias, e o corpo foi encontrado e identificado em Oliveira dos Campinhos, na zona rural de Santo Amaro, depois que familiares perceberam seu sumiço e procuraram a polícia para investigar o que aconteceu. (Relembre aqui)
Aos policiais, a empregada informou que estava sendo ameaçada pela patroa e que ele foi dopado pelos matadores.
“Ela me ameaçou muito para executar, disse que já não aguentava mais ele, que já estava cansada e queria se separar dele, só que ele não queria dar o divórcio para ela. Eles [os matadores] não são daqui, estavam a serviço. Ele já estava desaparecido no dia 15, no dia do aniversário do filho. Primeiro ele foi sedado com uma substância, aí depois “os caras” o levaram primeiro para um quartinho, pra ele ficar sedado, aqui em Feira, [e depois levaram ele para Santo Amaro]”, contou.
Foto: Aldo Matos/Acorda Cidade
A empregada disse que não estava perto do advogado quando ele foi morto, mas ouviu Júlio pedindo socorro e dizendo que já desconfiava que Glaucia queria matá-lo.
Maria Luiza disse que trabalha na casa dos dois há quase um ano e que o relacionamento deles era conturbado e que ela pediu a separação.
“Ela ficava brigando com ele (…) e ele não aceitava a separação. Ela botava ele pra fora de casa várias vezes, chamava a polícia e tudo. Mas é mentira dela e invenção que ele a estuprou. Ele nunca faria isso. Ela pagou dois mil reais pra cada matador. Eu só sei que não tenho nada a ver com isso, quem tem a ver é ela, porque quem praticou todo o crime foi ela, e não fui eu. [O que eu fiz] foi com medo, ela ameaçou matar o meu pai e por tanto amor que tenho ao meu pai, eu não queria que acontecesse nada de ruim, nem com meu pai, nem com minha família”, declarou, afirmando que não recebeu nenhum pagamento da patroa para manter o contato com os matadores.
Na delegacia, Gláucia disse que a empregada tem problemas mentais. Ela disse também que queria fugir da vítima e que tinha medida protetiva contra ele. "Ele me agredia o tempo todo, ele teve duas prisões em flagrante. Estamos separados desde 2012, mas não estávamos divorciados. Eu queria o divórcio, mas não conseguia, porque eu nunca sabia onde ele morava”, informou.
As investigações
A investigação do homicídio foi realizada pela Polícia Civil de Santo Amaro e Feira de Santana de forma paralela, por meio de uma força-tarefa, que contou inclusive com o apoio da Polícia Federal. Segundo o advogado David Lopes, uma denúncia apontou a empregada de Gláucia como alguém que poderia ter informações sobre as brigas que ocorriam entre o casal, inclusive sobre a intenção de matá-lo.
“Diante dessa informação, fomos até a empregada, Maria Luiza, e a mesma em seu interrogatório confessou todo o crime (…), deu todas as coordenadas de como o crime deveria ser cometido. A gente ainda está levantando a identificação dos autores e assim que forem identificados e localizados, serão também apresentados e presos. Todos os elementos levantados até então na investigação levam a essa conclusão, de que a Gláucia, em função da questão patrimonial, das brigas que ela tinha constantemente com o Sr. Júlio, em função da discordância que eles tinham com relação ao divórcio, ela veio a praticar esse crime com auxílio de Maria Luiza e os outros dois indivíduos que também cometeram o crime”, informou o delegado ao Acorda Cidade.
O delegado disse também que a riqueza de detalhes do depoimento da empregada fez a polícia acreditar na versão dela.
“Ela narra com detalhes. Inclusive, ela traz fatos à investigação que só a polícia sabia e ninguém mais sabia, mostra todo o envolvimento que ela teve no caso e todo momento que Gláucia também teve”, destacou.
Acusada usou símbolo do TJ-BA indevidamente
Foto: TJ-BA
A acusada é natural do Rio de Janeiro e funcionária pública estadual aposentada. Em julho de 2018, ela foi flagrada furando fila em um posto de gasolina em Feira de Santana, durante a greve dos caminhoneiros, e um vídeo viralizou nas redes sociais. Na ocasião, Gláucia estavava usando um carro da mãe, com o símbolo do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). O veículo foi apreendido. (Relembre aqui).
As investigações continuam
Força-tarefa formada por delegados de Feira de Santana e Santo Amaro (Foto: Aldo Matos/Acorda Cidade)
O advogado estava desaparecido desde o dia 15 de janeiro, e o corpo foi encontrado com sinais de execução, com as mãos amarradas, na cidade de Santo Amaro, no dia seguinte, mas estava sem identificação. Apenas no último dia 5 de fevereiro, um dia após a família registrar queixa do desaparecimento, o corpo foi identificado.
Além da ex-mulher e do filho, Júlio Zacarias não tinha parentes em Feira de Santana, por isso os familiares, que residem em Vitória da Conquista, disseram que demoraram para perceber o desaparecimento e procurar a polícia.
A Ordem dos Advogados do Brasil – subseção Feira (OAB-Feira) solicitou uma força-tarefa para investigar o assassinato.
O delegado Roberto Leal, coordenador regional de polícia (1ª Coorpin), informou ao Acorda Cidade que agora a polícia busca a identificação dos demais envolvidos no crime.
“Uma das interrogadas falou da participação de duas pessoas, mas pode ter mais pessoas. Estamos aqui aguardando algumas provas técnicas que nos foram solicitadas, imagens das câmeras de vigilância do condomínio e no entorno do local, e também informações que estão sendo coletadas pelo delegado Rafael e o delegado Adriano lá em Santo Amaro. Todas essas informações são importantes, inclusive a testemunha que foi ouvida lá em Santo Amaro e a empregada aqui confirmaram pra gente o fato”, disse Roberto Leal ao Acorda Cidade.
O delegado explicou a participação da Polícia Federal no caso. “Houve sim um apoio precioso da Polícia Federal nesse momento, pois foi um crime de difícil elucidação porque englobava duas cidades e duas circunstâncias. A gente necessitou desse apoio e eles são constantes nestes auxílios. Quero dizer aqui que essa parceria produz constantes resultados e estamos aqui para contar com o apoio sempre que for necessário e agradecer também o apoio da Justiça de Santo Amaro – Foram extremamente sérios em relação aos pedidos que foram feitos no Ministério Público daquela cidade e vamos continuar com as investigações porque agora é preciso localizar os demais participantes”, declarou.
O delegado Roberto Leal disse também que não ficou surpreso com a acusação contra a ex-mulher da vítima.
“Desde o início, as informações que foram angariadas pelo delegado David e também informações que foram prestadas tanto por colegas de profissão, como por familiares do Júlio, já traziam essa informação contra ela”, concluiu.
O delegado Adriano Lobo, da Polícia Civil de Santo Amaro, disse que ao encontrar o corpo a polícia já percebeu que não se tratava de um homicídio comum, até mesmo porque as informações chegariam com mais velocidade se a vítima fosse da cidade em que o corpo foi encontrado.
“O Trabalho da Polícia Civil de Santo Amaro começa com a localização do corpo. De imediato, verificamos logo que se tratava de uma morte bastante diferente da que costumamos ver, era uma pessoa de meia idade, uma pessoa bem tratada, com sinais de execução com as mãos amarradas para trás, o corpo parcialmente carbonizado, e marcas de disparos de arma de fogo. Então desde o início já percebemos que tinha alguma coisa estranha naquele crime, diferente do que costumamos ver no dia a dia. Causou mais estranhamento ainda quando verificamos que se tratava de uma pessoa que não era da região, porque quando há geralmente algum homicídio aqui na região, as informações logo chegam e iniciamos as investigações sobre como aquele corpo teria ido parar lá, até que fosse possível a identificação – O aprofundamento das investigações só poderia ocorrer a partir da identificação. Com a reclamação aqui por parte da família de um desaparecido praticamente 15 dias depois da localização do corpo (que estava sem identificação) é que aí foi possível a troca de informações entre a Polícia Civil de Santo Amaro e a Polícia Civil de Feira de Santana. Solicitamos que a família fosse ao IML de Santo Amaro reconhecer o corpo e a partir daí demos início à investigação mais aprofundada sobre as causas do crime”, recordou o delegado.
Advogado Alexandre Serapião, presidente da Comissão Prerrogativa da OAB Feira, parabenizou o trabalho da Polícia Civil e lamentou a morte do colega.
"É um misto de tristeza e de alívio. Sempre que há um fechamento é um alívio para a sociedade, para as famílias e para a OAB, mas é triste pelo que ocorreu. Estamos perplexos. A OAB acompanhou os passos da investigação e aproveito para parabenizar a equipe do delegado Roberto Leal e demais delegados. Ficamos surpresos porque nunca esperamos que a mãe dos filhos, a esposa, seria a mandante, então estamos realmente surpresos”, declarou.
Glaucia Ottan e Maria Luiza Borges tiveram as prisões decretadas pela justiça de Santo Amaro.
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Com informações do repórter Aldo Matos do Acorda Cidade