Lição de vida

Paciente renal que aguarda transplante compartilha rotina e esperança em redes sociais

Através das redes sociais, ela conta as dores de ser uma paciente renal e os altos e baixos de uma rotina à espera de um novo rim.

Rachel Pinto

Uma vida que pulsa através de dois cateteres, passa por longas sessões em uma máquina de hemodiálise, mas que jamais perde a fé em Deus e a esperança na cura. Um exemplo de luta, superação e força que vem através de uma jovem de 24 anos com muitos sonhos, medos e dúvidas.

Esse é o resumo de quem é Camila Carvalho Coelho. Paciente renal desde os cinco anos de idade, que vem enfrentando longas batalhas e não perde vontade de viver. O sorriso largo no rosto ofusca suas marcas de agulha no corpo e sua história traz uma oportunidade de reflexão e redescoberta.

Através das redes sociais, ela conta as dores de ser uma paciente renal e os altos e baixos de uma rotina à espera de um novo rim.

Problemas renais desde a infância

A batalha de Camila começou ainda na barriga da mãe. Vinda através de uma gravidez de risco, desde bebê começou a apresentar muitos problemas de saúde. Não havia diagnóstico preciso e tudo era tratado como febre e garganta inflamada. Até que um dia, uma tia enfermeira falou na necessidade de investigação dos problemas de saúde da criança e então a família começou a procurar opiniões de especialistas.

“Quando minha mãe ficou grávida de mim já apresentava muitos problemas. Teve uma gravidez de risco, infecção urinária e ficou até o último momento fazendo tratamento. Eu já nasci com alguns problemas e sempre tinha febre, garganta inflamada e várias outras coisas. Um dia, uma tia minha desconfiou e então me levaram a um especialista. Com cinco anos foi descoberto um problema na bexiga e eu fiz a primeira cirurgia”, afirmou.

Refluxo vesicolateral era o nome do problema na bexiga de Camila. Segundo ela, é uma situação que acontece quando a urina vai para os rins. Após a cirurgia, a expectativa da família era que a criança voltasse a ter uma vida normal e tivesse a saúde restabelecida.

Puro engano e a confirmação que novos desafios estariam por vir. A cirurgia não foi bem sucedida e novos problemas vieram a comprometer os rins. Com sete anos, depois da separação dos pais, o quadro de saúde de Camila se agravou e os rins pararam de funcionar. Desde então a vida da jovem é dividida com uma máquina de hemodiálise.

“Com sete anos eu tive uma crise muito grave. Meus pais separaram e minha mãe tinha acabado de ter neném. Eu fiquei muito mal e passei quase um ano na UTI. Minha mãe se dividia comigo e meu irmão e aí veio a hemodiálise. Foi passado o primeiro catéter e eu fazia o tratamento em casa. Minha mãe fez um treinamento e era ela quem fazia o procedimento. Foi uma fase bem difícil e já com dez anos comecei a ter sérios problemas vasculares e o catéter infeccionou”, lembrou.

O transplante e a rejeição

Com os rins parados e vários problemas ósseos e vasculares, a indicação para o transplante de rim era certa. A mãe que sempre esteve ao lado da filha dando força e apoio não mediu esforços e foi a doadora. Aos 13 anos Camila recebia o novo rim.

Quatro anos se passaram e a rotina ia muito bem. Ela conseguia fazer suas atividades normais de uma adolescente e o quadro de saúde estava estabilizado.Tudo estava muito bem e tranquilo, quando mais uma notícia veio para abalar a família e saúde de Camila.

Os avós faleceram, o psicológico ficou muito abalado e para piorar a situação, o organismo rejeitava o novo rim. O medicamento no corpo para manter o transplante estava insuficiente e ai veio a rejeição. O rim doado parou de funcionar.

“Quem é transplantado precisa tomar medicamentos para não ter rejeição pelo resto da vida. Por questões burocráticas do governo, faltava a medicação e na época não tínhamos outros recursos para buscar. Também fiquei muito abalada com o falecimento dos meus avós e assim houve a rejeição”, contou.

Hemodiálise

Com a rejeição, Camila voltou a fazer hemodiálise. De lá pra cá, muita coisa aconteceu e muitos altos e baixos surgiram na vida da jovem. Problemas no tratamento ocasionaram água no pulmão, diversos internamentos, idas para UTI, trombose, problemas de coagulação, baixa de cálcio, cateterismo e também um abalo emocional muito grande. Ela conta que cada dia é uma nova história e tem dias que está bem melhor, em outros se sente muito mal e até pensa em desistir.

“Eu sempre tive muita dificuldade de acesso venoso. Há uns cinco anos eu fiz o implante de uma fístula e sempre faço a hemodiálise por ela. Não precisa furar em vários locais e assim facilita o tratamento. Eu faço hemodiálise três vezes por semana e o tratamento geralmente dura quatro horas. Eu só faço três porque eu não aguento mais do que isso”, explicou.

Na fila para o transplante

A espera durante o tratamento é acompanhada também da espera para o novo transplante de rim. Camila é a primeira paciente da fila e ainda não fez o procedimento porque está com o painel de anticorpos muito alto. Para receber o rim, ela precisa normalizar as taxas e mensalmente ela vai a Salvador duas vezes para tomar medicação para baixar os anticorpos.

“Não fiz o transplante ainda porque o meu painel de anticorpos está alto. Devido às transfusões e hemodiálise. Quando esse quadro estiver controlado, o primeiro rim que aparecer será meu”, comemorou.

Dificuldades e perdas pelo caminho

Ao contar a sua história, Camila se emociona ao falar das dificuldades e também algumas perdas que têm tido ao longo do tratamento. Vez ou outra faltam materiais, funcionários e até lanche e transporte para os pacientes que vêm de fora. Muitos amigos também encerraram a sua trajetória na Terra e cada perda traz uma mistura de medo, reflexão e saudade. Mas, para Camila um dos maiores desafios é justamente a instabilidade da saúde e não poder fazer planos a longo prazo.

“A maior dificuldade pra mim é não poder programar muita coisa. Não sei como vou acordar amanhã, se posso planejar um passeio ou uma viagem. Posso estar bem, ou talvez passe mal. A gente nunca sabe do dia de amanhã. Minha maior vontade é poder ter saúde, poder fazer minhas coisas normais, como sair, estudar e cursar uma faculdade”, salientou.

Apoio da mãe e muita fé

Para enfrentar tantas batalhas, Camila busca se sustentar na fé e também conta com o apoio da mãe que ela considera uma grande guerreira. Ela também busca se manter firme nas restrições, principalmente alimentares, e procura manter uma dieta controlada, evitando o sal e alimentos com potássio. Segundo ela, carambola, por exemplo, é uma fruta que o paciente renal não pode consumir de jeito nenhum. A fruta possui uma substância tóxica que pode ser muito prejudicial para o paciente.

“Minha mãe me apoia em tudo. Tanto na parte financeira como emocional. Minha mãe é uma guerreira. É minha amiga e me dá muita força para continuar. Também tenho Deus, porque tudo me leva a desistir. Mas, aí vem Deus e fala: Não desista, você vai conseguir, sua cura vai chegar e assim eu vou lutando”, acrescentou.

O blog e as redes sociais

Como toda jovem, Camila gosta de conversar, sair com os amigos e também compartilhar seu dia a dia nas redes sociais. Ela também é muito vaidosa e adora estar maquiada, usando esmaltes e looks da moda. As selfies são sempre caprichadas e ao longo dos dias ela tem adquirido muitos seguidores com o blog e também o youtube. Com essa interação surgiram novos amigos e trocas de experiências com outros pacientes.

Batizado com o nome “Cara de Hoje”, o blog mostra que cada dia para o paciente renal é diferente. De acordo com Camila, cada dia ela acorda com uma cara, às vezes com um humor diferente e o objetivo é mostrar que entre tantas oscilações busca manter o equilíbrio e a esperança.

“O blog e o youtube vieram para me animar ainda mais. Melhoraram muito a minha autoestima. Tem muita gente que me acompanha, me incentiva e assim eu busco levar uma vida dentro da normalidade. Estou muito feliz com essa repercussão e meu maior sonho é agora compartilhar a nova etapa do transplante. Acredito e tenho muita fé em Deus que tudo dará certo”, ressaltou.

Na sala de hemodiálise

Enquanto o sangue é filtrado, as três horas de tratamento passam mais rápido e são mais divertidas na companhia dos amigos que também são pacientes. A conversa corre solta com Daniel, Ângela, Seu Armando e Dona Maria. São muitas brincadeiras e histórias que animam as tardes da hemodiálise. Os funcionários da clínica e a equipe médica também são muito receptivos e atenciosos e todos já se tornaram uma grande família. Para Camila, o carinho e atenção são fundamentais para o tratamento e ainda é preciso mais ações nesse sentido voltadas para os pacientes.

Muitos acabam tendo depressão e esse suporte emocional é de extrema importância.
“Aqui somos uma grande família. Quando há uma perda abala com todos, quando acontece algum problema e um paciente não vem já ficamos preocupados. Somos solidários uns com os outros e vivemos todos na mesma expectativa e na luta pela saúde”, disse.

Campanha para Doação de Órgãos

Uma das grandes bandeiras levantadas por Camila é o incentivo à doação de órgãos e a possibilidade de salvar vidas. Ela faz campanha nas redes sociais com esse objetivo e busca sensibilizar os seus seguidores sobre esse gesto de amor. Além disso, ela também divulga informações sobre a doença renal para também diminuir o preconceito e muitos questionamentos que as pessoas fazem por falta de esclarecimento.

“Sempre me perguntam: você vai tomar sangue de quê? Essa doença pega? Existe muita falta de informação e é importante quebrar isso e incentivar as pessoas à doação de órgãos”, finalizou.

Para fazer parte da rede de amigos de Camila Carvalho Coelho e acompanhar as suas histórias siga o Blog Cara de Hoje no Instagram: @caradehoje.

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