Com apenas um carro e a motivação de pessoas dispostas a ajudar, nasceram as ações do grupo FSA Invisível, coletivo que ajuda pessoas em situação de rua em Feira de Santana. Os voluntários distribuem alimentos, cobertores, agasalhos, mas sobretudo, eles oferecem atenção, disposição e carinho para quem precisa. Um desses voluntários é Rafael de Jesus, que mesmo trabalhando como gerente de loja, se colocou à disposição para fazer parte de uma ação tão necessária na cidade.
Ao Acorda Cidade, Rafael falou sobre o FSA Invisível e o propósito de escuta, acolhimento e a promoção da dignidade por trás das ações do coletivo que já perduram por mais de três anos.
“Nossa principal base é a escuta, a comida e a dignidade. Depois da pandemia, percebemos que as pessoas em situações de rua tinham aumentado e a gente com outras pessoas pensamos em como ajudar. Daí surgiu o FSA Invisível”, contou.
Atualmente, cerca de 150 pessoas são voluntários do coletivo, em média de 60 deles são ativos diretamente nas ações.
Doação
Antes mesmo de sair nas ruas, a equipe do FSA Invisível se reúne para se preparar. Todo domingo, eles seguem para a sede do coletivo, às 14h, para organizar a ação do dia, que é a distribuição de cachorro-quente, preparação do café e a separação dos itens que serão doados. Às 18h eles vão para as ruas ajudar quem mais precisa.
As ações dos voluntários atingem mais de 120 pessoas entre diversos locais da cidade, como pessoas que se encontram na Avenida Presidente Dutra, nos arredores do Centro Social Urbano (CSU), no bairro Cidade Nova, também próximo à rodoviária, entre outros. Durante todo do ano, inclusive, em datas especiais como o natal, eles também atuam.
“A gente não tem sede própria. Estamos caminhando para futuramente conseguirmos. O principal objetivo é atender as pessoas que estão de rua. A gente não vai com o objetivo de julgar, de converter ninguém, mas para apoiar, levar a comida, porque eles estão com fome. Mas, a gente também leva a escuta e através dela conseguimos ouvir as histórias deles, quebrar os estigmas, os preconceitos que existem com a população da situação de rua e dar um pouco de dignidade”, pontuou Rafael.
A cada primeira ação do mês, um Kit Dignidade é doado. São itens de higiene pessoal, sabonete, shampoo, condicionador, papel higiênico, desodorante, prestobarba, escova, pasta de dente e absorventes para pessoas que menstruam.
Como fazer parte?
A participação do grupo é 100% voluntária/sem remuneração e para quem deseja participar é preciso seguir o propósito de levar muito mais que roupas e alimentação. É preciso comprometimento com a causa e com a atenção que você está disposto a dar às pessoas que se encontram em extrema vulnerabilidade. Nessa hora, o olhar humano com o próximo é imprescindível.
“Precisamos entender qual é o propósito do FSA. Não é só levar comida, vai além disso. Então, mesmo sendo um serviço voluntário, é necessário responsabilidade e compromisso”, destacou.
Para conseguir colocar essas práticas a frente, o coletivo conta com as doações do voluntariado e da sociedade em geral que chega junto para cooperar. São pessoas do dia-a-dia que doam, empresas que surgem no Instagram querendo ajudar. É uma grande união, fazendo a força para minimizar os efeitos de uma sociedade do desemprego, da fome e da vulnerabilidade social.
Feira sem Frio
Este ano, o coletivo já iniciou a arrecadação de valores para a campanha Feira Sem Frio (FSF), que pretende doar um kit contra o frio para as pessoas em situação de rua. Através das doações, o FSA Invisível vai doar: um moletom, um cobertor, um par de meias, um kit dignidade (itens de higiene pessoal) e uma capa de chuva.
Cinco empresas já estão somando forças para ajudar nesta ação. Especificamente para essa campanha, estão sendo arrecadados valores via Pix para a compra dos kits. Veja como doar ao final da matéria.
Em ação
Segundo Rafael, um dos principais desafios é o estigma que existe com as pessoas que se encontram em vulnerabilidade social. Por isso, o trabalho desenvolvido por eles tem dedicação, mas tem conscientização e quebra de estereótipos. Neste processo, os voluntários são pessoas que passam a enxergar pessoas invisíveis.
“O principal desafio é o estigma que existe para o pessoal de rua. A gente conseguir conscientizar que quem está ali não é por querer, simplesmente amanheci hoje e vou para rua. Tem as pessoas que têm os seus vícios, também é muito mais do que querer mudar de vida, são as oportunidades. Então quebrar esse preconceito, esse estigma que existe na sociedade ainda é o nosso maior desafio. Mas também tem a conscientização interna da galera do grupo. E outro desafio é conseguir as doações, nem todo mês é de maré mansa, tem mês que a gente passa precisando de doações para manter a sede com aluguel pago, as contas pagas. A gente tem ação todo domingo, então precisa de dinheiro e tem mês que as coisas apertam um pouquinho”, revelou.
Para Rafael, a cada ação o sentimento é de querer ajudar mais. São histórias, são pessoas com trajetórias diferentes que expõem suas vidas ao ouvido de quem queira escutar. Muitas delas tentam explicar como as pessoas passam a viver nas ruas. Ele relatou uma que lhe marcou nestes três anos de ação.
“Teve um rapaz que a mãe faleceu nos braços dele. Ele acompanhou todo o processo de doença da mãe até o falecimento e depois disso, ele acabou vivendo em situação de rua. E na conversa que tive com ele, me tocou muito ele falar que o que ele mais sente falta no dia a dia é de ouvir a mãe dele. De ser ouvido pela mãe, de receber um abraço de alguém e isso mexe muito, porque eu tenho minha mãe viva. Mas nem todo dia, devido à correria da vida, a gente consegue falar, a gente consegue se ver”.
Rafael ainda falou sobre o quanto o tratamento com a sociedade invisível, como são percebidas as pessoas em situação de rua, revelam uma sociedade que está adoecida, que se importa com bens materiais e fúteis, mas não consegue abraçar uma pessoa que precisa desse abraço.
“Isso mostra o quanto a sociedade é preconceituosa. Eu vejo uma pessoa passando de rua, uma pessoa que é usuária de álcool ou droga, mas ali existe o ser humano, existem sentimentos como qualquer outra pessoa e o que ele precisa durante o dia é um abraço. E as pessoas passam, muitas vezes mudam de calçada por medo, mudam de cara. Essa história me marcou muito porque a gente é privilegiado. A gente tem afeto e muitos não têm na rua”, observou o voluntário.
Quem quiser ajudar, mas não tem condições, pode divulgar as ações do FSA Invisível através do Instagram. Rafael também pontuou ações no dia-a-dia que fazem a diferença na vida de alguém.
“É olhar para o outro com um olhar carinhoso, de afeto. Nossa cidade é muito quente durante o dia e o que a gente sempre fala é que se tem vontade de levar uma garrafa de água, leve uma a mais e ofereça à alguém que está em situação de rua. Se alguém te pede algo que você fazerá fácil, faz. Um prato de comida pode ser doado por muitos, mas principalmente, olhar para eles com um olhar humano, não com um olhar de julgamento. A gente sempre diz que erros todos nós temos, depende da nossa situação. Acertar todos nós tentamos, mas não cabe a mim, nem ao senhor, nem a qualquer outra pessoa julgar a atitude de ninguém, a vida de ninguém. Muitas vezes as pessoas com as quais nós convivemos, geralmente têm erros maiores do que as pessoas que estão na rua. E a gente acaba passando pano. Mas por que olhar para o outro com esse olhar de julgamento? Lutar pelos direitos deles também já é uma grande ajuda para nós”, acrescentou.
Veja como doar ou entrar em contato:
Campanha Feira Sem Frio inicia as arrecadações para ação de 2024
Chave pix: [email protected] (Júlia Vitória Leal)
Contato via Instagram: @fsa.invisivel
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade
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