O luto de Vilobaldo Moreira de Sousa, pai do jovem engenheiro Vinícius Moreira de Souza, de 28 anos, brutalmente assassinado durante um latrocínio na Avenida Noide Cerqueira, em Feira de Santana, traz à tona um estado devastador da violência urbana na cidade. Em entrevista ao programa Acorda Cidade, na manhã desta segunda-feira (20), Vilobaldo descreveu a perda do filho como um “deserto avassalador”, deixando claro que a tragédia marca de forma irreparável sua vida e a de toda a sua família.
O que era para ser uma atividade de lazer tornou-se um grande pesadelo quando Vinícius foi baleado na cabeça durante um latrocínio ocorrido na última quarta-feira (15), no bairro Lagoa Grande. Ele era ciclista e estava pedalando na avenida.
“Estamos em um deserto profundo, eu e a mãe de Vinícius. Com certeza, não sairemos mais desse deserto avassalador, porque a felicidade da minha casa, composta por cinco pessoas, nós perdemos 33,33% da felicidade, da alegria”, lamentou o pai. “Alegre eu ainda posso ser, porque tenho outras pessoas, em especial Davi e Marina, mas feliz, nunca mais, eu e Lúcia, porque perdemos um terço da nossa felicidade, que é irrecuperável”.
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Vinícius, de 28 anos, era engenheiro civil formado pela Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), o mais velho de três filhos e o motivo de orgulho para a família. Ele não gostava de aparecer, mas sempre fez questão de deixar seus pais orgulhosos, seguindo os valores que lhe foram ensinados.
Segundo o relato de seu pai, ele foi um dos melhores alunos no Colégio Santo Antônio. Na universidade, também se destacou pela sua dedicação aos estudos. Vinícius trabalhou por 10 anos na mesma empresa onde começou como estagiário, momentos únicos que amigos e familiares vão guardar com muito carinho.
“Desde o ensino de criança, ele sempre foi um dos melhores alunos. No ano que passou na faculdade, ele passou entre os três melhores de engenharia civil e foi garoto-propaganda do Colégio Santo Antônio no fundo dos ônibus”, relembrou o pai.
Durante a entrevista ao Acorda Cidade, o amigo Álvaro Souza Amaral também destacou o quanto todos perderam um grande ser humano que era Vinícius.
“Não só o Tio Vilobaldo e a Tia Lúcia perderam um filho, a sociedade perdeu uma pessoa incrível, excepcional, um cara brilhante em todas as acepções da palavra, inteligente, dedicado, centrado, um bom amigo, fiel, leal. Bolt, como todos o conhecemos, se chamasse para ir ao Polo Norte nadando, ele falaria, ‘peraí que eu vou pegar a sunga’. Ele é a definição de um cara bacana, um bom amigo, um bom filho, honrou seus pais, honrou da maneira que não poderia ter sido melhor, era um espelho para todos nós, para os amigos”.
Transformando a dor em esperança: doando vida
Mesmo em meio a tanta dor, a família de Vinícius se sensibilizou com a possibilidade de transformar essa dor em vida novamente. Vilobaldo e a mãe do jovem, Maria Lúcia Moreira dos Santos de Souza, decidiram doar os órgãos do filho para salvar outras vidas. Uma decisão difícil, mas que, para um pai como Vilobaldo, não havia outra saída.
“Todas as nossas decisões, uma delas foi fazer a doação dos órgãos, era o que ele faria. É algo que nós desenvolvemos e criamos nele: essa visão de respeito, de amor, de solidariedade, de carinho pela vida e pelas pessoas. Pensando nisso, eu e a mãe dele resolvemos tomar essa decisão, depois de uns 9 minutos e 20 segundos, que foram os piores que eu passei da minha vida, quando acompanhamos o protocolo clínico para assinar que o meu filho estava com morte encefálica. É muito doloroso. E agora estou saindo agora para fazer a tarefa mais difícil da minha vida: reconhecer o corpo do meu filho no Departamento de Polícia Técnica”, lamentou o pai.
“Quem vai trazer meu filho de volta?”
Apesar de todo o cuidado com a segurança, incluindo equipamentos específicos para a bicicleta, Vinícius foi assassinado em um trecho que sempre fazia parte de seu trajeto. “Nunca imaginei que o perigo fosse além dos acidentes de trânsito. Mesmo orientando para evitar certos lugares, ele foi brutalmente assassinado antes do posto onde sempre retornava”, contou o pai.
Para Vilobaldo, as prisões dos suspeitos não trazem um verdadeiro alívio. “Esse sentimento nunca mais terá sentido. Além de engenheiro, ciclista e tantas outras qualificações de seu filho, a sociedade perde um ser humano amigo, gentil, um filho, um tio, um colega respeitoso, que vai fazer muita falta na vida de todos que tinham o prazer de conviver com ele. Quando dizem que prenderam os assassinos em menos de 36 horas, eu pergunto: Que resposta? Quem vai trazer meu filho de volta? Para quem foi dada a resposta? Eu que perdi Vinícius, nunca mais ouvirei ‘pai, eu te amo’ da boca dele. A resposta não foi dada, não será dada e não é só com Vinícius que acontece isso”.
O pai relembra outros casos de violência que aconteceram este ano em Feira de Santana. Somente este mês, já são três pessoas mortas por roubo seguido de morte e, para ele, vai muito além de números. São pais de família, amigos, profissionais como seu filho que perdem a vida para uma violência desenfreada que a sociedade tem vivido. É um ciclo de violência que atinge famílias de todos os lados.
“Eu acompanho o senhor Josivaldo, que também foi assassinado no dia 16 no Tomba. Lá tem escrito ‘o pedreiro’. Não foi o pedreiro, foi um pai de família que tinha filho, que tinha esposa, que eu não conheço, mas que deve estar também lá passando pelos mesmos sentimentos de decepção. Eu tenho me cobrado muito: onde foi que eu errei como provedor da minha casa, como provedor da segurança dos meus filhos?”.
Em uma sociedade que a cada dia mais prioriza o lucro, o ganho, a materialidade, ele falou sobre a importância dos valores para se combater este tipo de violência que tem destruído inúmeras famílias. É preciso segurança pública, mas também cuidado, respeito e valores que criem uma sociedade mais humana, justa e respeitosa uns com os outros.
“Os valores familiares foram quebrados, estão sendo perdidos. As pessoas criam os filhos com valores, mas outros não criam. A mãe do assassino do meu filho falou na entrevista que ela percebia que o filho dela era envolvido com droga, que ele chegava em casa com coisas que não faziam sentido. Vai sobrar para quem? Vai sobrar para quem cuida dos seus filhos. Hoje estou sofrendo, ela também está sofrendo, mas ela vai encontrar o filho dela. Eu não serei mais abraçado por Vinícius”.
O pai também disse que não desejaria nunca o que ele está passando ao suposto adolescente que tirou a vida de seu filho. Segundo ele, essa é uma dor que nunca será cicatrizada.
Ele também disse que não se pode resolver essa situação de imediato, mas que é preciso a criação de leis que realmente atendam às necessidades da sociedade, e não interesses particulares de quem deveria cuidar da população.
“Eu não quero macular, eu não quero tirar a vida dele na sociedade. O que a gente precisa como sociedade é entender quantas dessas pessoas que fazem isso são recuperadas e voltam para a sociedade como cidadãos de bem? Não temos essa informação hoje. Hoje eu, Lúcia, e os meus filhos, em especial eu e Lúcia, vamos viver permanentemente em um deserto”, lamentou profundamente o pai de Vinícius.
O corpo de Vinícius Moreira de Souza será velado na capela do Jardim Celestial. O sepultamento será às 16h.
Para ouvir a entrevista completa, clique abaixo:
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