O desaparecimento dos grêmios estudantis livres, devido à pressão do governo militar na década de 1960, minou a política estudantil e, consequentemente, o surgimento de novos líderes nas escolas que poderiam contribuir para melhorar a qualidade da política nacional. O ex-presidente da Casa do Estudante, Jair Onofre, fala sobre o assunto.
O cenário de aridez política atualmente existente no meio estudantil ainda é fruto de ações do governo da ditadura, que cerceou o interesse da juventude em participar das decisões que afetavam a Nação. Isso aconteceu principalmente com a extinção dos grêmios estudantis livres, que tinham autonomia e liberdade para atuar, sendo substituídos pelos centros cívicos, organismos sob a tutela da direção das escolas. A observação é do jornalista paulista Jair Onofre, titular do site Bahia na Política, que teve uma destacada atuação na política estudantil durante vários anos.
Paulista de São Bernardo do Campo, mas residente em Feira de Santana desde 1979, Jair Onofre sempre esteve envolvido com a política estudantil, por entender que ela é essencial para a formação de jovens líderes capacitados a consolidar-se na política partidária. Embora ainda não estivesse em Feira na época, ele destaca nomes como Celso Pereira, Celso Daltro, Antônio Carlos Coelho e Hosanaah Leite (falecido), entre outros, que surgiram no movimento político estudantil relacionado aos grêmios livres na década de 1960.
Ele ressalta que, no governo de Francisco Pinto (1963/1964), líderes estudantis atuavam nos gabinetes, o que contribuiu diretamente para o surgimento de novos políticos. Com o governo militar, houve forte pressão, de modo que até os nomes dos grêmios foram modificados conforme os interesses dos governantes. Com uma forte militância na política estudantil e enfrentando obstáculos aparentemente intransponíveis, em 1981 Jair Onofre foi eleito presidente da Casa do Estudante de Feira de Santana (CEFS), a entidade maior da categoria no município, e logo experimentou a dureza da pressão do governo central.
As carteiras estudantis (cédula de identificação do estudante) tinham grande valor na época, proporcionando acesso a transporte coletivo, cinema, teatro, estádio de futebol, festas nos colégios e outros eventos, mediante o pagamento de meia-entrada. No entanto, a cédula estudantil de 1982, com as imagens de duas mãos algemadas e a frase “liberdade embora tardia”, oriunda da bandeira de Minas Gerais, foi proibida pelo governo estadual com restrições superiores.
Jair Onofre lembra que enfrentou dificuldades até mesmo para se apresentar ao governo estadual e dialogar. Por sorte, com a saída de Eraldo Tinoco da Secretaria de Educação, Kleber Pacheco assumiu a pasta, o que tornou possível o diálogo. A Casa do Estudante havia mandado imprimir cerca de 50 mil carteiras para estudantes das redes estadual, municipal e particular e teria um prejuízo enorme com essa decisão. Contudo, Kleber Pacheco, de forma maleável, propôs pagar a despesa da entidade e ainda fornecer 30 mil carteiras para os estudantes da rede estadual em Feira de Santana, com a condição de que a cédula da CEFS não fosse utilizada.
“Além disso, ainda reivindiquei e consegui 50 jogos de camisa de futebol, distribuídos nos colégios, todo o material necessário para a CEFS (móveis de escritório) e 200 mil folhas de papel de ofício, num custo total estimado em um milhão e meio de cruzeiros novos (valor da época). O governo censurou a cédula de identidade estudantil alegando que era subversiva. Eles (os censores) viram, não sei onde, a foice e o martelo, símbolos do comunismo. Mas as carteiras da CEFS foram mantidas para os estudantes das redes municipal e particular. Tive apoio absoluto do prefeito Colbert Martins da Silva”, ressalta Jair Onofre, acrescentando que a entidade manteve um jornal durante quatro anos e promoveu atividades esportivas e sociais, mobilizando a categoria.
O líder do site Bahia na Política faz um retrospecto do movimento estudantil e não esconde o desencanto. Hoje, a categoria não demonstra interesse pelo que ocorre no meio político e, por isso, não surgem novos candidatos a cargos eletivos. Ele lembra que a última agremiação (centro cívico) surgida foi em 1981, no Centro Interescolar Áureo de Oliveira Filho (Escola Técnica), no bairro Santa Monica, por ele mesmo criada.
Dos políticos surgidos no meio estudantil, o vereador José Carneiro Rocha é o único atualmente em atividade. Mas o esvaziamento que vem ocorrendo na política estudantil, em grande parte, é culpa do governo, garante Onofre: “A oposição sempre fez o combate e as denúncias, ia para as ruas, protestava, mas não se preparou para ser governo. Agora é a direita que está indo para as ruas!”, conclui.
Por Zadir Marques Porto
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