Entrevista

Especialista em Direito do Trabalho tira dúvidas sobre a reforma trabalhista

A nova legislação altera regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e prevê pontos que poderão ser negociados entre empregadores e empregados e, em caso de acordo coletivo, passarão a ter força de lei.

Laiane Cruz

O presidente Michel Temer sancionou na última quinta-feira (13) a proposta da reforma trabalhista, aprovada pelo Congresso Nacional. A nova legislação altera regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e prevê pontos que poderão ser negociados entre empregadores e empregados e, em caso de acordo coletivo, passarão a ter força de lei. As novas regras entrarão em vigor em quatro meses, conforme previsto na nova legislação. Para falar sobre o assunto, o Acorda Cidade entrevistou o advogado especialista em Direito do Trabalho e professor Arivaldo Marques.

Acorda Cidade – Quais são as principais mudanças?

Arivaldo Marques – É importante ressaltar que a lei ainda não está em vigor. Após a sanção do presidente Michel Temer, só passará a valer daqui a 120 dias. Foram diversas as alterações realizadas pela reforma trabalhista. Foram mais de 100 pontos na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) que foram alterados. E o foco desta reforma trabalhista está na possibilidade de uma livre negociação entre empregador e empregado, e muito do que hoje se dependia do sindicato para que fosse alterado ou pactuado, com a reforma, trabalhador e empresa poderão pactuar sem a necessária intervenção do sindicato. Esse é um dos pontos principais.

Acorda Cidade – No geral, a reforma trabalhista é mais benéfica ou prejudicial ao trabalhador?

Arivaldo Marques – Eu diria que os mais prejudicados com a reforma, sem dúvida, são os sindicatos, que vão ter um prejuízo financeiro, porque a partir da reforma não se faz mais obrigatória a contribuição sindical, correspondente a um dia de trabalho de todo empregado. Mas, em alguns pontos essa reforma desfavorece, sem sombra de dúvida, o trabalhador e em alguns outros pontos ela traz questões interessantes, que trazem certa liberdade, a exemplo do fracionamento das férias superior a dois períodos. Na CLT atual diz que apenas em dois períodos e em casos excepcionais se poderia fracionar as férias. Com a reforma, poderá ser em três períodos, desde que um deles seja de no mínimo 15 dias.

Acorda Cidade – Quais os principais pontos positivos e negativos desta reforma?

Arivaldo Marques – Não quero aqui dizer que a reforma não retirou direitos do trabalhador, a exemplo das horas de deslocamento entre a casa e o trabalho, quando a empresa se situa em um local distante, não servido por transporte público regular. Antes da reforma, esse deslocamento era considerado tempo trabalhado, agora deixou de ser. Outra situação é que algumas decisões consideraram que o simples fato de um empresário ser sócio de duas empresas já caracterizaria uma ligação suficiente entre essas empresas para que o que empregado pudesse responsabilizar qualquer uma das duas, e a reforma veio alterar isso.

Outro ponto em destaque foi a quantificação do dano moral. Quando uma pessoa sofre um acidente, a família ingressa com uma ação de dano moral e o valor ficava ao arbítrio do juiz. A reforma diz que a partir de agora serão tabeladas essas condenações e estabeleceu um teto de aproximadamente R$ 46 mil. Além disso, a livre negociação estabelecida entre trabalhador e empresa abarca, por exemplo, a questão do banco de horas, que antes para ser estabelecido, deveria ter a presença do sindicato e agora não. O trabalhador presta a hora extra e ao invés de receber em dinheiro, essa hora é depositada como se fosse um banco e ao final de um determinado tempo pode ter esse tempo a mais de férias ou dias não trabalhados. A reforma também permitiu estabelecer a jornada 12 por 36, onde os trabalhadores irão trabalhar por 12 horas seguidas e terem 36 horas de descanso. Uma alteração importante também é que todo empregado com mais de um ano precisava no momento da sua rescisão ir até o sindicato homologar essa rescisão. Agora essa homologação é feita diretamente na empresa.

Acorda Cidade – E lá na frente, esse trabalhador pode reivindicar algo na Justiça?

Arivaldo Marques – Poderá se ele comprovar que houve algum tipo de coação do empregador para que fosse assinado algum tipo de documento, ele poderá ingressar na Justiça do Trabalho.

Dentro de todo esse panorama das alterações concedidas, eu acredito em si que nós não vamos ter aquele impacto na economia em virtude da reforma trabalhista. Acredito que em curto espaço de tempo a reforma não será capaz de gerar esse fôlego da economia. Volto a dizer que alguns pontos são interessantes, e outros são perigosos, porque a depender de como forem utilizados podem causar um grande prejuízo ao trabalhador. O perigo está justamente na liberdade de negociação, porque o empregador negociar com o empregado estando o empregado subordinado é óbvio que a tendência é que a empresa tente tirar proveito dessa situação, e o empregado por depender economicamente dessa situação, acabar aceitando. Talvez um ponto que passou muito despercebido é que a CLT estabeleceu que todo empregado que receber acima de R$ 11,6 mil, se tiver nível superior, pode negociar diretamente com o empregador. O que a CLT presumiu é que o fato de você receber um alto salário e ter nível superior faz com que você esteja em pé de igualdade com o empregador. Isso no meu entender é um ponto de crítica, uma inverdade, pois por maior que seja o seu salário, você depende dele e se o seu empregador impor algo, você vai acabar aceitando em virtude da dependência. Aos outros empregados nem todas as negociações poderão ser feitas, como por exemplo, participação nos lucros e resultados, que ainda tem que ser feito mediante negociação com o sindicato. Algumas intervenções ainda dependem do sindicato.

Acorda Cidade – Em relação à terceirização, muda alguma coisa?

Arivaldo Marques – Já vem desde março uma lei autorizando a terceirização, mas a partir do momento que a reforma entrar em vigência os empresários não poderão demitir todos os seus funcionários e entrar em procedimento de terceirização. Estabeleceu-se um prazo limite de 18 meses para que o mesmo empregado que foi demitido vir a ser contratado de forma terceirizada.

Acorda Cidade – Como ficam as cooperativas?

Arivaldo Marques – Cooperativa não é empregadora. Ela não firma uma relação de emprego com o cooperado. Se existir algum tipo de fraude nessa relação, ou seja, se for uma cooperativa de fachada, poderá ter o vínculo reconhecido.

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