Laiane Cruz
Atualizada às 22:15
Muitas pessoas vivem em guerra com a balança e é muito comum que após um breve período de emagrecimento, o peso corporal delas venha a aumentar novamente, também em um curto espaço de tempo, gerando desse modo o chamado 'efeito sanfona'. Esse comportamento pode trazer riscos à saúde do coração e desencadear outras doenças no organismo.
Em entrevista ao Programa Acorda Cidade, o médico cardiologista Germano Lefundes, que atua na clínica IDM Cardio em Feira de Santana, falou sobre os prejuízos desse efeito sanfona para o corpo humano e acerca da importância de se adotar hábitos de vida saudáveis.
Acorda Cidade – O que é o efeito sanfona?
Germano Lefundes – O efeito sanfona está relacionado com a perda de peso seguida de um ganho. Isso pode acontecer num período muito curto e geralmente é reflexo de uma dieta não tão adequada e com uma falta da adoção de hábitos para manutenção da perda de peso. Não existe uma definição muito clara. O que a gente diz é que a perda de peso com uma variação de 5% seguido de um ganho depois da interrupção da dieta já caracteriza esse efeito sanfona.
Acorda Cidade – Esse efeito sanfona é prejudicial à saúde do coração?
Germano Lefundes – A obesidade, por si só, já é um problema. Ela está associada ao surgimento de diversas doenças que trazem risco de doenças cardíacas. Por exemplo, a obesidade traz risco de hipertensão arterial, de diabetes, de doenças relacionadas a outros órgãos, como a apneia do sono, aumenta o risco de doenças metabólicas, infarto, AVC. É uma doença complexa, que tem relação com o metabolismo do indivíduo, com fatores genéticos. O efeito sanfona amplifica o problema que a obesidade traz, porque quando se perde e ganha peso, isso pode estabilizar determinados processos do metabolismo e ampliar o risco de outras doenças. Mais importante do que estar focado no efeito sanfona, precisamos abordar as dificuldades relacionadas à própria obesidade.
Acorda Cidade – Quais fatores levam uma pessoa à obesidade?
Germano Lefundes – Existe um preconceito muito grande na sociedade contra o obeso, por achar que é um indivíduo preguiçoso, que come muito, que não gosta de fazer atividade física. Isso é uma inverdade. A obesidade precisa ser encarada como uma doença. A pessoa pode ter uma tendência a ganhar peso por questões metabólicas, genéticas e pode ter algum fator que contribui para essa exacerbação no ganho de peso. Lógico que a gente tem um gasto energético basal com nossas atividades básicas, como respirar, quando a gente executa alguma atividade de trabalho, com atividade física, a gente aumenta esse gasto. E o ganho de peso vai acontecer quando há um desbalanço entre o que a gente está gastando e o que a gente está ingerindo. O tecido adiposo é ativo, produz hormônios e está o tempo todo interagindo com outros órgãos. É exatamente essa relação que vai aumentar o gasto e a gente precisa corrigir essas distorções. A obesidade precisa ser entendida como uma condição clínica, uma doença a ser tratada, a ser acompanhada pelo médico, pelo nutricionista, pelo educador físico, pra que a gente possa ter uma perda de peso adequada, sustentada, e fugir do efeito sanfona.
Acorda Cidade – A obesidade também tem relação com fatores hereditários?
Germano Lefundes – Tem uma forte relação. Uma boa parte dos estudos sugere que 70% dos casos de obesidade estão relacionados a fatores genéticos. Se você tem familiares obesos, tem uma tendência a desenvolver obesidade. O componente genético tem um fator importante, mas também entram fatores ambientais. A sociedade tem uma relação muito forte com a alimentação e todos os eventos comemorativos tem uma comida farta. No dia a dia, se buscar nos momentos de lazer comer muito e geralmente são alimentos muito calóricos. Então esses hábitos vão intensificar esse papel da genética. O sedentarismo, que também tem sido crescente em nossa sociedade, acaba também contribuindo bastante, porque eu acabo reduzindo meu gasto energético quando fico mais sedentário. A nossa sociedade moderna tem evoluído e intensificado esse problema, porque nos deslocamos mais com veículos, andamos menos, trabalhamos parados no escritório, poucas pessoas fazem uma atividade que exige esforço físico, e comemos mais do que precisamos, e o que sobra vai ser armazenado como gordura.
Acorda Cidade – De que forma podemos buscar o emagrecimento saudável?
Germano Lefundes – É preciso mudar o entendimento sobre a obesidade e nossa forma de encarar. Eu não posso recorrer a dietas passageiras, dietas da moda, que vão gerar uma perda intensa num curto período de tempo e não mudar mais nada. Vou recair no efeito sanfona, que é aquele vai e vem e isso não é desejável. Precisamos perder peso e manter esse peso menor. Alguns estudos sugerem que é necessário de 7 a 10 anos para seu corpo se acostumar com o status do peso, porque quando se perde peso o organismo entende que você está passando por privação alimentar e uma série de mecanismos são desencadeados para poder preservar energia. O nosso corpo é extremamente inteligente. Se ele emagrecer fica preocupado com o futuro e não sabe que você tem uma geladeira farta, que se tem acesso fácil a uma prateleira de supermercado. Então é importante acompanhar esse processo, porque lá na frente pode ficar mais fácil pra manter esse novo peso corporal.
Acorda Cidade – Com a pandemia, cresceu o número de pessoas obesas no Brasil?
Germano Lefundes – A pandemia aumentou sim a quantidade de pessoas obesas porque houve uma redução das atividades físicas. Muitas pessoas que eram ativas deixaram de frequentar academias, de procurar espaços públicos para praticar caminhadas. Outro motivo foi a maior ingestão de alimentos, pois com mais tempo em casa, houve maior consumo. Um ponto também importante foi que a pandemia aumentou o estresse. O medo da covid, o medo de adoecer e morrer, o sofrimento pela perda de algum parente ou amigo, fez com que muitas pessoas ficassem estressadas, mexendo muito com nosso metabolismo e nossa relação com a comida. Muitas pessoas têm uma compulsão alimentar e quando estão ansiosos, estressados, procuram na comida uma forma de aliviar esse sofrimento.
Acorda Cidade – O hipotireoidismo pode contribuir com a obesidade?
Germano Lefundes – A tireoide é uma glândula que produz hormônios relacionados ao metabolismo, e eles acabam acelerando o metabolismo. Quando em quantidade excessiva, se tem o hipertireoidismo e o indivíduo acaba perdendo peso. Por outro lado, a redução da produção de hormônios pela tireóide aumenta a tendência ao ganho de peso, mas é muito comum um paciente questionar se não tem um problema na tireóide e quando a gente faz a avaliação, os hormônios estão normais. Para o paciente que tem hipotireoidismo será um componente a mais, mas na maioria das vezes o paciente ganha peso por conta do aumento do consumo de calorias e a diminuição do gasto energético.
Acorda Cidade – Qual a porcentagem da população obesa no Brasil?
Germano Lefundes – Dados do Datasus [Departamento de informática do Sistema Único de Saúde do Brasil] dizem que mais de 50% dos brasileiros estão com sobrepeso. De obesidade o percentual é menor, mas o sobrepeso é o início desse processo. E o próprio sobrepeso já está relacionado ao aumento do risco de doenças cardiovasculares. Então é preciso que as pessoas tenham consciência que precisam mudar seus hábitos. Quando a gente fala para o paciente que ele precisa perder peso, ele às vezes faz cara feia, de sofrimento, acha que vai ser um processo árduo, e ele precisa mudar o entendimento e entender que ele precisa melhorar hábitos, muitas vezes melhorar um pouco a questão das suas atividades, que nem sempre precisa ser uma atividade física formal, pode passar a fazer atividades recreativas, como jardinagem por exemplo, como varrer a casa, já começa a iniciar esse processo de gasto energético. Da mesma forma, precisa mudar a relação com a alimentação. O nosso cérebro é fantástico para fazer associações, um exemplo clássico é a associação do cigarro com o cafezinho, então pra o sujeito parar de fumar definitivamente, tem que abolir o café, senão vai dar vontade. Então com a alimentação na nossa sociedade é muito comum criarmos associações. É muito comum a pessoa ficar parada e sentir vontade de comer, assistir TV e dar vontade de comer, porque ao longo dos anos, desde a infância o hábito de ficar parado estava associado ao consumo de alimentos. Momentos festivos, de alegria, estão muito relacionados com o consumo de alimentos muito calóricos. Todas as festas tem muita comida, muita bebida. Então as pessoas precisam mudar a relação com a alimentação.
Acorda Cidade – Porque a atividade física é tão importante?
Germano Lefundes – Eu sempre falo para o paciente que se ele quiser continuar saudável, reduzir o risco de adoecimento, precisa adotar duas coisas. Uma delas é a atividade física e a outra é uma alimentação saudável. Progressivamente a sociedade tem se tornado mais sedentária, tem consumido mais alimentos, mesmo de qualidade ruim. Se tem uma possibilidade maior de adquirir produtos para comer, mas de baixo valor nutricional. Eles oferecem calorias, mas são pobres em nutrientes. Quando se pratica atividade física reduz o risco de adoecimento de uma maneira geral, reduz peso, risco de diabetes, hipertensão, de doenças do cerebrovascular, artrose, degeneração das articulações. A pessoa pode separar um tempinho do seu dia para praticar uma atividade física, 30 a 50 minutos três vezes por semana, é o mínimo para a pessoa sair do sedentarismo. Isso é independente da perda de peso. Esse benefício vai ser colhido só pelo fato de mudar o hábito. Exercício não pode ser encarado como sofrimento, e sim como algo prazeroso. Existem diversas modalidades e as pessoas precisam se encontrar em uma delas. É preciso colocar a atividade física como algo prioritário da vida.
Acorda Cidade – O IDM Cardio é especialista em cardiologia, mas tem outras especialidades também?
Germano Lefundes – Sim, o IDM Cardio é uma clínica que já tem 11 anos em Feira de Santana e nosso foco são as doenças cardiovasculares, mas nós agregamos outras especialidades, como endocrinologia, angiologia, cirurgia vascular, nefrologia, nutrição. Essas áreas todas dividem pacientes com a cardiologia. Até porque o tratamento mais eficaz para um paciente deve ser o multidisciplinar. Você tem um resultado melhor quando tem esse acompanhamento.