Ney Silva e Orisa Gomes
A frase “a primeira vez com um negão não dói”, pronunciada pelo promotor Ariomar José Figueiredo da Silva ao cumprimentar a defensora pública Fernanda Morais e pedir para ela ficar calma, durante júri no Fórum Desembargador Filinto Bastos, na última quinta-feira (4), continua gerando reações. Em reunião ocorrida na manhã desta terça-feira (9), na sede da Defensoria Pública, Fernanda recebeu solidariedade e apoio de dirigentes de entidades que atuam em defesa da mulher em Feira de Santana e ressaltou que quer retratação coletiva por parte do Ministério Público (MP).
Fernanda disse estar bastante feliz com o apoio de toda a rede em defesa da mulher de Feira de Santana e que tinha certeza que as mulheres podem contar umas com as outras. “Eu deixei claro desde o começo que não queria criar uma situação de desconforto institucional entre Ministério Público e Defensoria Pública, porque entendo que esse é um problema que acomete todas as instituições. Recebo o apoio da rede em defesa dos direitos da mulher feliz porque conseguimos pautar o debate e vamos dar continuidade aos mesmos debates e pensar estratégias de enfrentamento de uma maneira mais adequada”, ressaltou.
A defensora afirmou ainda que se sentiu constrangida e não admite ser tratada com machismo. Embora o promotor tenha se retratado ainda na sessão do júri, ela afirmou que ele voltou a ter condutas machistas posteriormente e ela acredita que o fato merece uma retratação coletiva por parte do MP. “O Ministério Público precisa se manifestar de maneira coletiva. Entendo inclusive que a nota (divulgada pelo MP) não satisfaz, porque a própria instituição do Ministério Público ao longo da história tem se mostrado combativa a defesa e aos direitos das mulheres, afirmou Fernanda Morais.
Na opinião da presidente do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos das Mulheres, Josailma Ferreira, é o tipo de afirmação que não deve mais ser feita. “Mais uma vez estamos aqui juntas para nos fortalecer, compreendendo que muitas vezes as frases que habitualmente se falava, hoje já não devem ser mais ditas. As vezes na naturalização de frases extremamente machistas nos ofende. As vezes nosso corpo é tido como algo que não é nosso, e sim de propriedade alheia e é preciso ter muito cuidado com o que a gente fala”, afirmou.
Sônia Lima, representante do Núcleo de Estudo das Mulheres e Relações de Gêneros, diz que a frase pronunciada pelo promotor Ariomar mostra que não depende de escolaridade, nem de nível social, cargos, se está na escola ou não está, mas que as mulheres podem sofrer violência em qualquer lugar onde estejam atuando. Ela considerou muito mais grave o episódio por envolver pessoas operadoras da lei. “Nesse caso não é só uma ofensa, mas tornar público o corpo da mulher. É achar que qualquer pessoa em qualquer situação pode mexer ou falar o que quiser”, ressaltou.
A professora Nelsiane Silva, chefe do Núcleo de Gestão da Pró reitoria de Políticas Afirmativas e Assuntos Estudantis da Universidade Federal da Bahia afirmou que o episódio entre o promotor e a defensora a deixou assustada por ter ocorrido dentro de uma instituição pública, mas ficou feliz pela união da rede de proteção e defesa das mulheres e com a coragem da defensora Fernanda Morais em expor a situação.
Na opinião de Ana Rita Costa, presidente do Coletivo de Mulheres, a frase do promotor é uma apologia ao estupro. Ela acha que a atitude do promotor pode ter sido uma estratégia machista para desestabilizar a defensora por ser mulher e diz que esse caso extrapola todos os limites. “A gente defende que haja uma retratação do Ministério Público da Bahia diante de todas as mulheres da Bahia e do Brasil”, frisou.
Já a coordenadora da Defensoria Pública de Feira de Santana, Liliane do Amaral, informou que buscou o apoio dos grupos em defesa dos interesses da mulher e esse fato deu uma luz maior para que passa acoplar a essa situação muitas outras que são vivenciadas pela mulher no dia a dia e que possa ser objeto de uma audiência pública que será solicitada, para que a sociedade se una nesse propósito. “Creio que teremos dentro em breve uma sociedade consciente de que os direitos da mulher como de outros grupos devem ser respeitados”, afirmou, acrescentando que vai buscar um espaço junto à Câmara Municipal de Vereadores para realizar uma audiência pública e debater o assunto.