Contra a descriminalização das drogas no Brasil, a Marcha das Famílias pode ser retomada em breve pelos organizadores em Feira de Santana. A última edição do ato público ocorreu em 2019, no município.
O evento faz parte de um movimento nacional, que foi abraçado por voluntários feirenses, contra a possibilidade de mudanças na Lei Antidrogas (Lei 11.343/2006), que trata sobre o uso, venda e transporte de drogas ilícitas no país.
O voluntário social Luís Américo, que é um dos organizadores do evento em Feira de Santana, afirmou em entrevista ao Acorda Cidade, que a legalização da venda e uso de drogas no país pode trazer riscos sociais para as famílias.
Segundo ele, o atual ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, levantou novamente essa questão, durante uma entrevista à BBC, afirmando que é favorável à descriminalização das drogas no Brasil por acreditar que isso pode diminuir a pressão sobre o sistema carcerário.
“Diante da fala do atual ministro dos direitos humanos, em entrevista à BBC News Brasil, se falou da possibilidade de reaver uma Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) do artigo 28 da Lei 11.343/6, denominada Lei Antidrogas. O artigo 28 visa não permitir o transporte, a posse e o armazenamento de drogas. Com isso, voltando a Suprema Corte a julgar essa ação direta de inconstitucionalidade, nós estamos vendo a possibilidade de retomarmos ao conhecimento da sociedade civil de que há um possível risco às famílias brasileiras. Temos relatos de profissionais da área de psiquiatria, de neurologia, de que substâncias consideradas ilícitas hoje sendo consumidas de forma legal podem ser um risco à saúde humana”, pontuou.
Conforme Luiz Américo, hoje os números de CVLIs (Crimes Violentos Letais Intencionais) atingem mais, diante dos dados de segurança pública, a faixa etária de 14 a 29 anos.
“Então quando vamos observar o histórico dessas pessoas vítimas são pessoas que têm algum relacionamento com drogas, hoje ilícitas. Então a gente pensa aonde isso vai levar caso seja legalizado? É um assunto que precisa ser discutido, deve ser ouvido pela sociedade. Foi uma lei criada pelo Congresso, pelos parlamentares, então não vejo porque a Suprema Corte julgar inconstitucional, uma vez que a maioria dos congressistas aprovou.”
A dona de casa Gildete Pinho de Jesus tem um filho que faz tratamento contra a dependência de substâncias psicoativas. Segundo ela, o jovem entrou em contato com as drogas em festas e através de amigos.
“Ele começou indo para baladas, saindo com colegas, e depois eu comecei a desconfiar que ele estava usando, mas depois quando eu fui ver a realidade, já estava no vício mesmo. Ele começou com a maconha e foi até a cocaína e o crack, e no final a cachaça também. Hoje ele não usa droga nenhuma e mora comigo.”
Antes de aceitar passar pelo tratamento, o jovem chegou a expulsar os pais da própria casa.
“Antes ele morava comigo e o pai, mas tomou nossa casa, nos colocou para fora e fomos embora. Ficou na casa e acabou com o imóvel, que hoje é só terreno. Eu fui embora para Camaçari e quando retornei, vinha sempre dar assistência a ele, mas via que ele não queria fazer o tratamento, então abandonei um pouco e um dia ele se viu tão agoniado que ele pediu ajuda. Ele disse: ‘Minha mãe, estou numa situação de tristeza muito grande, uma solidão e não aguento mais’. Eu vim conversar com o médico e está fazendo tratamento. O levei para minha casa e tem 11 meses morando comigo em um condomínio, não sai sozinho, só comigo.”
Segundo a mãe, lidar com pessoas dependentes de substâncias psicoativas é muito difícil, sobretudo quando se é mãe.
“A gente tem que se apegar muito a Deus, porque a mãe que não tiver muita fé e não orar, não suporta. Eu comecei a ficar doente, ficar triste, chorava muito, mas pedi com muita fé, muita força a Deus, e no grupo de oração que eu participo das mães que oram pelos filhos, e elas me ajudaram muito em oração, e comecei me entregando mais a Deus e amei mais o meu filho”, complementou.
Na opinião da coordenadora do Caps AD, Mariana Rios, a discussão em torno das descriminalização das drogas é algo pertinente e que precisa ser discutido na sociedade.
“É uma discussão bastante pertinente na atualidade, e enquanto serviço de saúde portas abertas, com demanda espontânea ou referenciada, como somos aqui no Caps AD, nosso papel entra como cuidado a esse usuário de substâncias psicoativas. Sabemos que hoje dentro das drogas ilícitas existe uma ilegalidade voltada para esse consumo, essa comercialização, e também temos as drogas lícitas, que existe o uso também pela sociedade. Independente do que aconteça no Congresso, a nível de parlamentar ou de mudanças, nosso papel vai ser sempre cuidar desse usuário que procura o serviço devido ao uso de substância, seja ela lícita ou ilícita”, ponderou.
Ela avalia que existem muitas discussões diferentes sobre esse tema e não se pode prever o que irá acontecer, caso essa descriminalização aconteça.
“Na verdade, dentro de um cunho, enquanto enfermeira de formação e já atuando também há muito tempo na área de álcool e drogas, a questão da legalização da venda e comercialização, talvez, e aí existem discussões diferentes, a gente tenha até menos problemas, quem sabe, por ser um uso permitido. São discussões e pontos de vistas que a gente precisa viver e não ter uma ansiedade ou pressupor o que irá acontecer. Nós temos hoje aqui no caps AD a procura maior por drogas lícitas, como o álcool, do que por drogas ilícitas. A gente tem hoje uma maior procura por homens da faixa etária de 29 a 49 anos por uso abusivo do álcool, que como sabemos, devido à nossa experiência, é a primeira droga de escolha do próprio adolescente ou em fase adulta, e no caso das mulheres a gente tem o uso do cigarro”, afirmou.
Conforme Mariana Rios, na última pesquisa de epidemiologia do Instituto Brasileiro do Fígado, existiu em maior índice o aumento do uso do álcool entre os adolescentes do que das drogas ilícitas.
“Então são discussões também pertinentes e atuais, onde nós devemos ter um olhar diferenciado, porque quando esse sujeito usa o álcool, ou por curiosidade ou por uma questão de aceitação de grupo, pois às vezes é tímido e precisa ficar mais extrovertido, ocorre muitas vezes como uso recreativo, quando isso dá certo, ele repete o uso da substância e o que hoje eu enxergo como profissional, como mãe e mulher, inserida nesta sociedade, é que precisa existir uma sensibilização por parte da própria sociedade e das famílias, momentos de discussões e de conhecimento sobre o que leva o adolescente ou sujeito ao uso de substâncias psicoativas, que tem muito mais relação com fuga, fraturas emocionais ou comportamentais.”
Atualmente, mais de 10 mil pessoas estão cadastradas no Caps AD, porém nem todos estão ativos no tratamento.
“Nós temos aqui o paciente que é cadastrado, que procura o serviço, e tem aquele que é ativo, que realmente vem para os atendimentos, seja ele psicoterápico com psicólogos, seja com atendimento médico, seja com atividades de grupo terapêutico e oficinas. Temos hoje mais de 10 mil pacientes cadastrados no Caps AD, onde tivemos também um aumento considerável do acolhimento, principalmente por conta do período de pandemia, que a gente percebe que houve um sofrimento emocional, o isolamento, o não se relacionar em ambientes mais abertos e tivemos que ficar mais em casa, então existiu sim o sofrimento, uma tristeza, e enquanto sujeito a gente procura uma fuga para extrapolar esse sentimento e vem o uso da substância psicoativa seja lícita ou ilícita.”
Com informações do repórter Ney Silva do Acorda Cidade.
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