Laiane Cruz
Não está fácil para ninguém. Com o novo reajuste de 7,2% no preço do GLP, o chamado gás de cozinha, para os distribuidores, é preciso muito malabarismo para fazer o produto, que é essencial no dia a dia do brasileiro, durar mais. Sofrem as famílias, mas também os empresários do ramo de alimentação.
Dono de um restaurante no bairro Caseb, José Francisco da Cruz está fazendo o que pode para conseguir manter o estabelecimento e continuar prestando um bom serviço à clientela. Com os sucessivos aumentos do preço do gás de cozinha, ele resolveu investir mais no churrasco, aumentando o uso da churrasqueira, a fim de economizar nos gastos com o botijão.
Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade
“Aqui utilizo o gás com muita frequência e com esses aumentos desenfreados, está ficando difícil continuar a trabalhar no ramo. Utilizo cerca de quatro botijões por mês, tenho restaurante que trabalha com churrasco e também comida de caldo. Servimos feijão tropeiro e de caldo, arroz, macarrão, saladas, verduras cozidas. E ultimamente estamos pagando 89 reais no gás, porque somos credenciados como restaurante”, afirmou o empresário, em entrevista ao Acorda Cidade.
De acordo com José Francisco, com tantos reajustes dificulta o trabalho e os lucros diminuem. “Se repassar para o cliente, ele foge à procura de um almoço mais barato. Então é preferível a gente segurar e aumentar o uso da churrasqueira, que é com carvão, do que utilizar o botijão, mas ainda assim a gente usa porque tem que fazer os pratos cozidos. A gente compra o gás mais barato porque a gente cadastra o comércio e fica cerca de 10 reais a menos. Por isso que a gente ainda está segurando para não repassar para o cliente”, justificou.
Mesmo apertando daqui e dali, o dono do restaurante precisou demitir alguns funcionários. “Os preços do gás e da gasolina estão desenfreados. Só falam em aumento, não falam em baixar. Uma pessoa só não pode reclamar, o governo está complicado. E a gente não pode repassar para o cliente, porque existe a concorrência. Eu sou proprietário do prédio, é nosso, e por isso estamos segurando. Mas está difícil. Eu demiti duas cozinheiras, uma atendente e dois ajudantes de cozinha, porque não estava dando para pagar a diária de 30 reais por dia”, lamentou.
Há mais de 20 anos atuando no ramo de restaurante, José Dantas, mais conhecido como Zé do Cupim, possui um estabelecimento no bairro São João. Para ele, também não está sendo fácil controlar os gastos e, como todo empreendedor, precisou reformular a maneira de trabalhar, para conseguir se manter no mercado.
“A gente trabalha hoje porque não tem jeito. Eu tenho um pequeno restaurante e trabalho em média com cinco botijões por mês, num gasto médio de R$ 480 a R$ 500 só de gás. Isso aí é claro que vai interferir no nosso lucro, porque antes eu gastava em média R$ 250 a R$ 300. Isso vai me fazer falta para pagar uma conta de água, de luz, um funcionário, tudo é custo, pois além do botijão, também tem a carne, que aumentou. E a gente não pode repassar, porque senão o cliente foge, e aí a gente tem que fazer um jogo de cintura e saber trabalhar”, relatou.
Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade
Bastante conhecido na região onde trabalha, Zé do Cupim conta com a fidelidade dos amigos e mesmo assim precisa fazer concessões e trabalhar com descontos para não deixar o cliente sair insatisfeito.
“Eu, como sou macaco velho, já tenho mais de 20 anos no ramo em Feira de Santana, estou dando pra levar. Tenho muitos clientes amigos, e quando o cliente não pode pagar um prato de 25 a gente oferece um de 20 e por aí vai. Agora, o gás é o que está maltratando a gente.”
Para o comerciante, não é só o preço do gás que está trazendo dor de cabeça, o aumento excessivo do preço da carne também prejudica o trabalho.
“Eu parei com o churrasco, porque com o preço da carne, se você assar e vender ganha alguma coisa, mas o que deixa de vender é prejuízo. Carne hoje você não pode perder mais, nem uma isca mais para pescar pode ser feita hoje com carne, tem que usar a minhoca mesmo. Eu vendo aqui o cupim de panela, carneiro ensopado, feijoada, carne do sol, porco de panela galinha de quintal e durante a semana vou fazendo o rodízio disso aí, o prato feito e o comercial. E sempre tem uma negociação, sem comer o cliente não sai, aqui o cliente tem que sair satisfeito.”
Com o lucro comprometido, Zé do Cupim espera uma mudança na política nacional, porque se para o empresário está difícil levar, imagine para o trabalhador que é assalariado.
“O lucro é pouco e dá só pra sobreviver, pra gente não ficar parado. O aumento do gás está sendo toda semana, enquanto estiver atrelado ao dólar, mas espero que mude a política do governo para melhorar e a gente trabalhar, porque não é só quem tem restaurante, os pais de família assalariados gastam praticamente 10% do salário mínimo”, avaliou.
Novos aumentos
Proprietário de uma revendedora de botijões de gás, o comerciante Paulo Ricardo Braga Rosa acredita que novos reajustes devem acontecer daqui por diante. Ele afirmou que os empresários do ramo já esperavam o aumento, mas o cenário não está dos melhores.
“Certamente, se não tiver nenhuma medida excepcional do governo, da Agência Nacional de Petróleo (ANP), os órgãos reguladores, o cenário se desenha para novos aumentos. Antes do último aumento, o preço do botijão custava R$ 88, com preço à vista para retirar na loja. Hoje, à vista, está custando R$ 90. Nós só repassamos parte do aumento que tivemos, outra parte a gente está absorvendo pra tentar ajudar de alguma forma os consumidores, que infelizmente arcam com os custos totais”, afirmou Paulo Ricardo.
Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade
Para facilitar um pouco mais para os consumidores e não espantar as vendas, ele destacou que no cartão de débito, o preço do produto permanece com o valor de à vista e no crédito ele aumenta apenas R$ 3.
“Nosso foco aqui é o consumidor final e esse preço a gente aperta ao máximo. Precisamos ter o nosso retorno, mas nossa expectativa é conseguir reduzir nossas despesas pra repassar o mínimo possível para o consumidor final. Esse mercado é muito agressivo, muito concorrido, e para sobreviver, temos que fazer ginástica.”
Já o preço do botijão completo está custando entre R$ 270 a R$ 280, porém estão em falta no mercado os vasilhames. Para Paulo Ricardo, o momento atual é de dificuldades para todos os brasileiros.
“Eu sinto que o Brasil está passando um momento muito complicado, e o gás é apenas uma variante de uma cesta enorme de produtos de primeira necessidade que estão muito caros. Se você computar energia, alimentos, o gás é só mais um componente. Infelizmente, tudo está muito caro e tem muita gente passando necessidade. Sempre que há um aumento no início de um novo preço, a gente sente o impacto, pois as vendas normalmente caem. E à medida que o tempo vai passando, como as pessoas precisam consumir, vão se acostumando mais com o preço. Mas sempre que há uma majoração do preço, há uma retração no mercado”, relatou.
O empresário Mário Luis, proprietário de uma distribuidora, informou que antes do aumento estava comercializando o botijão a R$ 86 para quem ia buscar no depósito, e com o reajuste o preço subiu para R$ 90.
“No caso da entrega em casa, continua o mesmo valor, a gente não aumentou. Em pontos de vendas, a depender da quantidade que a pessoa pega, oscila muito o valor. A gente joga com a nossa margem mínima. Nós repassamos 4 reais sobre o preço geral, de atacado e varejo. Vamos repassar para o consumidor final que vai buscar. Não vamos repassar nada pra quem receber em casa, porque já estava com um preço alto. E vamos repassar R$ 4 para pontos de revenda”, argumentou.
Com relação ao gás completo, ele acredita que o aumento foi absurdo do botijão vazio, e por isso, muitos distribuidores estão evitando comercializar o vasilhame.
“Esse aumento chegou num patamar que a gente está comprando hoje o vasilhame vazio nas distribuidoras com o preço que antes a gente vendia, ou seja, se você vender um botijão, você não consegue repor teu estoque. Então a gente está preferindo não vender o botijão vazio, porque se eu cobrar 200 reais num botijão, o pessoal vai achar que a gente está majorando o preço. Como teve essa crise do petróleo, do gás e do aço também, que deu uma bagunçada total no mercado, a gente está preferindo não vender, mas temos certeza também que isso não vai perdurar.”
O empresário ressaltou que está buscando trabalhar com as margens mínimas de lucro, e que o ICMS no percentual de 50% é retido na fonte.
“A gente está tentando ao máximo não repassar, a gente está jogando com as margens mínimas, que é o que o governo tem nos permitido. Não podemos esquecer que 50% desse valor a gente paga de ICMS, que é retido na fonte. A culpa do preço do gás estar desse jeito não é do estado ou do governo, mas que eles podem dar uma cota de contribuição para melhorar esse processo, com certeza poderiam. A gente não está repassando uma série de valores e estamos restringindo cada vez mais a nossa margem. Eles podiam estar fazendo a mesma coisa. O governo federal zerou o imposto federal e tem nos ajudado com o pagamento de salários, que no nosso caso pesa muito também. O governo estadual até agora não fez nada, e está ignorando que eles estão recebendo 50%. Poderíamos estar vendendo um gás a 60 reais e todo mundo feliz, ganhando a sua parte”, reclamou.
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade.