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Aos 76 anos, feirense mestre de artes marciais sonha em alcançar graduação máxima do Karatê no Brasil

Para alcançar o 9º Dan, como ele espera, são necessários 10 anos na ativa, dando aulas, ministrando cursos e participando das competições com os atletas.

Laiane Cruz

Quem ainda não alcançou a terceira idade, sonha em chegar neste período da vida, claro, com muita saúde, uma vida financeira sem tantas preocupações, ao lado da família e dos amigos queridos e, quem sabe, poder viajar e aproveitar o quanto for possível, enquanto ainda há tempo, não é mesmo?

Além de tudo isso, o mestre em Karatê, (Shorin-ryu) Judô e Jiu-Jitsu Renato Pereira, de 76 anos, morador de Feira de Santana, acrescentou mais um item à sua lista: alcançar o 9º Dan em karatê, graduação máxima do esporte atualmente, no Brasil. Missão impossível? Veremos que não. Voltando um pouco no tempo, vamos relembrar a história desse mestre lutador.

“Nasci em Feira, no distrito Governador João Durval (Ipuaçu). Com 8 ou 9 anos fui para São Paulo. Mas antes disso, fui engraxate, carregador, lavador de carro, olhava bicicletas na frente do Cine Santanópolis e já existia essa academia aqui. Eu vinha para cá, ficava olhando as pessoas treinarem, eu sempre fui fanático por esportes. Fui para o Rio de Janeiro num caminhão, e o rapaz que me levou me deixou na Baixada Fluminense. Lá me incentivaram a usar drogas e entrar para o mundo do crime, então eu fui embora para São Paulo. De carona também, e o motorista me deixou no Bras, que antigamente era um perigo, muita prostituição, tráfico de drogas, crimes. Foi quando o juizado de menores me pegou e me levou para o serviço social de menores e lá eu comecei a estudar e trabalhar”, recordou o mestre em entrevista ao Acorda Cidade..

Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

Passado um período, o juizado resolveu mandar Renato de volta para Feira de Santana. Porém, chegando aqui, ele não se deu por vencido e voltou para São Paulo, mas voltou novamente para o juizado.

“Mas eu disse que não adiantava me mandar de volta, pois não queria ficar em Feira. Então eu comecei lá no juizado a estudar, trabalhar, treinar e me especializar no Judô. Onde eu treinava, tinha um grande apoio do meu mestre. E lá também tinha Jiu-Jitsu e Karatê, e eu comecei a treinar tudo, pois sempre fui fanático por esportes. Depois fui morar em Santos e comecei a treinar com um mestre, que era o grau máximo do Brasil”, relatou.

O mestre com o qual Renato Pereira treinava foi Yoshihide Shinzato, o primeiro karateca a atingir o 10º Dan nas Américas e morreu em 2008. Uma forte inspiração na trajetória deste atleta feirense, que cada vez mais buscou se especializar para alcançar aquilo com que sempre sonhou, mesmo sem nenhum recurso, desde a infância.

“Consegui a faixa preta em São Paulo e quando eu vim para a Bahia, eu já era faixa preta de Jiu-Jitsu e Karatê 2º Dan, já era faixa preta de Judô 1º Dan. Mas, como aqui era difícil se graduar, eu ia para São Paulo. Depois aqui começaram a subir as graduações e eu passei a fazer os exames aqui até chegar ao 8º Dan, que é um dos graus mais cobiçados do Brasil. No país, tem poucos que são 8º Dan, e no Brasil não tem 10º Dan, só tem até o nono, que eu estou batalhando para chegar”, destacou.

Segundo o mestre, de uma graduação para outra o tempo é muito longo. Para alcançar o 9º Dan, como ele espera, são necessários 10 anos na ativa, dando aulas, ministrando cursos e participando das competições com os atletas.

Eu sou 8º Dan no Karatê, 6º no Judô e 8º no Jiu-Jitsu. Uso hoje uma faixa vermelha e branca, que só é usada no Jiu-Jitsu pelo 8º e 9º Dan. No Karatê, você pode usar a faixa vermelha e branca do 6º Dan até o 8º. Quando pega o 9º Dan, então passa a usar a faixa vermelha pura, tanto no Karatê quanto no Judô. De mestre mesmo eu devo ter uns 20 anos. Porque muita gente que pensa que quando você pega a faixa preta já é um mestre. Mas não, ali tem vários critérios, como instrutor, monitor, professor. Até o 3º Dan, você é professor. Do quarto Dan acima ainda não é mestre, pois mestre legítimo só de 6º Dan acima”, explicou Renato em entrevista ao Acorda Cidade..

Com 60 anos de treinos e 76 anos, Renato Pereira sente que ainda pode conquistar o seu merecido título. Nesta trajetória, ele foi considerado um dos melhores do Brasil em vale-tudo, que atualmente se conhece por MMA.

“Enfrentei os melhores lutadores do Brasil na época, a exemplo de Euclides Pereira, Ivan Gomes, Valdemar Santana, Hilário, Marreta, Demônio do Ringue, Demônio Cubano. E o Rei Zulu, que já me pegou velho, pois eu tinha mais de 20 anos que não lutava, eu treinei mais ou menos um mês para enfrentá-lo, e mesmo assim ganhei no quarto ou quinto assalto por nocaute. Já participei de várias competições de Judô, Jiu Jitsu, Karatê, fui campeão paulista de Boxe, tive várias lutas no Brasil inteiro de Vale-tudo, que hoje se chama MMA. Minha história foi dentro do esporte”, revive o lutador.

Pandemia

Mas, em 2019, a pandemia teve início e desde então ameaça os planos do atleta. A academia, que antes vivia lotada, viu os alunos sumirem de uma só vez. Mesmo com a retomada das atividades esportivas, no final de 2021, em Feira de Santana, as atividades não retornaram da mesma forma que antes, em meio às dúvidas e incertezas sobre os rumos de uma crise, que insiste em não findar.

“Aqui essa academia é minha vida, eu comecei aqui com 18 ou 19 anos. Hoje estou com 76, criei meus filhos aqui. Infelizmente, com essa pandemia, acabou. Aqui tinha cinco ou seis aulas por dia, hoje mal tem uma. Aqui cada aula tinha 50 atletas. Hoje só tem uma aula por dia, que é à noite. Mas vamos ver se a partir desse ano melhora. Eu tinha mais de 100 alunos crianças, adolescentes e adultos. Hoje estou dando aula para cinco ou seis atletas. Nunca esperava passar por uma situação dessa.”

Mesmo enfrentando tantas dificuldades, mestre Renato não cede à pressão. Se mantém firme no propósito. Para ele, a prática das artes marciais faz toda a diferença neste momento.

“Se eu fosse um cara fraco já tinha ficado doido, mas como pratico as artes marciais, isso dá um controle emocional. Senão, já tinha perdido a cabeça, porque a despesa não para de chegar. Quando esse salário foi diminuindo, o padrão de vida caiu muito, a família até hoje não entende essa situação. Mas continuo dando aula, de Judô, Jiu-jitsu, Karatê e tenho meu filho Junior, que é faixa preta 2º Dan, que me ajuda. Nunca vi uma situação dessa no país. Em 2020, diziam que em 2021 iria melhorar e não melhorou. E em 2022, com cada dia uma variante, a gente não sabe como fazer. Já tomei as três doses e mesmo assim está arriscado pegar o vírus. O meu maior projeto na vida foi o Karatê e o Judô. E aqui nessa academia já passaram mais de 10 mil atletas, entre eles médicos, políticos.”

Com alguns problemas no joelho, Renato Pereira insiste que não vai desistir de chegar ao 9º Dan do Karatê. “O segredo para chegar a essa idade com vigor é treinar e boa alimentação. Tenho 76 anos com força de um menino de 24, não me troco por nenhum deles. Estou aqui dando entrevistas não gaguejo, lembro de tudo, minha mente está boa. Hoje só tenho um problema nos joelhos por causa das lutas. Mas, espero viver mais 20 anos para pegar o 9º Dan.”

A academia do mestre Renato Pereira, a Associação Atlética Feirense, está localizada na Rua Intendente Rui, número 186 – Centro (ao lado da Câmara Municipal).

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Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade

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