Os mais velhos, que acompanham o futebol amador e profissional de Feira de Santana, desde a década de 80, lembram bem dele. Hoje sexagenário, Zeca Novais, ex-jogador do Bahia de Feira, continua a desfilar a sua técnica nos campos da cidade. O meio-campista é o caçula do grupo de quatro irmãos, todos “boleiros”. Os mais velhos são Benedito o Bené; Tonho Novais e Carlos Alberto, o Alemão, este, falecido. Sua carreira profissional foi curta, pouco menos de uma década. Atuou em um time só, o Tremendão, pelo qual disputou um campeonato estadual da Série A e outros vários pela divisão de acesso.
Filho de Seu Dudu, ferrenho torcedor do Fluminense de Feira, Zeca conta que começou a jogar futebol aos 10 anos de idade, na comunidade conhecida como “Corre Nu”, no bairro Capuchinhos. Na memória, embates contra equipes juvenis do Fluminense de Feira, comandadas por Arcênio, “lendário” treinador das divisões de base do Touro do Sertão. Por volta dos 15, 16 anos, ingressou no Bahia de Feira.
A idade era de atleta júnior, mas ele já disputava, mesmo tão jovem, pelos profissionais, a segunda divisão estadual. Interrompeu por um período sua trajetória no Bahia de Feira para tentar uma vida melhor em São Paulo, onde foi trabalhar como metalúrgico, em 1985. Lá já se encontrava um dos irmãos dele, também jogador de futebol, Carlos Alberto. Alemão, como era mais conhecido, foi bi-campeão do Intermunicipal pela Seleção Feirense e, a exemplo do caçula da família, também jogou pelo Bahia de Feira.
Em São Paulo, foi observado em jogos que atuava pelo time da empresa. Convidado, chegou a fazer teste no no Itapetininga, da Série A-2 do Paulistão. Ao comunicar à empresa onde trabalhava que precisaria se ausentar por 10 dias, para uma avaliação, não foi liberado. Então, surgiu proposta da diretoria do Bahia de Feira, para que retornasse ao clube, que iria disputar a primeira divisão do Estadual de 1987. Seria a primeira e única vez dele na Série A do Baianão, experiência que também marcaria sua despedida de jogador profissional, aos 28 anos de idade.
Daquele momento, ele destaca duas recordações. A lembrança boa foi ter enfrentado o Bahia da capital com o seu timaço que, em 88, viria a sagrar-se campeão brasileiro. “Foi muito bom jogar contra aquela equipe cheia de craques, como Bobô, Zanata, Charles, Zé Carlos e tantos outros”. A ruim, o rebaixamento do time feirense naquele ano, devido a “uma participação muito confusa, com troca de vários técnicos durante a competição”. Ele avalia que sua incursão no futebol profissional não atingiu resultados maiores devido a alguns fatores, sendo um deles a ausência de uma boa divisão de base, logo no início.
Em uma breve análise do que mudou no futebol do seu tempo, final dos anos 70 até a década de 80, para os dias atuais, Zeca diz que, antigamente, surgiam “muitos craques”, inclusive nos times considerados pequenos, mas pouca oportunidade de jogar em equipes grandes, inclusive na dupla Ba-Vi. Jogador de visão, estilo Gerson campeão do Mundial de 70, tendo como características os lançamentos de longa distância, passe sempre preciso, chute certeiro, forte e colocado, ele avalia que, no passado, havia muita técnica: “hoje não se vê tanto. Agora é mais força e correria. Essa é a diferença”.
Se a carreira profissional foi encerrada precocemente, a trajetória de Zeca Novais no amadorismo, pelo contrário, é duradoura, sendo um dos mais longevos e, também, dos que ainda exibem muito talento. Logo no ano seguinte após deixar o Bahia de Feira, em definitivo, foi convidado para trabalhar na Brahma e, naquela empresa, reencontrou-se de imediato com o futebol. O patrão Carlinhos Souza gostava de contratar funcionários que já tivessem sido jogadores profissionais, ou amadores de alto quilate. Comandava um time da cervejaria que disputava os principais campeonatos de futebol soçaite local, especialmente nos clubes sociais Tênis e Cajueiro. Foram cinco anos ali, onde foi campeão várias vezes.
Ainda no futebol amador feirense, Zeca não esquece sua passagem pelo Ajax, da Santa Mônica, pelo Zebra, dos Capuchinhos e Cruzeiro, deste mesmo bairro, onde comemorou título em 1998, competindo no antigamente muito prestigiado Campeonato do Jomafa. Com 38 anos de idade, foi escolhido o melhor do certame. Pela cidade de Rui Barbosa, disputou e venceu a Copa da Laranja, aos 35 anos de idade. Também participou do Campeonato Intermunicipal. A chegada aos 40 anos mudou o perfil das competições que Zeca Novais disputava. Passou a jogar em campeonatos de veteranos, quando migrou da “ponta de lança” (como antigamente se chamava o jogador que atuava com a camisa 8) para a meia esquerda (o tradicional 10, armador) e também nessa categoria foi muito bem sucedido, levantando várias vezes a taça.
Aos 63 anos, “mas com espírito de 45, pelo que faço e corro”, ele diz, Zeca Novais ainda é uma sensação na Associação Sítio Vitória, no distrito da Matinha. Recentemente, foi vice-campeão e dividiu a artilharia do tradicional torneio de fim de ano realizado naquele espaço, que frequenta há vários anos. Na competição de cinco times, finalizada em dezembro, Zeca enfrentou jogadores muito mais jovens, alguns, 40 anos menos que ele.
O ex-jogador do Bahia de Feira teve uma alegria à parte, neste certame, pois jogou no mesmo time do filho, Felipe “Boniek”. Muito feliz por ter tido esta oportunidade, ele não lamenta a perda do título. “Gosto de ganhar, mas dessa vez, não deu e está tudo bem. Não posso reclamar, depois de ter sido tão contemplado por Deus”.
Ex-jogador, mas ainda assíduo frequentador do Sítio Vitória, o bancário José Carlos Pereira do Carmo, o Zé Carlos, diz que conheceu Zeca ali, como colega de baba, mas já ouvia falar dele muito antes, sua qualidade em campo: “Desfila no meio de jovens o seu talento, toque refinado, dribles surpreendentes e muita vontade de vencer. Fico imaginando o que era capaz de fazer na juventude”. Para este funcionário da Caixa Econômica Federal, que foi um bom lateral direito, Novais é, sem dúvida, “um exemplo, por jogar com amor e prazer”.
Proprietário do Sítio Vitória e dirigente da associação, o comerciante Rivaldo Machado, um dos donos da Kairoz Delicatessen, conhece Zeca Novais antes mesmo de se encontrarem em sua bem cuidada “arena”, um dos melhores gramados de Feira de Santana. Ambos frequentavam o “Pereirão”, um outro espaço de futebolistas amadores, já extinto, no bairro Sim. “É referência para nós todos. Líder, incentivador, fora o alto nível do seu jogo, apesar da idade. Todo mundo respeita, tem prazer e orgulho de atuar com ele”. Segundo o ferrenho torcedor do Vitória, bom centro-avante, que também vai de lateral às vezes, seja no baba de sábado ou no campeonato de fim de ano, “o homem joga pra pirão”, criando, fazendo gol e defendendo. “É uma honra ter por lá este grande jogador”, arremata.
Por Valdomiro Silva
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