Neste mês da Consciência Negra, Feira de Santana celebra a rica herança cultural do samba de roda, uma das mais importantes expressões artísticas da comunidade negra baiana. Na Praça do Tropeiro, a reportagem do Acorda Cidade testemunhou o pulsar de uma roda de samba que reúne sorrisos, histórias e orgulho.
Entre o som contagiante das palmas e a batida dos pés, foram encontrados personagens que, com suas vivências, mantêm essa tradição viva e vibrante em um dos locais mais populares da cidade.
A Praça do Tropeiro é o palco dessa festa de cores, sons e histórias. O samba de roda, ali, é mais do que dança e música. É a própria alma da cultura afro-brasileira. E neste mês da Consciência Negra, o samba de roda em Feira de Santana não apenas celebra uma herança ancestral, mas afirma a força e a beleza da identidade negra. É um convite a todos para entrarem na roda, dançarem, celebrarem e se emocionarem com essa cultura que nunca para de se reinventar.
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Josué: A tradição que corre nas veias
Josué Patente Alta, uma das figuras de destaque do samba, compartilhou sua ligação com a dança, que vem desde a infância.
“Meu amor pelo samba vem de muitos anos, desde criança. Sempre gostei de sambar, sempre dancei nos concursos de dança. Inclusive, eu, bem criança, já ganhei concurso com minha mãe, minha grande inspiração. Hoje ela já não samba mais, devido à sua religião e tal, e eu dei continuidade a esse processo do samba na minha vida, esse DNA no sangue. É algo inexplicável que não dá para se contar.”
O samba na Praça do Tropeiro é organizado por Josué, que mora na Mangabeira, mas é filho da Rua Nova. Desde que ele começou a divulgar nas redes sociais, a festa tem chamado a atenção de muita gente apaixonada pelo gênero.
“Tem tido grande repercussão através das nossas redes sociais, do nosso samba. Pense em algo que, quando eu me aproximei, me ajuntei, foi aquela junção maravilhosa entre minha pessoa e o samba com os componentes daqui também, como Massinha, que tem me dado bastante força nessa trajetória do samba. Mestre Paraná, Luiz Sanfoneiro, Luiz dos oito baixos e outras pessoas maravilhosas. Então isso aqui é sem explicação.”
Para quem está lendo a reportagem, pode até sentir um pouco do quanto esse samba é bom, mas apenas presenciando e valorizando essa manifestação cultural é que se pode vivenciar essa cultura de verdade. Josué já sabia da roda há algum tempo, mas foi ao pisar nela que a identificação bateu mais forte.
Aberto ao público, “aqui, o cantinho sempre cabe mais um. Cada vez que chego aqui, me identifico mais. Agora, faço parte da roda de samba, junto com tantos que carregam essa mesma paixão.”
Josué ainda destaca a importância da história local. Ele lembra que o samba da Praça do Tropeiro tem raízes profundas, originando-se no Centro de Abastecimento e sendo transferido para o local atual. A roda é gratuita e acontece todas as segundas-feiras.
Marcinha Sambadeira: alegria, resistência e irreverência
Marcinha, conhecida como Marcinha Sambadeira, é outro nome forte nessa roda. Da Rua Nova, ela traz toda a sua alegria, reverência e, claro, muito samba no pé para aproveitar a cada segunda. Sua mãe foi uma das precursoras do samba de roda no centro.
“Esse amor pelo samba já vem de muito tempo, acho que era em 1992. Era nessa época, são muitos anos. Na verdade, não era aqui, era lá no antigo Pau da Miséria. Só que aí veio o bispo do cavaquinho, depois disso abandonou, ficou Bié da Sanfona lá. Aí vieram para cá, terminou Bié falecendo, aí ficou com Luís dos oito baixos. E o samba me traz muita energia boa, muito positiva”, explicou.
Ao Acorda Cidade, ela contou que o apelido “Marcinha Sambadeira” é porque ela gosta de ousar bonitinho, miudinho, como manda a tradição. “E é isso que me traz a alegria. Me traz o amor, o samba de roda da cultura popular”, acrescentou.
Na oportunidade, ela também aproveitou para fazer um apelo em nome da comunidade sambadeira: “Precisa ter uma cobertura para os tocadores. A gente samba numa barraca e não tem um local adequado. Aquela barraquinha é muito apertada, traz a alegria, traz a energia boa, mas tipo assim, ali está perdido. O necessário é que cubra, faça cobertura pros tocadores tocar, pra que traga o povo do nordeste, de onde for. Tem gente que vem do Rio de Janeiro, São Paulo, de todos os lugares, de outros países. Já vieram várias pessoas de outros países pra me assistir”.
Ela ainda acrescentou sobre a importância de se valorizar essa cultura tão marcante da cidade, que é o samba de roda, nascido no Recôncavo Baiano e espalhado para o mundo.
“É uma cultura boa. Tem gente ali de fora, dizendo ‘Márcia, eu vim de fora, ó como é que eu estou, toda arrepiada por te ver’. Me traz uma energia boa. Isso me traz uma força poderosa pelo samba. E o samba é cultura, gente. Vamos respeitar esse samba de roda”, declarou.
Mestre Paraná: A preservação e o legado da cultura popular
Mestre Paraná também reforçou a importância de preservar esse espaço e essa tradição, destacando o objetivo de fazer essa festa.
“O objetivo é esse, é trazer o povo para cá, para que possa conhecer a nossa verdadeira cultura. Então a gente está preservando também aqui um espaço, e futuramente queremos ver aqui revitalizado. Esse é o nosso desejo. Já conversei com o prefeito José Ronaldo de Carvalho, eleito, e ele nos garantiu que, após a posse, vamos retomar essa revitalização da Praça do Tropeiro.”
Mestre Paraná também afirmou que o samba já é famoso. Só na segunda-feira passada, teve visitantes da Chapada Diamantina, Santo Antônio de Jesus e Simões Filho. Além da importância cultural, o samba de roda atrai o desenvolvimento econômico para as feiras da região.
Patrimônio do povo afro-brasileiro
O samba de roda, gênero musical e de dança, de origem afro-brasileira, surgiu no Recôncavo Baiano no século XIX, fruto da fusão entre tradições africanas de Angola e Congo, influenciadas por culturais locais e europeias. Desenvolvido entre trabalhadores rurais e pescadores, o samba de roda era praticado em festas religiosas e comunidades quilombolas, usando instrumentos como atabaque, pandeiro, cuíca e berimbau.
O coração do samba de roda está na roda, onde os participantes dançam, cantam e tocam ao ritmo das palmas, com o característico movimento de umbigada, gesto de origem africana que simboliza comunhão e fertilidade. Esse estilo é um precursor do samba urbano do Rio de Janeiro, marcante na música popular brasileira.
Em reconhecimento à sua importância histórica, o samba de roda foi declarado Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco em 2005.
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade
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