Culinária

Dia do Cuscuz: entenda por que prato é tão amado e tão popular no Nordeste

Alimento é versátil ao ponto de servir de café da manhã, almoço e jantar, em versões doce e salgada, recheada ou simples.

Prato de cuscuz — Foto Reprodução_TV Globo
Foto: Reprodução/ TV Globo

Este domingo (19) é o Dia do Cuscuz, prato reconhecido como patrimônio imaterial da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Não que seja necessário um dia especial para comer cuscuz, já que esse alimento, especialmente no Nordeste brasileiro, é amado e versátil ao ponto de servir de café da manhã, almoço e jantar, em versões doce e salgada, recheada ou simples.

O cuscuz, da forma como é consumida no Nordeste, é feito a partir do fubá de milho, que é uma espécie de farinha com flocos finos e que absorvem mais água. A massa é cozida no vapor de água e comida tanto como acompanhamento quanto como prato principal, junto a manteiga, ovo, queijo legumes, frango ou peixe, por exemplo.

Entretanto, apesar de ser tão característico da região, o cuscuz não nasceu no Nordeste. Esta reportagem fala sobre a origem do prato e do apreço nordestino pelo alimento, conta histórias de empreendedores que usam o amor pelo cuscuz como motivação e, por fim, ensina receitas do prato.

De acordo com o antropólogo da alimentação Bruno Albertim, se sabe que o cuscuz, feito com sorgo, arroz e com sêmola de trigo, como o conhecido cuscuz marroquino, era prato comum na alimentação de povos mouros, oriundos do norte do continente africano.

“Do Egito ao Marrocos, na África setentrional e muçulmana, o cuscuz já era tido como prato nacional, sendo comido de situações corriqueiras a ocasiões especiais, com comidas de caldo. É um prato que absorve caldos muito bem, e por isso a gente vê tanto o cuscuz sendo comido com galinha ou carne guisadas”, explicou.

Bruno Albertim lembrou, ainda, que entre 711 e 1492, a Península Ibérica, onde fica Portugal, foi dominada pelos povos mouros, o que fez com que os colonizadores tivessem o cuscuz como parte de sua alimentação. Mas é no Brasil que ele começa a ser feito com milho, que tem origem americana.

O cuscuz, portanto, é resultado direto das chamadas “trocas atlânticas”, por meio das quais, por exemplo, chega ao Brasil a cana-de-açúcar, originária da Índia, que foi base da economia pernambucana desde o século 16.

“O milho promove uma revolução nos hábitos alimentares dos europeus, na época das chamadas ‘trocas atlânticas’. Se eles trazem o cuscuz, daqui eles levam a polenta, que é parecida com nosso angu, e faz parte da cultura italiana. Os portugueses, por outro lado, têm contato com o tomate, a batata e o milho”, disse o antropólogo.

Devido à abundância dos ingredientes, o cuscuz, no Nordeste brasileiro, logo se tornou integrante basilar da alimentação, algo equivalente ao pão francês.

Não por acaso, em 2002, as farinhas de trigo e de milho foram escolhidas para serem fortificadas com ferro e ácido fólico, por determinação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio da portaria 344/2002.

O enriquecimento dessas farinhas foi uma política pública adotada para combater a anemia por deficiência de ferro e má formação de fetos por falta de ácido fólico. Nesse segundo caso, por exemplo, houve redução de 30% na prevalência de doenças do tubo neural em bebês, segundo dados do Ministério da Saúde.

“Essas farinhas viraram algo como um aliado, por ser algo que está tão institucionalizado no cotidiano da população. Minha mãe, por exemplo, estava indo para a maternidade quando eu ia nascer e, por ser o primeiro filho, ficou desesperada. Não sabia quanto tempo ia ficar no hospital, nem se ia poder comer. Ela disse à minha avó que só ia para o hospital depois de comer cuscuz”, contou.

Cuscuz na pele

No estúdio da tatuadora Clara Virgolino, o regionalismo é o carro-chefe. Ela também é ilustradora e os desenhos dela, com situações do cotidiano pernambucano, são famosos. Mas entre as sombrinhas de frevo, caranguejos, Homens da Meia-Noite e bandeiras de Pernambuco, um elemento presente em quase todas as casas do estado também entrou para o portfólio: a cuscuzeira.

“Começou com o pedido de uma moça, que amava tanto cuscuz que quis tatuar uma cuscuzeirinha na pele. Acho que esse amor, de tatuar cuscuz na pele, vem porque nós, pernambucanos, somos muito regionalistas, e o cuscuz é comida que mais marca nossa cultura, que é muito vasta. Dá para fazer com todo tipo de proteína e tem muitas possibilidades”, afirmou.

Quem se tatua com Clara ganha um pequeno adesivo de presente, com ilustrações feitas por ela. Uma das opções é de um cuscuz com olhos, sorriso e um coração. É, sem dúvidas, um dos mais escolhidos pelos clientes.

“São vários adesivos, a maioria com desenhos regionais. Mas o do cuscuz é um dos que mais sai. Eu sou suspeita para falar, porque amo esse prato. Como até cuscuz puro”, disse.

Apaixonados por cuscuz

O jornalista da TV Globo Tiago Medeiros é amante incondicional de cuscuz, e diz que troca qualquer comida, por mais sofisticada que seja, por esse prato. Tanto que já apresentou o Globo Esporte vestindo camisas com estampas em homenagem ao cuscuz.

“Eu troco qualquer comida, sem brincadeira, por um cuscuzinho. Eu não confio em quem não gosta de cuscuz. Meu sogro, inclusive, veio do Rio Grande do Sul para o Recife para trabalhar e diz que só conseguiu sobreviver a Pernambuco por causa do cuscuz, que ele comia de manhã, tarde e noite”, declarou o jornalista.

O uso do cuscuz como adereço, inclusive, virou febre na loja de camisas de Tarcísio Gomes, a Estilo Bregoso. A marca, criada por ele há aproximadamente seis anos, comercializa camisetas com estampas que remetem à cultura pernambucana, à música brega e, como não poderia deixar de ser, ao cuscuz, que é um dos temas mais procurados pelos clientes.

No catálogo, são três estampas diferentes criadas em homenagem ao alimento. Algumas nasceram por demanda do público, a partir de postagens nas redes sociais. A mais popular, segundo o comerciante, é a que diz “cuscuz é melhor que muita gente”. Outra diz “até cuscuz precisa descansar pra ficar fofinho, imagina eu” e a terceira, “que todo o ódio do mundo vire cuscuz”.

“Se você for perguntar as palavras que representam a gente, de Pernambuco, com certeza o cuscuz é uma delas. É um alimento popular, que quase todo mundo curte, e por isso que tem tantos memes sobre quem não gosta de cuscuz. Essas camisas buscam representar nossa identidade, nosso orgulho de ser nordestino. E o cuscuz é parte disso”, afirmou.

Nem mesmo no carnaval o pessoal deixou de reverenciar o prato. Nas ruas, a combinação cuscuz com ovo, uma das formas mais tradicionais de comer a iguaria em Pernambuco, virou fantasia.

Aprenda a fazer cuscuz

A receita do cuscuz tradicional é bastante simples, um dos motivos pelos quais o alimento tão fortemente faz parte do cotidiano. Confira, abaixo, o passo a passo;

Ingredientes

2 xícaras de chá de flocão;
1 xícara de chá de água;
Uma colher de chá de sal, ou a gosto.

Modo de preparo

Misture bem os ingredientes e deixe descansar por dez minutos;
Coloque água até metade da parte inferior da cuscuzeira;
Coloque a massa na parte superior e tampe;
Leve ao fogo por dez minutos;
Desligue o fogo e deixe descansar por dez minutos;
Sirva e se delicie.

A chef Carol Medeiros, que é professora e consultora de gastronomia, recomenda que, ao colocar a massa na panela, tente não pressioná-la, para que o cuscuz fique mais fofinho e molhado.

Há dois tipos de cuscuzeira: a tradicional e a conhecida como “peitinho”. Essa segunda, ela sugere que seja untada com manteiga, para facilitar a retirada do prato. É possível, também, fazer cuscuz recheado.

“No cuscuz recheado, você precisa pôr parte da massa e, no meio, o recheio de sua escolha. Depois, cobre com o restante da massa, criando camadas. A melhor opção é usar o que você tem na geladeira. Pode ser um frango acebolado, ou bacon, para quem gosta. Tomate e queijo também podem ser combinados. Para pessoas veganas, uma compota de berinjela e tomates refogados com alho e azeite também é uma boa opção”, explicou a chef.

Fonte: G1

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