Nesta segunda-feira (9), é comemorado o Dia da Criança Especial e é essencial lembrar que todas as crianças têm direitos assegurados pela legislação, incluindo aquelas com deficiência.
Garantir a inclusão, o respeito e a proteção dessas crianças é fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. O advogado Gil Fernandes, que é um pai atípico, professor e especialista em direito dos autistas, conversou com o Acorda Cidade sobre os principais desafios enfrentados pelas famílias e a importância da garantia dos direitos.
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Segundo o advogado, hoje no Brasil existem diversas leis para pessoas com deficiência, mas o grande problema é que elas não são cumpridas.
“O que eu sinto é uma grande dificuldade do Brasil em fazer cumprir as leis que, inclusive, reconhecem quem são essas pessoas especiais, que são geralmente pessoas que têm algum problema genético, pessoas que nascem com algum transtorno. Tratando-se do autismo, por exemplo, não é caracterizado como uma doença, mas apenas um transtorno do neurodesenvolvimento”.
O advogado explicou que, para se conseguir ter acesso aos direitos, essas pessoas precisam ser diagnosticadas, ou seja, é necessário ter um médico qualificado, competente naquela área, que assine um relatório com o diagnóstico dizendo que essa pessoa tem determinado transtorno, tem determinada condição genética e se equipara a uma pessoa com deficiência. Gil Fernandes destacou que as deficiências podem ser físicas, onde visualmente é possível constatar, além dos transtornos e condições que não são passíveis de serem enxergadas.
“Por exemplo, o espectro autista não é visível, você não vai ver uma pessoa que tenha características físicas de autismo, TDAH. Essas pessoas precisam ser avaliadas clinicamente, submetidas a profissionais terapêuticos que, oferecendo uma ajuda multidisciplinar para o neuropediatra, para o psiquiatra ou para o neurologista, constatarão que ela tem aquela condição”, afirmou.
Principais direitos garantidos
O advogado Gil Fernandes afirmou que existem direitos em duas categorias: os direitos previdenciários e os direitos sociais. Ele explicou quais são eles.
“Todas as pessoas que são portadoras de alguma deficiência ou todas as pessoas que têm algum transtorno, alguma condição e que se encaixam como deficientes a nível da legislação brasileira, têm direitos sociais. Como, por exemplo, a identificação, a redução de impostos na aquisição de veículos, por exemplo, a ter o seu direito à matrícula garantido, a ter um plano educacional individualizado que permita a educação, inclusive, dentro da sala de aula, a acesso prioritário em órgãos públicos e privados, a ter acesso à saúde”, detalhou.
Com relação ao campo previdenciário, ele disse que existe um filtro para acessar o direito. “Por exemplo, hoje você tem o LOAS para pessoas autistas, que é um benefício de assistência continuada. Quem tem direito a esse benefício são as pessoas mais carentes. A legislação estabelece que a família, o conjunto de pessoas que moram naquela casa, não podem superar individualmente um quarto de salário mínimo, ou seja, existe um teto”, explicou.
Apesar de todos esses direitos garantidos, o especialista lamentou que, na sua ampla maioria, esses direitos só são alcançados quando a justiça determina o cumprimento.
“Para mim, isso é motivo de crítica a todo o sistema. Nós não podemos, enquanto sociedade, ficar alheios a essas pessoas, dentro das suas limitações cognitivas, físicas, dentro das suas limitações dentro do autismo e dos diversos transtornos”, declarou.
Discriminação
Com relação à discriminação, que o advogado defende como uma pauta importante a ser enfrentada, ele também afirma que existem leis que garantem direitos às pessoas com deficiência e considera que a informação é a maior ferramenta para a inclusão. Segundo ele, a informação deve partir de dentro de casa, alcançando a escola e depois a sociedade.
“Eu não estou aqui falando só na condição de advogado. Eu estou falando também na condição de um pai de uma criança que está dentro do espectro, no nível 2 de suporte. E, hoje, eu posso dizer que quando a gente precisa de amparo, de entidades, de órgãos públicos constituídos na defesa dos interesses da pessoa com deficiência, interesses coletivos e difusos, eu não poderia deixar de aplaudir e mencionar o papel extremamente relevante do Ministério Público e da Defensoria Pública. São órgãos que sempre buscam trazer informações, principalmente para aquelas pessoas que não têm condições e suporte técnico”.
Apoio do poder público
O advogado Gil Fernandes destacou também o apoio que o poder público garante a essas pessoas. Ele afirmou que a Prefeitura de Feira de Santana, por exemplo, proporcionou avanços significativos, como o cartão de estacionamento, a garantia da matrícula escolar, o acesso à carteira de identidade da pessoa com deficiência ou da pessoa autista.
“Esses direitos são básicos, mas que fazem muita diferença. Até pouco tempo atrás, sem a identidade da pessoa com autismo, era necessário andar com o atestado médico, o laudo diagnóstico, todo o tempo. Agora não precisa mais”.
Ele informou também que o Estado da Bahia aderiu a uma nova legislação, onde a pessoa não precisa ter novos atestados para caracterizar um transtorno ou uma deficiência que é permanente. “Esses são alguns ganhos. Agora, se dentro desses ganhos, a pessoa passa por qualquer constrangimento, a título de discriminação, como por exemplo tentar matricular na escola pública ou privada, e disseram que não tem vaga, não aceite isso, procure o Ministério Público, a Defensoria Pública para fazer a denúncia”, frisou.
Direito à educação
Além do direito à matrícula escolar na rede pública ou privada, o advogado destacou que crianças autistas ou com deficiência têm direito a um atendente pedagógico especializado em educação inclusiva, para garantir que ela também tenha os mesmos ganhos dos outros colegas da sala de aula.
“Legalmente existe esse direito, inclusive, há duas semanas, foi emitido um parecer de número 50, do Conselho Nacional de Educação, que estabelece diretrizes regulamentadoras da Legislação de Diretriz e Base da Educação, onde fortaleceu a exigência e o direito ao PEI, que nada mais é que um plano educacional individualizado para as pessoas especiais, que estejam na escola pública ou privada. Essa educação se dá através de, primeiro, conhecer quem é o aluno, suas necessidades, habilidades e inabilidades. A partir disso, traçar um plano baseado naquilo que o aluno consegue evoluir e tentar estabelecer a partir disso um acesso a uma educação verdadeiramente inclusiva”, explicou.
Desafios
A falta de informação, para o especialista, é o maior desafio enfrentado pelas famílias de pessoas com deficiência ou transtornos. Ele destaca que quando fala de informação, não é só por parte das próprias famílias, mas também dos agentes públicos e privados para entender e respeitar esses direitos.
“Isso gera um grande conflito. A partir da desinformação ou da má informação é que surgem os atos de discriminação, as retaliações a quem busca os direitos e a falta de atenção de quem de direito deveria estabelecer a acessibilidade e a inclusão como pauta principal. Então a mensagem que eu passo é que as pessoas exerçam a empatia e o acolhimento”.
O advogado falou da importância de as pessoas fazerem a diferença na sociedade e destacou que a sociedade não é feita de um órgão ou de um governo, mas por pessoas.
“A mudança precisa vir na origem, precisa vir na base. No final das contas, quando chega no final do dia, são só seres humanos. Tem uma frase que eu gosto muito de Carl Jung, um psicanalista, que diz assim: ‘Conheça todos os métodos, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja tão somente uma outra alma humana’. Então é essa a frase que eu desejo para as pessoas, para serem mais empáticas e cuidar das pessoas com mais acolhimento e verdade”.
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade
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