Laiane Cruz
A independência da Bahia tem como data chave o dia 2 de julho de 1823, quando o Exército Libertador alcançou vitória sobre as tropas portuguesas, conforme narram historiadores. O conflito entre as tropas portuguesas e o Exército Libertador transcorreu entre junho de 1822 e julho de 1823.
Em entrevista ao Acorda Cidade, a historiadora Ana Maria Carvalho dos Santos, professora do Departamento de Ciências Humanas e Filosofia da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), o historiador Ubiratan Castro, já falecido, contou que a guerra na Bahia foi resultado do entendimento de que a separação do território de sua antiga Metrópole era algo irreversível, em virtude das conquistas sociais, políticas e econômicas que o Brasil havia conquistado durante os anos em que a Corte foi sediada no Rio de Janeiro.
Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade
Conforme Ana Maria Carvalho, a saída dos portugueses no dia 2 de julho de 1823 das águas da Baía de Todos os Santos foi a coroação dos enormes esforços de mulheres e homens, negros, brancos, índios e mestiços que deram suas vidas pela conquista da liberdade.
Entre as mulheres que participaram bravamente dessa luta estava Maria Quitéria de Jesus, nascida em julho de 1792, na freguesia de São José das Itapororocas, que a partir de 1983 se tornou o distrito de Maria Quitéria, em homenagem a ela, na zona rural de Feira de Santana.
Pois aquela jovem, filha de Gonçalo Alvares de Almeida e Quitéria Maria de Jesus, deixou a fazenda do pai, após ouvir notícias dos acontecimentos na Vila de Cachoeira, em junho de 1822.
“Com a roupa masculina, apresentou-se como soldado Medeiros no Batalhão dos Voluntários, chamado o Batalhão dos Periquitos, por causa da cor verde da farda. E por seus atos de bravura, o general conferiu a ela as honras de primeiro cadete. E ela participa do desfile das tropas brasileiras, em Salvador, em julho de 1823. No Largo da Soledade há uma estátua em sua homenagem. É interessante a gente fazer uma consideração porque Maria Quitéria vai receber a honraria de primeiro cadete, pois fez parte do Batalhão dos Periquitos, que tinha outros grupos negros, outros sujeitos, que não tiveram a mesma honraria”, relembrou a historiadora Ana Maria Carvalho dos Santos.
A verdadeira identidade do 'soldado Medeiros' não demorou a ser revelada. Ainda assim, Maria Quitéria permaneceu no campo de batalha, dada à sua facilidade com o manejo de armas e disciplina.
Segundo a pesquisadora, além de Maria Quitéria, outras mulheres contribuíram de forma importante para a luta pela independência, a exemplo de Maria Filipa, natural de Itaparica. Uma heroína negra, que comandou dezenas de mulheres, negros e índios, na queima de um conjunto de 42 embarcações brasileiras em 7 de janeiro de 1823.
Empoderamento feminino
Ana Maria Carvalho destaca após o término da guerra de independência e após ser condecorada com a Ordem do Cruzeiro do Sul, Maria Quitéria retorna para seu local de origem e casa-se com um lavrador. Lá tem uma filha e depois fica viúva. “Ela mudou-se para Salvador, onde faleceu em 21 de agosto de 1853. Infelizmente, morreu em completo anonimato, tendo seus restos morais sepultados na Igreja Matriz do Santíssimo Sacramento no bairro de Nazaré.”
Apesar disso, não se pode deixar de salientar que a jovem Maria Quitéria foi uma mulher à frente do seu tempo, desobediente e insurgente.
“Contraditório, porque ela acaba desobedecendo o patriarcado, como mulher dentro daquele período para encarar a luta, os conflitos na guerra de independência. Ela pode ser considerada uma mulher que incorreu numa atitude de desobediência ante aquilo que ela acreditava que seria importante”, frisou.
A Professora Maria Isabel de Jesus, Mestra em Agronomia e moradora da Comunidade Quilombola de Lagoa Grande, no Distrito de Maria Quitéria, celebra a história de luta, força e ousadia por parte da heroína.
Ela conta que vive em Maria Quitéria desde o período dos seus avós. “Eles vieram para cá após a abolição da escravatura, em 1888. Vale ressaltar que o nosso distrito, antes, era a maior população que existia. Antes São José das Itapororocas, hoje Distrito de Maria Quitéria. Éramos bem maiores do que Feira de Santana. Como existia um projeto de desenvolvimento para Feira, ficamos aqui, já que passavam-se os tropeiros.”
Para ela e os moradores do distrito, a heroína Maria Quitéria significa força, ousadia, guerra e conflito.
“É permanência, luta, é vitória, é mulher. Não podemos falar de Feira de Santana sem falar desse local, da mulher que foi Maria Quitéria. O sentimento de quem reside aqui é de um lugar maravilhoso, é um sentimento de luta que pôde crescer. É o sentimento do campo, do lugar que vivemos, da ancestralidade indígena e quilombola, que faz o distrito ser diferente. Nós amamos o distrito, e ainda, amamos a heroína Maria Quitéria”, ressaltou.
Com informações da produtora Maylla Nunes do Acorda Cidade.