Polícia

Gusttavo Lima é indiciado por lavagem de dinheiro e organização criminosa em investigação sobre jogos ilegais

Medida foi tomada na Operação Integration, que tem 53 alvos entre empresários, bicheiros e a influenciadora Deolane Bezerra.

Gusttavo Lima
Foto: Antonio Trivelin/g1

O cantor Gusttavo Lima foi indiciado por lavagem de dinheiro e organização criminosa. O Fantástico, programa da Rede Globo de Televisão teve acesso à investigação completa.

A medida foi adotada pela Polícia Civil de Pernambuco na Operação Integration, que tem ao todo 53 alvos em seis estados brasileiros. Entre eles, estão bicheiros, empresário e a influenciadora digital Deolane Bezerra, além do cantor.

O indiciamento aconteceu em 15 de setembro. Agora, cabe ao Ministério Público decidir se denuncia ou não Gusttavo Lima à Justiça.

A defesa do cantor nega irregularidades.

Dinheiro vivo e R$ 8 milhões em notas sequenciais

A polícia apreendeu R$ 150 mil na sede da Balada Eventos e Produções, empresa de shows de Gusttavo Lima em Goiânia (GO).

Dinheiro - Operação Integration
Foto: Reprodução

Também encontrou 18 notas fiscais sequenciais, emitidas no mesmo dia e em valores fracionados por outra empresa do cantor, a GSA Empreendimentos, para a PIX365 Soluções (Vai de Bet, de acordo com a polícia), também investigada no esquema.

São mais de R$ 8 milhões pelo uso de imagem e voz do cantor.

O dinheiro vivo apreendido e as notas fiscais são, segundo a polícia, dois indícios de lavagem de dinheiro.

O advogado criminalista Rodrigo Andrade Martini explica o que é esse crime. “A lavagem de dinheiro ocorre quando a pessoa, a partir de um crime, ela recebe dinheiro, bens, valores ilícitos. Essa pessoa necessariamente precisa inserir na sua contabilidade”, afirma.

O processo para dar aparência legal a dinheiro criminoso geralmente envolve “a compra, portanto, fictícia de bens móveis ou imóveis, a prestação de serviços de uma maneira maquiada ou a compra sequencial de imóveis e emissão de notas fictícias”, diz ele.

Martini diz que precisa ficar claro se Gusttavo Lima sabia ou não que o dinheiro usado em todas as transações investigadas era de origem criminosa.

“A pessoa que não tem conhecimento da estrutura de lavagem de dinheiro, ela não pode ser punida pelo crime”, diz Martini. “Tendo conhecimento, eles devem, sim, ser investigados e punidos com rigor da lei.”

Aeronave foi vendida 2 vezes para investigados

O cantor ainda é suspeito de uma negociação irregular de duas aeronaves para empresários ligados aos jogos ilegais.

Operação Integration
Foto: Reprodução

Novos detalhes da investigação revelam que uma delas, um avião da Balada Eventos, foi vendida duas vezes (em um ano) para investigados na operação.

A primeira venda aconteceu em 2023. Por US$ 6 milhões, o avião foi vendido para a Sports Entretenimento, que pertence a Darwin Henrique da Silva Filho, que, segundo a polícia, é de uma família de bicheiros do Recife.

O pernambucano ficou com o avião durante dois meses. Logo depois, se desfez da aeronave, alegando problemas técnicos.

A investigação mostra que o contrato e o distrato foram emitidos no mesmo dia, 25 de maio de 2023. E que o laudo — que apontou a falha mecânica — foi feito depois do cancelamento da compra, dia 29 de junho do mesmo ano.

Em fevereiro de 2024, aconteceu a segunda venda: a Balada Eventos, de Gusttavo Lima, vendeu esse mesmo avião — dessa vez, para a empresa J.M.J Participações, do empresário José André da Rocha Neto, que também é alvo da operação. A venda aconteceu, segundo a polícia, sem nenhum laudo que comprovasse o reparo no avião. A transação de R$ 33 milhões envolveu ainda um helicóptero que também era da empresa de Gusttavo Lima e já tinha sido comprado por outra empresa de André Rocha Neto.

Na negociação, o helicóptero voltou para o cantor. A investigação aponta que as empresas que compraram as aeronaves usaram tanto dinheiro legal quanto dinheiro ilegal, vindo do crime.

De acordo com o inquérito, o esquema funcionava assim:

  • O dinheiro do jogo do bicho, de jogos de azar e de bets legalizadas iam todos para um mesmo caixa
  • Lá, os valores lícitos eram misturados aos do crime
  • Para dar aparência legal e voltar ao mercado limpo, o dinheiro contaminado, segundo a polícia, foi usado na negociação das aeronaves.
  • “É uma forma de lavagem, transitar o dinheiro através de várias pessoas físicas ou jurídicas, buscando não facilitar o rastreamento deles”, diz Renato Rocha, delegado geral da Polícia de Pernambuco.

Investigada gastou R$ 2,4 milhões em dinheiro em 2 lojas de grife

José André da Rocha Neto – dono da empresa que comprou o avião de Gusttavo Lima pela 2ª vez – e a mulher dele, Aissla, são empresários da Paraíba e investigados na operação.

esquema
Foto: Reprodução

Os dois tem uma incompatibilidade entre o rendimento declarado à Receita Federal e a quantia que eles movimentaram nos últimos anos.

Conforme a polícia, em três anos, Aislla chegou a gastar R$ 2,4 milhões em dinheiro vivo — só em duas lojas de grife. Um dos acessórios que ela exibe nas redes sociais é uma minibolsa, que custou R$ 116 mil.

O casal José e Aissla tem muitas empresas — e três são investigadas por lavagem de dinheiro. Elas são:

J.M.J Participações, a mesma que comprou o avião da empresa do Gusttavo Lima
Supreme Marketing e Publicidade, que comprou o helicóptero do cantor
PIX365 Soluções, empresa que, segundo a polícia, é a Vai de Bet, e tem Gusttavo Lima como garoto-propaganda.

No dia da operação, investigados e cantor estavam na Grécia

No dia em que a operação foi deflagrada, no começo de setembro, o cantor foi intimado a depor. Rocha Neto e a mulher estavam com prisão decretada. Os bens e contas bancárias dos três, bloqueados.

Gusttavo Lima estava na Grécia gravando músicas novas e sucessos antigos. Ele tinha escolhido um iate luxuoso para comemorar com amigos seu aniversário de 35 anos. Rocha Neto e Aissla estavam lá.

Segundo a polícia, na ida para a Grécia, no começo de setembro, o casal Rocha Neto, dono da Vai de Bet — e com quem Gusttavo Lima disse não ter intimidade — pegou carona no avião do cantor. Já no retorno ao Brasil, Gusttavo chegou sem eles. A suspeita é de que o casal — então foragido — teria desembarcado antes, na Espanha.

Foi a suposta ajuda a foragidos que motivou a decretação da prisão de Gusttavo Lima, em 16 de setembro. A decisão caiu, em segunda instância, menos de 24 horas depois.

O cantor postou um vídeo contestando o envolvimento das empresas dele em transações ilegais.

“Gente, eu não tenho nada a ver com isso, me tira fora disso”, diz ele na gravação. “Meu avião foi vendido, ano passado, e eu não tenho nada a ver com isso, tá bom?”

Por meio dos advogados, Gusttavo Lima respondeu às perguntas feitas pela polícia. Negou conhecer Darwin Filho — aquele que, segundo a polícia, pertence a uma família de bicheiros do Recife.

O cantor também afirmou que os registros de compra e venda das aeronaves — nas negociações com Darwin e com Rocha Neto — foram feitos sem ocultação ou dissimulação e os pagamentos, em contas bancárias normais.

O cantor ainda negou ter relação de intimidade com Rocha Neto e Aissla.

Polícia suspeita que Gusttavo Lima seja dono oculto da Vai de Bet

Em julho desse ano, Gusttavo Lima virou, segundo o inquérito, sócio da marca Vai de Bet, com participação de 25%. Mas os investigadores suspeitam que o cantor já era uma “espécie de dono oculto” desde antes.

No final de 2023, a Vai de Bet fechou um patrocínio milionário com o Corinthians que acabou virando alvo de outra investigação em São Paulo.

Em depoimento à polícia, um conselheiro do clube contou que o presidente do Corinthians falou por telefone com Gusttavo Lima e que o presidente afirmou — já naquela época — que o cantor era um dos donos da Vai de Bet.

“Em um dos depoimentos das testemunhas ouvidas no caso da subtração de valores do Corinthians, é mencionado que, no momento da assinatura do contrato, foi informada essa testemunha por parte do presidente do Corinthians, que a Vai de Bet teria como um dos sócios o Gustavo Lima”, afirma Juliano Carvalho, promotor de Justiça do Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público de São Paulo.

O Corinthians disse que o caso está na Justiça e que o clube não trata mais de questões ligadas a essa empresa.

O que dizem as defesas

Gusttavo Lima

A defesa de Gusttavo Lima enviou uma nota ao Fantástico informando que o dinheiro no cofre da Balada Eventos era para pagamento de fornecedores. Quanto às notas sequenciais, diz que os valores foram declarados e os impostos pagos.

A defesa do cantor afirma ainda que o contrato com a PIX365 tinha cláusula anticorrupção e foi suspenso. E sobre a venda das aeronaves, diz que os contratos foram feitos em nome das empresas com os seus representantes legais, o que afasta a possibilidade de lavagem de dinheiro.

A nota diz também que o cantor não é sócio da Vai de Bet. O contrato encontrado pela polícia indica que ele tem 25% de eventual venda da marca.

Em relação ao investigado Rocha Neto, a defesa de Gusttavo Lima disse que ele esteve junto do empresário em alguns eventos em decorrência da relação comercial. Gusttavo disse que o casal deixou o navio no dia da operação e que voltou ao Brasil sem eles.

Sobre o indiciamento do cantor, os advogados disseram que o envio de dinheiro para empresas de Gusttavo Lima, mediante contratos assinados, não constitui nenhum ilícito.

A defesa mandou ainda uma nota complementar informando que a análise dos policiais apresenta falhas ao não considerar a data digital do distrato da compra de uma das aeronaves.

Rocha Neto

A defesa de Rocha Neto diz que as notas sequenciais da PIX365 emitidas à empresa de Gusttavo Lima são pela prestação de serviço do cantor à Vai de Bet.

Sobre a negociação de aeronaves, a defesa alega que ele usou o helicóptero como parte de pagamento do jatinho da Balada Eventos.

Quanto à movimentação financeira, Rocha Neto afirma que tem negócios diversificados e que sua família empreendeu e prosperou no ramo da construção civil, há décadas. Disse ainda que ele e a esposa hoje lideram a marca Vai de Bet.

Já sobre a participação de Gusttavo Lima na Vai de Bet, Rocha Neto afirma que o cantor tem direto a 25% da marca, mas que nunca foi sócio e jamais participou da administração.

Rocha Neto afirma também que o primeiro contato com Gusttavo Lima foi para tê-lo como embaixador da Vai de Bet e que — pela relevância da parceria — frequentaram eventos a convite dele. Um deles foi o aniversário do cantor, na Grécia, quando o casal teve a prisão decretada e não se apresentou.

Darwin Filho

Darwin Fiilho nega ter relação com o jogo do bicho. E quanto ao cancelamento da compra do avião do cantor sertanejo, ele disse que a transação foi lícita e regular. Segundo ele, a própria quebra de sigilo bancário confirma as informações prestadas.

As bets

A pressão para a regulamentação das bets, prevista para janeiro de 2025, aumentou. Nesta semana, o Banco Central divulgou um dado preocupante: o mercado que domina hoje o grosso das apostas são das bets irregulares. Elas nem se apresentam como bets — em vez disso, estão cadastradas como qualquer outra cois, por exemplo, um salão de beleza.

Ainda de acordo com o levantamento, pessoas que recebem o Bolsa Família gastaram somente em agosto cerca de R$ 3 bilhões em transferências PIX para casas de apostas.

Nesta semana, o governo Lula deve apresentar um plano para impedir o uso do Bolsa Família em bets. Elas são autorizadas no Brasil desde 2018.

A partir de 1º de outubro, as bets que não solicitaram autorização no Ministério da Fazenda terão a operação suspensa no país.

“Nós iremos divulgar no dia 1º uma lista de todos os sites de apostas que estão no período de adequação. E apenas esses sites estarão legalizados neste momento”, diz Regis Dudena, secretário de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda.

“A regulamentação separa quem são empresas de apostas, de pessoas que estão usando a aposta para outra coisa”, continua ele. “É papel do Estado regular esse primeiro grupo das empresas para que elas prestem o serviço cumprindo regras e é papel do Estado também, na outra ponta, coibir a atividade criminosa.”

Gusttavo em atividade

A agenda de shows do cantor sertanejo está mantida. A primeira apresentação depois da semana turbulenta foi na última sexta (27), em Marabá, no Pará.

Gustavo Lima
Foto: Reprodução/Redes Sociais

“Acredita nos teus amigos, nos seus parceiros. Valorize a tua família. E honra acima de tudo. Seja honesto. Faça o errado. É, de vez em quando. Faça o certo. O errado todo mundo já faz”, disse o sertanejo durante o show. “Seja certo, seja justo, seja honesto. Pra que quando tudo parecer desmoronar, só tua honestidade te salvará.”

Fonte: g1/Fantástico

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