No ano em que o primeiro bloco afro do Brasil completa 50 anos de existência, a tradicional Banda de axé, a ‘Ara Ketu’ anunciou nas redes sociais, nesta terça-feira (30), que não irá desfilar no Carnaval de Salvador 2024. Em nota, a banda alega falta de valorização do grupo por parte dos organizadores do evento.
Segundo o pronunciamento publicado no Instagram, a Prefeitura de Salvador inviabilizou a apresentação ofertando o pagamento de um cachê defasado, semelhante ao do ano de 2017.
Além disso, no anúncio, a Ara Ketu criticou o tratamento recebido pelas bandas que não fazem parte do ramo musical de massa, mas que são tradicionalmente históricas e importantes para a história da festa. Inclusive, grupos que arrastam multidões negras e pobres na avenida. Ao invés disso, contratam cantores de fora do cenário cultural do estado que recebem milhões para tocar.
Este ano, a Banda Ara Ketu completa 44 anos de história. A primeira banda de axé, criada por uma mulher negra, Vera Lacerda, dá início a partir de 8 de março às comemorações em celebração aos 45 anos de música, axé e ancestralidade nos palcos.
Nascida no bairro de Salvador, em Periperi, o ‘Povo de Queto’, em tradução de seu nome em iorubá, a banda carrega um legado de trabalho social, representatividade e protagonismo no carnaval da Bahia, o que segundo eles, esse ano vai ficar de fora por falta de valorização e reconhecimento da cultura negra da cidade.
Confira o pronunciamento:
ESTAMOS DESISTINDO DE DESFILAR NO CARNAVAL DE SALVADOR EM 2024! No dia 27 de janeiro, fomos surpreendidos, mais uma vez, pela Prefeitura de Salvador com um tratamento que desvaloriza a nossa apresentação no carnaval. 31 anos depois, a história se repete…
Depois de uma classificação estranha no Ouro Negro (que em tese era para ser um programa de valorização do povo Negro da Bahia), recebemos a proposta de pagamento de cachê para apresentação da banda Ara Ketu com o mesmo valor de 2017. Ou seja, congelamento de nossos serviços por 7 anos.
Tentamos argumentar, mas mediante a resposta negativa e até humilhante da prefeitura, resolvemos sair do Carnaval de Salvador. Percebemos que não temos valor aqui, que não nos querem aqui, talvez pelo fato de pertencer a uma comunidade Preta e pobre, local que em nada é romantizado pela classe branca e mandatária de nosso Estado/Cidade.
Ir ao subúrbio não é bonito… Não é cult…
Somos suburbanos e defendemos nossa comunidade. Cantamos aos quatro cantos do Brasil e no mundo que viemos de Periperi. Nossa contribuição para esse formato de carnaval que existe hoje, pelo que entendemos dos nossos mandatários, não existiu. É sempre assim. Os trios elétricos que sobram, o horário de desfile lá no fim da fila e os horários nobres vocês sabem para quem vai.
O apagamento existe, afinal, eles “esquecem” que nós temos a primeira mulher, que, em plena década de 80, teve a coragem de criar e formar o Ara Ketu. Somos bem recebidos nos eventos do Brasil, acabamos de dividir palco com Bell e Ludmilla no Cabofolia, realizamos o pré-Carnaval de Fortaleza para milhares de pessoas, cantamos em diversas micaretas, mas para o carnaval de Salvador, somos uma atração sem valor, ou com o “é isso que temos para vocês”.
Temos o nosso valor. No ano em que completamos 44 anos de história, vamos criar o dia do Ara Ketu, em 8 de março (dia da nossa fundação), iniciando o ciclo de comemorações de 45 anos.
Iremos para a nossa comunidade, mas não como banda. Como instituição cidadã. Esse será o nosso protesto contra esse descaso e humilhação que somos vítimas ao longo desses últimos anos. O nosso carnaval será pelo Brasil, literalmente por todas as regiões do país, mas não estaremos em Salvador. Porque eles não nos querem aqui. Milhões para os que vêm de fora e descaso para os que sempre fizeram a festa acontecer.
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