Educação

Dia da Língua Portuguesa: professora comenta processo de construção do idioma

Segundo a professora, a Língua Portuguesa se originou no Galego Português, uma língua do tronco indo-europeu.

Foto: Kaio Vinicius/Acorda Cidade
Foto: Kaio Vinicius/Acorda Cidade

Neste sábado (5), comemora-se o Dia Nacional da Língua Portuguesa, que para muitas pessoas, até mesmo falantes nativos, é considerada difícil de aprender. De acordo com Sofia Menezes, que é professora de Língua Portuguesa em um curso pré-vestibular, a ideia de que a língua portuguesa é muito difícil não possui base científica e nem linguística.

Já inglês é uma língua franca, mas que, conforme pontuou a professora, a economia elegeu para que todos se comunicassem, e por isso é natural que pela quantidade de coisas que as pessoas consomem em inglês, achem o som das palavras muito comum aos ouvidos.

“Nenhuma língua é mais difícil que a outra. A gente tem hoje dentro dos estudos linguísticos o que a gente chama de gramática universal, que basicamente são as organizações do nosso cérebro, que permitem a gente se comunicar, que pessoas sem nenhum tipo de deficiência vai ter. Mas temos que concordar que tudo na nossa vida parte de um ponto de referência, e dentro da nossa estrutura mundial hoje a referência é tudo que vem de uma comunidade germânica. Só que a língua portuguesa vem do tronco indo-europeu e, consequentemente, é uma língua latina. Se você pega uma pessoa que fala alemão ou inglês, por exemplo, que são de origem germânica, por consequência, ela vai ter mais dificuldade com uma língua latina, porque vem de famílias diferentes. O mesmo vale para nós: para nós que somos do Brasil o espanhol pode soar um pouco mais fácil. Mas não é porque o espanhol é uma língua mais fácil em si, mas é porque o português é como um primo do espanhol, pertencem à mesma família, das línguas neolatinas, que derivam da região do Lácio”, explicou.

Origem do português brasileiro

Professora Sofia Menezes, de Língua Portuguesa

Segundo a professora, a Língua Portuguesa se originou no Galego Português, uma língua do tronco indo-europeu.

“Uma coisa diferente que eu gosto de trazer para meus alunos é a problematização para que a gente entenda os tipos de português que a gente conhece. Estamos muito acostumados a pensar na Língua Portuguesa como uma língua única. Olhando para países da Europa, como Portugal, cria uma noção de que o português que se fala naquele país, é o mesmo que se fala no Brasil. Mas acho que todo mundo que já teve a experiência, ainda mais agora com as mídias digitais, de ver um vídeo de um falante do português de Portugal, já sentiu que não é exatamente assim. Muitas vezes a gente tem dificuldade de compreender o que o português (de Portugal) diz, não somente, por uma questão de léxico (as palavras que essa língua carrega), mas também uma questão sintática (a forma como as orações se organizam).”

Ela observou que a língua portuguesa brasileira tem diversas influências dos povos indígenas e africanos.

“Isso é importante para a gente falar sobre a língua portuguesa brasileira, pensando que a língua que a gente fala aqui no Brasil, não é somente este português oriundo do tronco do Indo-Europeu e da Língua Galega, mas o que a gente entende no Brasil é uma língua distinta, que bebe, não só da influência da Galícia, mas também dos povos indígenas e dos povos africanos, tão territorializados no Brasil, na própria maneira como a gente estrutura essa língua. Então quando você me pergunta: ‘De onde vem o português?’, tenho que te devolver o seguinte: ‘De qual português estamos falando?’. Eu tenho trabalhado com essa perspectiva de que o português brasileiro pode ser considerado distinto do português de Portugal.”

livros
Foto: e lil_foot_/ Pixabay

Conforme Sofia Meneses, existem muitas discussões dentro do processo de construção da língua portuguesa do Brasil.

“Sofremos com a influência de outras línguas. Esse processo acontece com algumas discussões políticas que atravessam isso. Tem diversos países que falam português, não só na África, mas algumas comunidades na Índia também. Aqui no Brasil temos duas línguas oficiais: a portuguesa e a segunda é a Libras (Língua Brasileira de Sinais), e quando a gente fala de política lingüística, temos que lembrar que a língua oficial tende a mais variações, porque é aquela língua que a gente usa mais no nosso cotidiano, então é neste sentido que o português brasileiro vai se alterando e ganhando nossa cara. Quando a gente vai para os países africanos, muitas vezes, ela é uma das línguas, nem sempre é a oficial, e nem sempre é a língua materna, ou seja, a primeira a ser aprendida por essa comunidade, e isso gera um distanciamento cultural e uma aproximação dessa língua do colonizador, que o português.”

A professora de português enfatizou que a comunicação escrita é tão importante quanto a comunicação oral.

“A linguagem escrita tem seu valor, e a oral tem seu valor também. Eu acho muito interessante no século XXI a gente retomar a importância da oralidade para a nossa cultura, porque isso inclusive é valorizar o conhecimento dos mais velhos, e reconhecer que nem todo saber é esse acadêmico, mas também o nosso saber popular, cotidiano, e que necessita ser reconhecido dentro de espaços, por exemplo, a escola.”

Gírias: atrapalham ou ajudam?

“A língua não tem como atrapalhar a própria língua. As gírias são variações que surgem a partir do uso e servem para a gente se comunicar. A gente precisa também pensar no contexto de adequação. As gírias são muito bem vindas na nossa comunicação informal, nas redes sociais, e até mesmo em algumas propagandas. O que a gente precisa ter cuidado é com a adequação, porque essas gírias que são muito bem vindas no nosso cotidiano, talvez não sejam na nossa prova do Enem, então muito mais do que pensar a lógica da correção, devemos pensar a lógica da adequação, se comunicar de acordo com o ambiente em que estamos”, argumentou Sofia Menezes.

Prova do Enem

candidatos realizando prova
Foto: Marcos Santos/USP Imagens

De acordo com a professora, a prova de língua portuguesa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) traz uma dinâmica interessante, abordando conteúdos como variação linguística e a história da língua.

“Eu particularmente tenho algumas críticas à estrutura da prova do Enem. É uma prova árdua, dura, cansativa física e mentalmente. Mas também tenho muitos elogios, principalmente sobre a prova de Linguagem, que traz sobre a variação, a história, e é aplicado com muito cuidado. A língua portuguesa que a gente vai encontrar no exame não está pautada em uma dinâmica de correção gramatical, mas sim preocupada com as variantes do português que a gente tem, e o que a gente vai é uma discussão muito ampla. Eu acho que tem um grande problema do estudante, quando ele vai prestar o Enem para a Língua Portuguesa, que por ser basicamente interpretação de texto, eles tendem a jogar na caixinha das coisas que não precisam estudar. Mas a interpretação de texto, na verdade é uma etapa do processo de produção de leitura, e para interpretar um texto é necessário que se tenha referencial teórico, base de conhecimentos práticos, técnicos e assim tenha competência para ler aquele texto”, pontuou.

Com informações do repórter Ney Silva do Acorda Cidade.

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