Tremedeira, suor, crises de choro, falta de ar, tarquicardia são alguns dos sintomas que podem indicar que alguém está tendo uma crise de ansiedade. Com a pandemia, o assunto passou a ser debatido com mais intensidade e tem ligado o sinal de alerta entre os especialistas, sobretudo por estar afetando pessoas cada vez mais jovens.
Um caso que chamou atenção no mês de abril, foi quando 26 estudantes de uma escola pública de ensino médio em Recife tiveram um quadro generalizado de ansiedade. Os adolescentes apresentaram crises de choro, nervosismo, tremedeira, sudorese e precisaram ser atendidos por uma equipe do Samu.
O Dia Mundial da Saúde Mental é comemorado nesta segunda (10). A data foi instituída pela Federação Mundial de Saúde Mental, em 1992, com o objetivo de alertar para os cuidados necessários à manutenção da saúde mental. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que a pandemia de covid-19 criou uma crise global na saúde mental e estima que houve um aumento de 25% nos casos de ansiedade e depressão, só em 2020.
É o caso do estudante de filosofia Pedro Sergio de Souza das Virgens, 22 anos. Ele morava em um seminário religioso e precisou abandonar os estudos, após ser diagnosticado com o quadro e ser encaminhado para tratamento com especialista.
“Começou em outubro de 2021. Eu fui tendo algumas crises e precisei ir ao médico, mas não fui diretamente diagnosticado com ansiedade primeiro, mas sim com infecção viral. A partir daí comecei a tomar a medicação, mas nada resolvia, até que o quadro se agravou, passei por momentos de automutilação e fui indicado para o psicólogo, dando início a uma terapia. Ele disse que eu estava com quadro de ansiedade e deveria procurar um psiquiatra para passar com a intervenção medicamentosa”, relatou o jovem em entrevista ao Acorda Cidade.
O estudante contou que sentia tremedeira, dores do corpo, náuseas, vômito, taquicardia, falta de ar, crises de choro e fobia social.
“Em qualquer momento que eu estava em um local, que eu estava com bastante pessoas, já me geravam uma nova crise, então eu tinha que me retirar. Se eu estivesse em um local com pessoas próximas a mim já desenvolvia uma sudorese, uma falta de ar, taquicardia e isso atrapalhava as minhas relações sociais. Então em vários momentos eu realmente tinha que sair, porque todos percebiam aquele momento, eu deveria estar ali e eu não estava, então eu precisava me afastar”, afirmou.
Atualmente o estudando do 6º semestre de Filosofia está em tratamento com psicoterapeuta e faz uso de medicamentos. De acordo com ele, a cada retorno ao médico é feita uma nova avaliação do seu estado emocional e se está evoluindo no processo.
Na avaliação dele, a juventude não está preparada em algumas situações para conviver com a ansiedade e minimiza os sintomas.
“A gente determina que ansiedade é só aquela ansiosidade que dá quando a gente vai para algum lugar diferente, e na verdade não. Muitas vezes o jovem procura um refúgio, não em um tratamento psicológico, mas em várias outras coisas, como festas. A ansiedade nunca é tratada nesses lugares, dá um alívio temporário, mas ansiedade mesmo tem que ser acompanhada pelo psicólogo. O acompanhamento psicológico traz vários pontos que ajudam a pessoa em si, não só a pessoa com ansiedade. Mas a pessoa começa a ter mais segurança de si, porque a insegurança causa ansiedade, a pessoa começa a entender o que causou aquele quadro de adoecimento, consegue perceber os gatilhos. Também consegue perceber como evitar crises de ansiedade fortes. Ou seja, isso ajuda a pessoa, não só aquele que tem quadro de adoecimento, mas o ser humano em si, que ajuda a se reconhecer, saber suas potências e seus limites também”, disse.
De acordo com Débora Oliveira, que atua como psicóloga clínica, o transtorno de ansiedade está relacionado à saúde mental, é caracterizado por sintomas de preocupação, medo excessivo capaz de tornar ações cotidianas algo disfuncional.
Ela explicou a diferença entre a ansiedade comum e o transtorno. “Ansiedade, todos nós temos, faz parte do ser humano. É como se fosse uma ferramenta natural nossa para identificar algo que nos incomoda ou que tem algo de errado naquela situação, então é normal que em uma situação nova a gente fique ansioso, porque não sabe o que vai encontrar. A ansiedade passa do normal para o patológico quando ela atrapalha a nossa rotina, interfere no trabalho, nos estudos, no meu dia a dia eu desenvolvo medos, então tenho medo de sair de casa e aí a ansiedade passa ser um caminho para outros tipos de patologias, como o transtorno do pânico”, explicou.
Segundo a psicóloga, o transtorno de ansiedade atualmente atinge todas as faixas etárias, independente do sexo.
“Nós temos visto que esse período de pandemia o transtorno de ansiedade vem aumentando bastante em todas as faixas etárias, então hoje temos acesso a espaços escolares que relatam isso dos seus alunos, crianças de 4 a 5 anos já com transtorno de ansiedade, adolescentes totalmente irritados, sem paciência na sala de aula e com adultos, adultos muito insatisfeitos, que passam sua rotina de sono prejudicada, rotina de trabalho prejudicada, então a ansiedade hoje ela está atingindo de uma forma bem horizontal”, esclareceu.
O que causa a ansiedade?
A ansiedade, conforme Débora Oliveira, é causada em certa medida por mudanças bruscas e inesperadas, traumas, mudança de cidade, mudança de escola ou mudanças de trabalho, mudanças que não são desejadas por nós e podem gerar algum transtorno de ansiedade.
Com relação aos sintomas, os quadros geralmente apresentam falta de ar, dores abdominais, tremores, rigidez muscular, que são quadros clássicos.
“Tem crises de ansiedade que a pessoa pode apresentar desmaio, perda de visão momentânea, insônia, então vai ter vários sinais e sintomas a depender de cada sujeito. Para acontecer a crise tem que vir o gatilho, que é aquilo que vai provocar, então o paciente quando já tem o conhecimento sobre a sua ansiedade, é possível que ele já perceba quando a sua ansiedade está chegando, ele começa a sentir o coração acelerando, então vai sentido um desconforto, suadeiras nas mãos. Esses já são indicativos de quem vem uma crise. Muitos pacientes tentam utilizar fuga de pensamento como estratégia. Então se eu tirar a minha atenção daquilo que está causando a minha ansiedade, pode ser que consiga manejá-la, melhorar a situação, mas ultimamente a gente tem percebido que isso não tem funcionado, então mesmo que a fuga de pensamento ocorra, a crise ela chega e se instala de uma forma intensa”, salientou.
Com a pós-pandemia, pessoas tiveram rotinas alteradas de uma forma muito brusca e foram obrigadas a viver de uma forma totalmente diferente. As crianças, na opinião da psicóloga, se adaptaram, sobretudo aquelas que conviveram a sua primeira infância nesse período de pandemia.
“Elas se adaptaram a conviver com a família de uma forma isolada e agora a pandemia acabou e elas estão tendo que se readaptar a viver em sociedade, a frequentar as escolas, a estar sem os pais, então isso por exemplo causa a ansiedade nas crianças. Os adolescentes hoje são um público que tem tido muitas crises de ansiedade, por ser um público perdido naquilo que vai fazer, é uma fase muito difícil, onde se sentem pressionados pelos pais, pela nossa escola, de toda a forma e acaba tencionando e trazendo a crise de ansiedade. Quando é que isso acontece com os adolescentes? Quando ele sente que não dá conta de toda essa cobrança”, pontuou.
Ela relatou que hoje 60% dos pacientes que atende são adolescentes e todos apresentam transtorno de ansiedade.
“O transtorno de ansiedade ele chega de uma forma massiva, então tenho pacientes que muitas vezes vêm com outras queixas, mas quando a gente vai investigar a ansiedade também está instaurada naquele paciente. Tem o choro excessivo, a rigidez muscular, o que eles chamam de paralisação. É como se eles não conseguissem mexer nenhum dedo, nada, então o choro excessivo, tremores no corpo, tudo isso. Isso pode se agravar, se nós não cuidarmos da ansiedade, esse paciente ele vai ter a sua convivência diária prejudicada, vai desenvolver o medo intenso, pode progredir para uma crise de pânico e isso vai ser uma pessoa com demarcação, isolamento social, ele não vai conseguir sair de casa, vai ter medo de se relacionar com outras pessoas, medo que outras pessoas vejam essas crises, medo de parecer fraco, de não atender as expectativas, então isso também pode evoluir para um quadro depressivo. Então eu costumo dizer que a ansiedade abre porta para vários caminhos”, reforçou.
Débora Oliveira orientou o tratamento, primeiro com um psicólogo, que vai avaliar em que nível está esse transtorno de ansiedade, e se o tratamento precisa ser feito em parceria com o psiquiatra, para inserir as medicações.
Mas, ela ressaltou que há também formas de prevenção ao transtorno, como a atividade física, atividades que tragam relaxamento e o diálogo em casa.
“Famílias devem estabelecer um diálogo frequente com os seus filhos, fazer com que eles se percebam de uma forma mais amena, buscar formas também de estabelecer parcerias com seus filhos, de buscar aquilo que a criança e ao adolescente gostam. Então eu vou estimular o meu filho a fazer uma atividade física, porque faz bem, mas eu não posso impor a atividade que eu acho adequado, a gente também tem que perceber o que essa criança quer, o que esse adolescente quer, porque desse tipo de ação, a gente está dizendo para ele, que ele no futuro também vai escolher a profissão, o trabalho, a pessoa com que vai passar o resta da vida e por aí vai”, concluiu.
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade
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