por Vladimir Aras
A decisão do STF sobre a Marcha da Maconha não poderia ter sido outra. O STF não autorizou o uso de drogas nem o incentivou. Coube ao tribunal cumprir o papel de guardião da constituição.
Por provocação da Procuradoria-Geral da República (PGR), em ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) firmada pela SubPGR Deborah Duprat, o STF acabou com o atordoante festival de liminares que vinham proibindo a marcha da Cannabis sativa pelo Brasil.
Nem o MPF, que propôs a ação, tampouco o STF, que a julgou procedente por unanimidade, pretendem estimular ou autorizar o uso dessa droga. O Brasil é signatário da Convenção de Viena de 1988, que coíbe o narcotráfico, e tem lei contra substâncias entorpecentes, a Lei 11.343/06. Porém, o País também tem liberdades públicas. Duas delas estavam em jogo na questão “maconheira”. As liberdades de reunião e de manifestação do pensamento.
Não são poucas as pessoas que defendem a liberação da maconha. Não são menos numerosas tampouco aqueles que defendem a completa descriminalização das drogas. Aqui na Europa, de onde agora escrevo, o debate é muito intenso em Portugal e na Holanda. Nesta, há espaços próprios para a venda de maconha para uso próprio. Alguns líderes globais, entre eles o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, têm defendido a descriminalização da Cannabis sativa. Nos EUA, uma ONG formada por policiais, advogados e membros do Ministério Público, a Law Enforcement Against Prohibition (LEAP), sustenta abertamente a bandeira descriminalizadora. Estes e outros enxergam o fracasso da guerra global contra as drogas, capitaneada pelos EUA, que tem queimado milhões de “verdinhas” para combater implacavelmente o “matinho” e drogas mais perigosas.
Por trás desse discurso, há interesses escusos -de traficantes em busca de mais lucros e da indústria do vício, mas também há nobres iniciativas, como as dos pesquisadores que defendem o uso medicinal da droga. Num dos mais interessantes episódios de Law and Order SVU, a capitã, acometida de câncer, vê-se no dilema de usar maconha para combater os enjoos resultantes da quimioterapia.
Um fato inquestionável é que os Estados não têm conseguido vencer as drogas, nem as antigas – que sempre foram usadas ritualisticamente – nem as novas – usadas precipuamente para fins recreativos. Algo semelhante aconteceu nos EUA, quando foi aprovado o Volsted Act, a Lei Seca, que pretendeu proibir o consumo de alcool. Não funcionou. Só o crime organizado e os produtores clandestinos de bebidas alcoolicas se beneficiaram da Era da Proibição. Poucos anos depois, a emenda foi revogada e o álcool voltou a ser uma droga “legal” e ninguém cogita criminalizar seu uso – salvo países islâmicos fundamentalistas – e muito pouco, mesmo no Brasil, aceitariam abdicar de seu uso recreativo. Curioso que alguns desses que “enchem a cara” de pinga, cerveja, vinho e uísque, estão entre os que clamam contra a marcha dos maconheiros.
Em suma, o problema é muito mais complexo do que parece e obviamente não pretendo resolvê-lo aqui. O certo é que, com a proibição dos debates, das marchas e dos protestos estaremos sufocando com a fumaça da intolerância as sementes