Feira de Santana

Projeto de Lei que prevê distribuição de absorventes nas escolas municipais levanta debate sobre a pobreza menstrual

Caso seja aprovada pela Câmara e sancionada pelo prefeito Colbert Martins, a distribuição do material de higiene será de responsabilidade do Poder Executivo.

Laiane Cruz

No dia 13 de julho, foi protocolado na Câmara de Vereadores um projeto de lei que prevê o fornecimento gratuito de absorventes pelas escolas públicas municipais de Feira de Santana. O autor do PL foi o vereador Galeguinho SPA, que espera que a discussão entre na pauta em breve. Caso seja aprovada pela Câmara e sancionada pelo prefeito Colbert Martins, a distribuição do material de higiene será de responsabilidade do Poder Executivo.

Para o vereador Galeguinho SPA, esse é um tema relevante, entretanto não é tão debatido. “Sabemos que existem famílias carentes em nosso município e que muitas vezes não têm condições de custear esses absorventes, que são substituídos por panos, pedaços de pães, outros objetos que são colocados no lugar dos absorventes. Eu venho de uma família, tenho irmãs e vejo a dificuldade que havia dentro de casa”, afirmou em entrevista ao Acorda Cidade.

Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade

A ideia do vereador é que cada escola possa efetuar a compra do material juntamente com outros de uso essencial para o dia a dia da escola, a exemplo dos produtos de limpeza.

“Existe um fundo fixo para todos os colégios, eu não sei qual é o valor exato, mas esse fundo tem condição tranquila de poder custear, porque sabemos que não é todo mundo que não tem condições de comprar. Mas que seja disponibilizado, assim como existem os produtos de higiene, como papel higiênico, detergente, sabão em pó, que mantém a limpeza do colégio, que sejam incluídos alguns pacotes de absorventes pra que na hora que a criança precisar solicite e possa levar para casa e tenha mais qualidade e conforto”, disse.

A secretária municipal da mulher, a vereadora licenciada Gerusa Sampaio, destacou que parabeniza a sensibilidade dos colegas por entenderem a necessidade de contribuir com o tema. No entanto, o projeto protocolado pelo vereador Galeguinho iria gerar despesas ao erário público e por isso se torna inconstitucional.

Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade

“Hoje a pobreza está aflorada nas comunidades, nos lares de baixa renda e é muito válida essa iniciativa, porém não através de um projeto de lei, porque isso gera gastos para o erário público. Mas tem como provocar para que até mesmo o poder executivo busque através do Ministério da Educação e da Saúde pra que venham verbas carimbadas pra que o poder público municipal possa distribuir com as escolas. Mas a iniciativa é pertinente, porque é papel também do parlamentar provocar para que as ações aconteçam”, ponderou.

Segundo Gerusa Sampaio, a pandemia causou muito desemprego e não afetou apenas a saúde, mas a economia do país, e as pessoas estão necessitando de suporte na alimentação e  higiene, e  são necessárias mais políticas públicas para atender essa camada da população.

“A prefeitura pode ajudar, mas não por projeto de lei. Claro que os vereadores podem fazer indicações, e o prefeito tem um olhar muito sensível nas questões sociais e da família, por isso estamos aqui com a Secretaria Extraordinária para atender essas demandas. Esse projeto gera custo. Eu estive vereadora, já fui também presidente da Comissão da CCJ, e a gente entende que não é constitucional. Eu não sei se esse projeto de lei vai passar, pois não é constitucional. Eu não posso gerar despesas. É o executivo que faz isso, ele tem esse poder, mas não o legislativo”, informou.

Ela disse ainda que a secretaria vai promover um drive-thru de higiene para as mulheres e esse material arrecadado será distribuído para as famílias de baixa renda. “Tudo que a gente puder fazer para avançar não só na higiene, alimentos, mas também a capacitação, é para terem oportunidade no mercado de trabalho, se manterem, terem sua higiene e sua alimentação.”

A digital influencer Tamires Ribeiro Silva, que mantém uma página no Instagram @barttiras com conteúdos relacionados à educação sexual, acredita que a ideia do projeto é muito interessante, mas que é preciso expandir a discussão. “Poucas pessoas sabem, mas a pobreza menstrual é um problema que afeta o mundo inteiro, muitos países, incluindo o Brasil. Ela está muito além das escolas e das adolescentes.”

Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade

Conforme Tamires Ribeiro, a ideia de falar para o público feminino surgiu quando ela percebeu que havia uma deficiência sobre a educação sexual, sobretudo em relação às meninas que possuem baixo poder aquisitivo.

“O pouco que eu sei sobre o meu corpo aprendi pesquisando. Não tive instrução dentro de casa e na escola. Como a gente tem hoje o advento da internet e a possibilidade de expandir, eu resolvi trazer esse assunto e estou levando educação sexual para mulheres de todas as idades. Tenho seguidoras de 15 até 60 anos. A gente tem poucas discussões em Feira de Santana sobre esse assunto, mas eu acho super importante a gente abrir mais esse leque de informação pra outros meios.”

A influenciadora ressaltou que a pobreza menstrual é muito grande nas escolas por conta do baixo poder aquisitivo, por conta da desigualdade social, mas é preciso pensar também nas mulheres em situação de rua, pois elas também não possuem acesso a esse produto de higiene básica, bem como mulheres que moram nas periferias.

“Esse assunto é um tabu, as pessoas não falam sobre a menstruação, elas têm nojo, porque não conhecem. O machismo fez a gente acreditar que qualquer assunto relacionado ao corpo, ao órgão genital feminino, é sujo, então a gente precisa abrir essa pauta, que não é tão cheio de tabu assim e não é tão difícil de entender.”

O projeto de lei que prevê a distribuição de absorventes entre as estudantes mulheres não abarca as escolas estaduais. Por outro lado, há unidades de ensino que mantém a iniciativa de realizar esse fornecimento às alunas, a exemplo do Colégio Estadual Assis Chateubriand, situado no bairro Sobradinho.

A diretora do Colégio Estadual Assis Chateubriand, Leisliane Costa, afirmou que desde que começou a atuar na gestão pública percebeu que essa é uma situação recorrente nas escolas e que afeta muitas meninas em fase menstrual.

“A gente passa por essa situação, onde as alunas têm até a primeira menstruação na escola, e a gente sempre faz essa aquisição por meios próprios e mantem uma caixinha na sala da vice direção com absorventes, por ver essa necessidade. É uma coisa que acontece e ainda é constrangedor, que não deveria ser. Esse Projeto de Lei é um reconhecimento da figura feminina, um empoderamento das mulheres. A sociedade é patriarcal e tem uma questão muito machista, mas que hoje há esse reconhecimento do papel da mulher e da importância de valorizar isso dentro das escolas.”

Ela revelou que muitas meninas quando estão no período menstrual utilizam capote amarrados ao corpo por medo de algum vazamento, e algumas têm dificuldade de adquirir os absorventes.

“Ou mora, muito distante, ou estão na escola e não têm outro absorvente, muitas vezes até por uma questão financeira. Nós temos um público feminino muito grande na escola. O material fica na escola, a gente tem um armário com uma caixinha, e ele fica guardado para se houver necessidade. E as meninas têm essa proximidade com a direção e procuram para dizer. Elas sempre são encaminhadas para onde podem ser acolhidas nesse momento.”

Foto: Ed Santos/ Acorda Cidade

Estudante do 3º ano do Ensino Médio, no Colégio Estadual Assis Chateaubriand, Amanda Nascimento Oliveira, de 18 anos, acredita que esse é um tema que ainda traz constrangimento para muitas estudantes e já ocorreram situações com ela em que precisou do apoio de colegas e da escola.

“Muitas vezes as meninas esquecem de trazer e pode acontecer de alguma amiga da gente estar precisando, como já aconteceu com amigas minhas, de vazar no meio da aula, e a pessoa fica constrangida. E também tendo que ir pra escola, sem ter o absorvente. Já passei por constrangimento, mas tive colegas homens que foram sensíveis a mim. A gente pediu a uma colega da sala o absorvente e ela cedeu. E já aconteceu da gente perder aula por conta do absorvente”, contou.

Em Feira de Santana o Projeto Gineceu (@projetogineceu), arrecada arrecada absorventes para pessoas de baixa renda.

Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade. 

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