Feira de Santana

Jovem larga os estudos para cuidar da mãe acamada e fica impedido de sacar benefícios

Zenaide Luz foi beneficiada com a aposentadoria por invalidez, mas o filho está impedido de sacar o benefício.

Gabriel Gonçalves

Há mais de um ano, o estudante universitário Caio Luz, de 28 anos, tem dedicado toda atenção, zelo, carinho e principalmente amor aos cuidados com a mãe, Zenaide Luz, 48 anos, que sofreu por duas vezes Acidente Vascular Cerebral (AVC), em menos de dois meses e atualmente está acamada.

Em entrevista ao Acorda Cidade, Caio explicou que Zenaide é hipertensa e, por uma semana, a pressão ficou elevada, vindo a ter o primeiro AVC no final do ano de 2019.

"O primeiro AVC que ela teve foi no mês de dezembro de 2019, foi um período que a pressão dela estava descontrolada, estávamos sem anti-hipertensivo e em um momento que estávamos com a atenção voltada para o financiamento da casa. Deixamos todas as pendências de saúde para pensar nessa casa e ter o cuidado com a casa, porque estávamos naquele momento de mudança, então não deu para fazer exames, não estava tendo um acompanhamento direito e a pressão dela ficou alta por uma semana, foi quando teve o primeiro AVC isquêmico. Quando ela teve o segundo AVC, já foi no mês de janeiro de 2020, ficando em coma no Hospital Geral Clériston Andrade (HGCA), precisou fazer uma cirurgia craniectomia, tirou uma calota craniana da cabeça, que inclusive, hoje está armazenada na região abdominal aguardando outra cirurgia. Hoje minha mãe se transformou em uma mulher dependente, acamada, não consegue sentar sozinha, preciso trocar as fraldas, então ela necessita da minha presença para tudo", explicou.

Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

Caio explicou que uma perícia foi realizada no INSS e foi concedida a aposentadoria por invalidez. Porém o benefício não pode ser sacado pelo filho, segundo ele, o Banco Itaú não o reconhece como representante legal, mesmo apresentando todos os documentos comprobatórios.

"Nós realizamos uma perícia no INSS e foi comprovado que minha mãe já não consegue mais ter independência e foi concedida a ela, a aposentadoria por invalidez. Antes desta determinação, ela estava recebendo o Auxílio Doença. Atualmente nossa barreira está sendo com a agência bancária, que não está me reconhecendo dentro das suas funções administrativas como o representante legal da minha mãe. Eu tenho todos os documentos expedidos por juízes, como no caso do termo de curatela e o banco me solicita uma procuração pública, que são coisas parecidas, mas dadas as circunstâncias diferentes. Uma curatela, é dada por um juiz compreendendo que aquele paciente precisa de uma intervenção rápida e ela não tem consciência de muita coisa. Minha mãe teve um AVC hemorrágico e sofreu lesões cerebrais e passar por um processo de procuração pública, envolve cartório, o agente precisa realizar uma entrevista para depois conceder", informou ao Acorda Cidade.

Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

De acordo com Caio, esta situação do benefício bloqueado pelo banco já segue por quatro meses. Segundo ele, caso não tenha êxito diretamente com o banco, será preciso intermédio da Defensoria Pública.

"Já estamos há quatro meses sem poder receber o benefício da minha mãe. Eu sou estudante, não tenho renda fixa, minha mãe depende absolutamente deste benefício, uma pessoa que necessita de cuidados como a fisioterapia, fonoaudiologia, estamos lutando por uma reabilitação, e ficamos assim, vivendo com doações. Estamos tentando ver todas as possibilidades em vias administrativas junto ao banco, mas caso não tenhamos sucesso, precisamos judicializar, porque a cada dia que passa, esse circo está se fechando e o banco continua irredutível. Eles possuem nossos documentos, acessam nossos dados, me reconhecem como representante legal, mas alegam que o saque vai permanecer sem ser realizado, porque no sistema no banco, isso ainda não foi atualizado", lamentou.

Foto: Ed Santos/Acorda Cidade

Estudos

Atualmente Caio Luz está matriculado em duas faculdades. No curso de História na Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs)  e no curso de Jornalismo na Faculdade Anísio Teixeira (FAT). Para ele, a escolha de trancar os estudos foi necessária para doar todo o carinho para quem tanto o ama.

"Eu estou no terceiro semestre, já indo para o quarto do curso de Jornalismo e estou no sexto semestre do curso de História. Infelizmente eu estou dessemestralizado, mas sigo completando minhas disciplinas, eu já fiz 80% do curso e preciso completar as disciplinas que envolvem a conclusão do TCC para defender minha monografia e quem sabe tentar um concurso público. Eu deixei os estudos logo antes da pandemia, quando tudo começou lá em 2020 e eu não consegui mais dar continuidade com o curso de Jornalismo e com o curso na Uefs, eu até tentei, mas chegou em um determinado momento que precisei abandonar de vez porque não ficava mais concentrado na frente do computador assistindo as aulas de forma online. Essa é uma realidade que não é fácil para todo mundo, e eu tenho uma mãe que depende de mim, me chama para trocar a fralda, me chama para as necessidades dela, tenho que cuidar dela, tenho que cuidar da casa, então foi necessário abrir mão, pois ela só tem a mim, não existe outro filho, não tem esposo, sou a única pessoa que convive com ela e por este motivo, esta é minha responsabilidade cuidar dela", disse Caio.

Rotina do dia a dia

Caio precisou mudar radicalmente toda programação realizada durante o dia. De acordo com ele, Zenaide foi um grande auxílio quando ele era menor, mas agora, o papel do cuidado, é de responsabilidade do filho que só quer uma recuperação digna da mãe.

Foto: Arquivo Pessoal

"Eu sou filho único e sempre tive o auxílio da minha mãe, mas agora, eu sou o auxílio dela. Hoje eu que administro o horário das medicações, sou eu quem preparo o almoço, arrumo a casa, tem o horário da fisioterapia a tarde, tem a sessão com o fonoaudiólogo, tudo isso de forma particular quando eu consigo financiar estas terapias. A minha mãe, tem 48 anos e ainda está em processo de menstruação, ela sente cólicas, fica emotiva, se contorce, sente dores e por isso eu devo ter minha atenção voltada para ela sempre. Tem uma senhora por exemplo, que é nossa amiga, ela trabalha como diarista e quando pode vem nos ajudar. Hoje mesmo, ela está aqui porque conseguiu uma folga do trabalho, ela poderia está em casa descansando fazendo os seus afazeres, mas está aqui nos auxiliando, isso facilita porque logo mais, estarei indo ao banco mais uma vez tentar resolver o nosso problema", afirmou.

Um dos mandamentos presentes da Bíblia, é honrar teu pai e tua mãe. Segundo Caio, este é um dos mandamentos que mais devem ser respeitados aqui na Terra, e para ele, todo amor que foi recebido pela mãe, está sendo devolvido agora.

"Honre seus pais, pois isso é um mandamento bíblico e deve ser respeitado por todas as religiões, por todas as pessoas, porque a gente só tem a crescer para que nossos dias possam se prolongar na Terra. Nós temos um cuidado da parte de Deus muito grande e eu sou um fruto de um cuidado com Deus e tenho certeza que isso está relacionado com o cuidado que estou tendo com minha mãe, porque o amor que eu recebi dela, hoje eu que estou tendo com ela. A gente sabe que no auge da juventude, quanto mais a gente vai crescendo, vamos ficando egoístas, vamos ficando vaidosos, mas é neste momento que a gente abre mão disso, porque o que muda em mim, é a minha humanidade, hoje posso dizer que passei a olhar as outras pessoas de outra forma, e mesmo ainda sendo estudante, eu penso sim em uma vida melhor para minha mãe. As pessoas lutam por igualdade e eu estou também lutando por esta igualdade, estou lutando pelo direito da minha mãe poder sacar um benefício que é dela", destacou.

Doações

Sem poder sacar o benefício de Dona Zenaide, Caio junto com a mãe sobrevivem de doações, sejam através de recursos financeiros ou de alimentos.

"Hoje a gente recebe doações através das nossas contas bancárias, eu também disponibilizei na minha rede social @sercaio.luz, todas as informações. Na realidade é um perfil em formato de diário, onde conto toda a história da minha mãe, atualizo sempre as informações e quem quiser nos ajudar, os dados estão fixos na bio do próprio Instagram. Quem não pode doar em dinheiro, não tem problema, a gente recebe fraldas, itens de higiene pessoal, produtos de limpeza para a casa, são produtos que a gente mais precisa nesse momento. Essa é uma realidade que me dói e em alguns momentos, chega a ser até vergonhoso, por estar passando por uma situação como esta, ter que levar sua mãe até uma agência bancária, eles olharem o estado dela e não autorizarem com que eu faça o saque e ter que recorrer a um e a outro para sobreviver", lamentou.

Além das doações, Caio também recebe uma Bolsa Estudo que auxilia nas despesas dentro de casa, seja dos alimentos aos medicamentos, mas destacou que ainda sim, não é o necessário para suprir todas as necessidades.

Foto: Arquivo Pessoal

"Eu tenho uma bolsa de estudo no valor de R$ 500, e a gente tenta dividir esse recurso para pagar as contas de energia, de água, de internet, contas da fisioterapia, as pessoas ajudam como podem, e desde já eu agradeço independente do valor, porque acho que além do valor, só a intenção de querer ajudar, já se torna uma ajuda. Chega um momento que precisamos de atenção também. Eu espero que essa história que estou vivendo com minha mãe, também possa inspirar outros filhos a cuidarem sempre dos seus pais, independente da situação, pois eu recebi o amor da minha mãe que lutou sozinha para me criar e eu, como filho único, estou nesse momento retribuindo e lutando por ela", concluiu.

A reportagem do Acorda Cidade entrou em contato com o Banco Itaú e obteve a seguinte resposta:

O Itaú Unibanco pede desculpas pelos transtornos causados ao cliente e informa que a questão já foi resolvida, e que os valores já estão disponíveis para saque. O banco segue à disposição por meio das centrais de atendimento em caso de dúvidas ou reclamações envolvendo seus produtos e serviços.

Quer ajudar?

Entre em contato com Caio através do telefone (75) 9 8886-6195 ou Pix 050.592.235-58 (CPF). 

Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade

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