Rachel Pinto
Atualizada às 15h45
O Brasil está há mais de 80 dias vivendo os impactos da pandemia do coronavírus e do distanciamento social. Essa nova realidade trouxe novos comportamentos e alterou muitos sentimentos e emoções das pessoas. Você que está passando por isso junto com o mundo inteiro, com certeza em algum momento desta fase sentiu um cansaço extremo, desânimo, ou até mesmo teve dias em que se sentiu muito positivo e confiante. As incertezas causadas pela covid-19, junto com todo o noticiário da doença e a interrupção de muitas atividades sociais são responsáveis por esta realidade. A psicóloga Amanda Brito, em entrevista ao Acorda Cidade comentou sobre o assunto e deu algumas dicas de como enfrentar a o distanciamento social buscando equilibrar as emoções, mantendo-se mais saudável e tirando alguns aprendizados.
Ela explicou que o cansaço que grande parte das pessoas relata sentir nesta fase pode ser creditado a fatores diversificados e o índice de energia produzida pelo corpo humano.
“Primeiramente, é preciso lembrar que a energia que empreendemos ao longo do dia através do esforço físico é impulsionada por comandos mentais. Dessa maneira, mesmo se não estivermos realizando intensamente outras atividades corporais, o nosso cérebro permanece em constante exercício e isso demanda gasto energético e pode ocasionar sobrecarga mental, que também é um tipo de cansaço. Outro fator que interfere na disposição física tem relação com a contenção da energia que produzimos em nosso corpo. Se em circunstâncias comuns às nossas atividades permitem uma maior descarga energética, as limitações decorrentes do período de isolamento culminam no que chamamos de ‘ancoragem somática’, que é quando não temos a possibilidade de escoar esse fluxo de energia (e dos nossos conflitos psíquicos) em atividades cotidianas e ele fica alojado em nossa musculatura ou em outras partes do corpo, causando tensões e perturbações à saúde física, como o estresse”, afirmou.
Amanda relatou que embora o cansaço seja visto como um fator negativo, ele é muito importante, uma vez que é ele que sinaliza o limite de cada pessoa e a necessidade do descanso e recuperação da vitalidade. De acordo com ela, o cansaço se torna nocivo quando aparece de forma excessiva ou prolongada, assumindo o caráter de sobrecarga ou exaustão, comprometendo a qualidade de vida e gerando repercussões cognitivas e emocionais.
Ansiedade e angústia
Além do cansaço, a pandemia do coronavírus também despertou em algumas pessoas a ansiedade. Outras que já sofriam com esse sentimento estão com ele ainda mais potencializado e sendo gatilho para outras questões emocionais.
Amanda diz que de maneira geral, se o cansaço mental se torna crônico, ele irá repercutir em desgastes emocionais e cognitivos, tais como esquecimentos, dificuldades de concentração, preocupações constantes, irritabilidade, diminuição da libido, alterações no sono e no apetite. A atual conjuntura da pandemia do coronavírus pode acentuar o cansaço mental e emocional e evocar conflitos como sensação de impotência diante do problema, imprevisibilidade sobre o tempo pelo qual as pessoas estarão submetidas aos riscos e sobre o cenário socioeconômico futuro e atual, temor diante da contaminação, além da perda de entes amados, dentre outros.
Foto: Arquivo Pessoal
“Todos esses aspectos constituem agravantes à nossa inteligência emocional, favorecendo interpretações distorcidas da realidade e potencializando emoções e sentimentos disfuncionais. Além disso, o período do isolamento pode trazer uma grande sensação de improdutividade, contrária aos padrões sociais de supereficiência, o que pode reportar crenças de menos valia e desconexão com seu propósito ou sentido de vida, gerando tristeza. Preocupações excessivas não ajudam, só fazem acentuar os desgastes emocionais. É importante perceber quando os nossos pensamentos estão divagando por cenários sob os quais não temos controle e redirecionarmos a nossa atenção para ações efetivas, o que no caso da covid-19 envolve seguir as orientações de prevenção e cuidado já orientadas pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e pelos demais dispositivos de promoção em saúde”, comenta.
Rotina e produtividade
A psicóloga sugere ainda que as pessoas tentem manter uma rotina ativa e próxima da normalidade com o intuito de manter a saúde emocional. Ela frisou que é muito importante que sejam reservadas ações e momentos de autocuidado e lazer.
Segundo Amanda, também há no contexto da pandemia pessoas que tendem a se sentir mais otimistas e produtivas. Ela ressalta que esse tipo de comportamento é possível, com exceção das pessoas que se encontram em alienação e anda estão negando a gravidade da situação ou das pessoas menos empáticas. A psicóloga destaca que os comportamentos mais otimistas e de produtividade são de casos específicos e apresentam-se em outra ordem de defesas psíquicas. Ela salienta ainda que toda crise também tem a sua contrapartida de reequilibração e o colapso também traz a necessidade de reparação dos danos. Quando o indivíduo permite esta manifestação é ela que também lhe impulsiona para a resolução e para a elaboração de novas perspectivas.
“Para algumas pessoas, uma situação crítica pode despertar o que alguns psicólogos chamam de ‘ajustamento criativo’, que proporciona a adaptação em diversas situações, sendo uma forma saudável de manter o equilíbrio do organismo através de soluções responsáveis para a satisfação de suas necessidades. Isso deveria ser buscado por todos e não invalida nosso senso crítico ou empatia. Além disso, a minha abordagem terapêutica defende que todo organismo é dotado da capacidade de autorregulação, que envolve a tendência natural de viver e manifestar-se com prazer perante a vida, mesmo diante de situações adversas. Portanto, não é antinatural que algumas pessoas consigam manter uma vida ativa e otimista mesmo diante das restrições nesse período de distanciamento social”, acrescenta.
Covid-19 e sofrimento psíquico da população
Amanda Brito diz que muitos relatos de profissionais já apontam que a pandemia e o distanciamento social obrigatório está tornando recorrente o aumento de sofrimento psíquico na população, principalmente em quem já tinha fatores preexistentes.
“A própria Organização das Nações Unidas(ONU) alerta para aumento do número e da gravidade de doenças mentais e algumas instituições de pesquisa já estão realizando investigações no intuito de analisar e produzir dados estatísticos mais consistentes sobre as repercussões psiquiátricas e psicológicas decorrentes da pandemia pelo coronavírus. Em minha atuação, tenho evidenciado um crescimento em relação ao número de pessoas em situação de sofrimento intenso ou vulnerabilidade emocional, bem como o agravamento dos quadros de saúde mental em alguns indivíduos, o que gera um aumento pela procura dos serviços assistenciais”, pontua
A psicóloga explicou também que embora exista o agravamento da saúde mental neste momento e esse fator seja delicado necessite de atenção, é válido destacar que é natural que as pessoas sofram alguns tipos de desconfortos emocionais ou ansiedade ao longo da pandemia e essas condições não se configuram como transtorno ou adoecimento.
Dicas para cuidar da saúde mental
Amanda Brito listou para o Acorda Cidade algumas dicas que as pessoas podem adotar para enfrentar a pandemia e o distanciamento social de forma mais leve e cuidando da saúde mental.
Foto: Arquivo Pessoal
Veja abaixo algumas delas:
• Seguir as orientações regulatórias. Evitar exposições desnecessárias e circunstâncias que gerem tensão e possibilidade de contaminação/propagação do vírus;
• Manter o autocuidado e bons hábitos de higiene, alimentação e descanso. Uma mente descansada promove maior vitalidade e o cuidado pessoal proporciona bem estar e melhora o sistema imunológico;
• Manter-se ativo. Criar uma rotina e dedicar-se a tarefas dentro de casa, como organização do espaço físico, guarda-roupa, etc.;
• Evitar o acesso exagerado às redes sociais e procurar fontes de notícias confiáveis para se atualizar;
• Encontrar atividades prazerosas e dedicar atenção a atividades que não tinham tempo para serem realizadas antes;
• Manter a interação social mesmo à distância através dos dispositivos tecnológicos, cultivando os laços;
• Fazer atividades relaxantes como tomar sol, realizar exercícios respiratórios, meditar, brincar…