Acorda Cidade
José Alencar Gomes da Silva, conhecido na família como Zezé, morto nesta terça-feira (29), foi protagonista de uma das mais impressionantes histórias brasileiras de empreendedorismo no século 20. Décimo primeiro filho de um pequeno comerciante que morava num povoado de Muriaé, sudeste de Minas Gerais, Alencar dizia com orgulho que começou a frequentar a loja do pai ainda aos 7 anos. Aos 14, deixou a família para trás para trabalhar como balconista. Com 18, abriu seu primeiro negócio próprio. Ao se "aposentar", deixou para o filho um império classificado como o maior grupo têxtil de cama, mesa e banho do mundo.
No início, quando trabalhava como empregado, Alencar dizia que ganhava tão pouco, que era insuficiente até para pagar um quarto de pensão. Dormia no corredor de um hotel. O primeiro negócio próprio, uma loja de tudo um pouco chamada A Queimadeira, surgiu em 1950, com um dinheiro emprestado pelo irmão mais velho. Desde então, os negócios não pararam de crescer.
O grande salto foi em 1967, quando fundou a Coteminas com um sócio. Com 11 unidades industriais em quatro Estados, além de uma fábrica na Argentina, a empresa, hoje, é uma potência. Produz, distribui e exporta fios, tecidos, malhas, camisetas, meias, toalhas de banho e de rosto, roupões e lençóis. No Brasil, é dona das marcas Santista, Artex, Calfat e Garcia.
Em 2005, já sob o controle de Josué Gomes da Silva, filho de Alencar, a Coteminas concluiu a fusão com a Spring, então líder do mercado americano. Formou-se assim o maior grupo mundial deste segmento. No instante da fusão, eram 25 mil funcionários, contando os das fábricas localizadas nos Estados Unidos e no México. A maioria das instalações americanas foi fechada e a produção foi sendo transferida para o Brasil e a Argentina. Com isso, ficaram 15 mil empregados. O último movimento importante do grupo foi a aquisição do controle da MMartan, tradicional varejista do setor.
A vida política de Alencar
A carreira política de Alencar começou tarde para os padrões nacionais. As primeiras experiências foram como representante de classe, com passagens pela Federação das Indústrias de Minas e Confederação Nacional da Indústria. No início dos anos 90, já com mais de 60 anos, Alencar resolveu entrar para a política partidária. Disputou o governo de Minas pelo PMDB em 1994, mas acabou em terceiro, com 10,7% dos votos, atrás do ex-ministro das Comunicações, Hélio Costa, e do tucano Eduardo Azeredo, o vencedor do segundo turno.
Em 1998, Alencar foi eleito para o Senado com 2,9 milhões de votos. Não chegou a ter uma atuação muito destacada como parlamentar, mas soube aproveitar bem o palanque para ampliar seus contatos.
Com o objetivo de criar uma chapa que simbolizasse a união entre os trabalhadores e o empresariado, um grupo de petistas mais próximos de Lula começou a articulação para ter Alencar como candidato a vice na garupa de Lula. A operação envolveu uma intensa negociação com o PL, que exigia dinheiro do PT para financiar campanhas para deputado. Do ponto de vista eleitoral, foi bem sucedida. Histórias fragmentadas dessa negociação brotaram em 2005 no auge do escândalo do mensalão, a maior crise da história do governo Lula.
Com a implosão do PL após o mensalão, Alencar refugiou-se no inexpressivo PRB, sigla ligada à Igreja Universal do Reino de Deus, responsável pela re-condução de Alencar como vice na vitoriosa chapa da reeleição de Lula, em 2006.
No Palácio do Jaburu, a residência oficial do vice, Alencar se notabilizou por fazer uma campanha sistemática pela queda da taxa de juros. Durante muito tempo, ele foi a única voz importante do governo que reclamava publicamente da política econômica conservadora liderada por Antônio Palocci, o então ministro da Fazenda. Consta que não eram poucos os membros do primeiro escalão que internamente concordavam com as críticas, mas preferiam o silêncio junto à opinião púbica.
Em novembro de 2004, com o desgaste do ministro José Viegas junto aos militares, Alencar assumiu o Ministério da Defesa. Enquanto esteve no cargo, era visto como um dos governistas associados à articulação de parlamentares e lobistas que tentava criar um programa de reestruturação e salvamento da Varig, que, anos depois, acabou vendida para a Gol.
Em julho de 2010, um processo de paternidade envolvendo Alencar ganhou repercussão nacional e deflagrou um grande debate na internet. Numa ação de investigação de paternidade, um juiz de Minas deu ganho de causa a uma professora de 55 anos que diz ser filha de Alencar. O processo de Rosemary de Moreira Gomes da Silva começou em 2001. Como Alencar nunca aceitou fazer teste de DNA, o juiz interpretou o fato como "culpa presumida". Alencar aceitou dar uma entrevista sobre o assunto ao apresentador Jô Soares, na TV Globo. Apesar de dizer que não tinha "nada contra essa senhora de 55 anos", afirmou que não faria o teste porque não queria se "submeter a essa chantagem", o que causou péssima repercussão na rede. A defesa de Alencar obteve o efeito suspensivo da sentença. O caso será julgado pelo Tribunal de Justiça de Minas. A tendência é que suba para o Superior Tribunal de Justiça. As informações são da Época